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Por que Careqa não se acha artista?

É ele mesmo quem se questiona, mas a resposta criativa está no CD que o compositor e entertainer lança no Sesc Pompeia

Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

Carlos Careqa diz que não gosta da palavra sonho (no sentido de aspiração), nem de ser chamado de artista. Mas é, realizou seu intento. Tem gente que pensa que pode, mas não se sabe se "chega lá". Foi pensando nisso que compôs Por Quê? (leia letra ao lado), faixa do CD Tudo Que Respira Quer Comer, que lança com show amanhã, para celebrar 25 anos de carreira. Ouça trecho da faixa Por Quê? "Gostei de seu texto que falava de sambinha de isopor e das cantoras cheias de pose. Finalmente alguém tem coragem de falar alguma coisa", diz Careqa, sobre uma crítica recente a certas insossas aspirantes a cantoras no Caderno 2. "Depois que inventaram essa bobagem do politicamente correto fica todo mundo pisando em ovos." A canção Por Quê?, citada na crítica em questão, surgiu da "revolta" de Careqa em relação a isso. O compositor, cantor, músico e ator catarinense, criado em Curitiba e radicado em São Paulo desde 1991, lembra que quando começou a fazer música nem sonhava fazer sucesso. Só passou a pensar na questão depois que gravou o primeiro disco, Os Homens São Todos Iguais (1993). Tinha então, um trabalho. "Antes achava que música era pra quem sabia ou tinha alguma coisa pra falar, não bastava simplesmente gostar", observa. "Acho engraçado ler umas biografias no MySpace, que dizem ?a arte e a música sempre estiveram ao lado de fulano de tal desde os 4 anos, quando seu pai lhe deu o primeiro violão?. E aí? Você vai ouvir, é a cópia da cópia da cópia. As pessoas não se preocupam com estética, com as letras, acham que o que fazem é novo. Pelas facilidades do momento, pelas leis de incentivo, que acho erradas, porque às vezes a pessoa não tem nada pra dizer, mas o pai é gerente da empresa X, consegue uma verba, ela acaba gravando um CD que não significa nada." Ele também coloca em xeque a importância da própria criação artística. "Tenho certeza que meu trabalho é honesto, mas me questiono também, porque não sei se o que estou fazendo é tão fundamental para a humanidade", diz. Pode não salvar a pátria, mas o conteúdo diversificado e as soluções inesperadas no percurso do novo CD atestam sua maturidade, cheio de boas idéias de música e letra. Vindo de trabalhos revisionistas como Pelo Público e o tributo a Tom Waits, Careqa diz que volta à carga de cancionista, como uma continuação de seu terceiro disco. Depois de "velho", ele decidiu fazer um curso de harmonia e percepção com Ricardo Brein. Algumas canções do novo CD surgiram desse curso. "Mas também não quis mostrar tudo o que aprendi no disco, queria que fosse orgânico". Só duas faixas, Cida e Fantasias, parcerias com Fernando Vieira, são dos anos 80. Uma das características de Careqa é o humor e nisso ele afina com o produtor Mário Manga, com o artista plástico Guto Lacaz, que assina o projeto gráfico, e com convidados como Maria Alcina e Zé Rodrix. "Hoje me sinto mais entertainer do que artista. Faço entretenimento, mas com objetivo de fazer o ouvinte pensar um pouco." Alcina, Manga, Toninho Ferragutti, Marcelo Pretto, Gabriel Levy e Guello estão com ele também no show. Além deles, o CD ainda tem a participação de Mônica Salmaso, Raul de Souza, Tatiana Parra e Skowa. Careqa acredita que a canção sobrevive, apesar de negras previsões. "Eu ainda me emociono com canções bem feitas, acho que tem gente fazendo coisa legal, como a Juliana Kehl, que tem letras ótimas. Acho que a canção está muito vulgar também porque as pessoas estão fazendo letras péssimas. E vira um desabafo. Não acho que a gente esteja vivendo a morte da canção, mas a vulgarização da música." Por Quê? Por que você quer ser artista? Por que você quer ser cantor? O campo precisa de gente Não tem mais agricultor Tem tanto artista falido Tocando só pra família Os amigos já não guentam mais Os discos que não têm saída Tem tanta menina bonita Que não sabe onde fica o Lá Namora com um guitarrista E um microfone já quer comprar Agora todo mundo quer ser artista A fome do homem virou coisa de revista Ninguém é vaiado, o meu nome tá na lista E em cada esquina tenho o meu malabarista Há quem entretenha, há quem pense que é artista Há quem faz novela, convenção ou qualquer bisca E mostra a cara, mostra a bunda, mostra o peito Só não mostra o que é de direito, é coisa de vigarista

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