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Retrato de uma artista

Por Antonio Haslauer e Nova York
Atualização:

Há pouco mais de uma semana, o nome Isabel Toledo nada significaria para quem moda é sinônimo de campanhas publicitárias poderosas e grandes desfiles. Mas a chegada da era Obama, um verdadeiro movimento sísmico, não poupou sequer a complexa engrenagem do mundo fashion. Isabel Toledo, criadora-ícone de Nova York desde o fim dos anos 80 e estilista da nata da moda e das artes, mal acreditou quando descobriu, com milhares de telespectadores, que Michelle estava usando uma criação sua na cerimônia da posse de seu marido Barack Obama. Uma escolha surpreendente. Isabel e o artista plástico Ruben Toledo são figuras essenciais do universo artístico de NY, casados há 25 anos. Nascidos em Cuba, cresceram em New Jersey onde Isabel começou a costurar suas roupas, que já lhe garantiam a entrada nos clubes mais avant-garde de NY. Isabel se define como costureira. E foi nessa condição que estagiou na área de moda do Metropolitan sob a tutela da mais que lendária Diana Vreeland. Seu trabalho quase artesanal conta com produção de no máximo 300 peças por estação. A casa e os estúdios do casal se fundem em quatro andares em pleno mercado das flores de Manhattan e deixa claro que os Toledos são um planeta gravitando em torno da criatividade. A seguir, a entrevista exclusiva concedida ao Estado: Graças à Michelle Obama seu nome chega ao grande público. Que impacto terá no seu trabalho? Espero que isso ajude quem gosta de moda a olhar além do lugar-comum, a ter as próprias ideias. A moda evolui quando as pessoas pensam por si próprias e se vestem da forma que reflita como elas se sentem. Ter vestido a primeira-dama foi uma bênção que mudou de certa forma nossa vida, haja vista o interesse que despertou na imprensa. Mas esperamos que isso não mude a forma como trabalhamos. Fazemos arte e design de forma orgânica. Claro que ter mais oportunidades de compartilhar o que fazemos é maravilhoso, mas não somos uma corporação ou uma grande marca. Nós somos simplesmente pessoas que amam o que fazem. Em uma era de massificação e logomania, o que a escolha de Michelle sinaliza? Michelle Obama é extremamente sincera, com uma mente aberta e independente. Ela se veste com sensibilidade. E sabe que o mundo a observa atentamente. A beleza está no fato de que Michelle usa minhas roupas há anos, assim como a de outros estilistas que ela veste hoje - muito antes desse momento presidencial. Por isso, ela transmite esse ar de elegância e conforto. Ela veste a roupa como cultura e não como mercadoria e aprecia o acabamento e o trabalho feitos à mão. Na moda do Brasil há a questão de como transmitir "brasilidade". Sendo uma cubana em NY, como define suas influências? Temos muito em comum. A maioria de nós estilistas é o reflexo da nossa cultura. Esses códigos se traduzem nas roupas. Meu trabalho reflete meu passado, minha experiência como refugiada política, o fato de ter nascido em Cuba, onde tive a sorte de ter uma infância culturalmente rica. Aí fui transplantada para um lugar estimulante, a NY dos anos 70. Um mix potente. Espero incorporar ao meu trabalho a magia dessas experiências. Diante da crise, como a moda se renova? Há uma renovação. Quando a economia se torna ruim, a cultura entra em ebulição. Quando o frenesi do dinheiro se acalma, a criatividade emerge. Isso é um pêndulo, um ciclo natural que vai permitir à moda evoluir e se moldar em novo formato.

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