Pedro e o Lobo, de Prokofiev, com um toque brasileiro

Cenário e personagens do clássico infantil são recriados pelos designers paulistas Humberto e Fernando Campana em NY

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Por Tonica Chagas
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Pedro e o Lobo, que Sergei Prokofiev compôs, em 1936, para mostrar instrumentos e ensinar seus sons às crianças, ganhou um toque brasileiro casando música e artes visuais na série Works & Process, promovida pelo Guggenheim Museum de Nova York. Os irmãos e designers paulistas Humberto e Fernando Campana criaram cenário e personagens para o clássico infantil com materiais tão incomuns quanto os das peças de mobiliário com as quais conquistaram o gosto internacional. Mais de uma centena de garrafas plásticas de guaraná, por exemplo, dão forma à árvore que representa o bosque da história e, como diz Fernando, "ficou parecida com uma bananeira no meio da neve". Com o estilista Isaac Mizrahi como narrador e executada pelo Juilliard Ensemble sob a regência de George Manahan, que é diretor musical da New York City Opera, Pedro e o Lobo estreou sábado (13 de dezembro) e terá duas apresentações diárias até domingo (21 de dezembro), na sala de teatro do Guggenheim. A história do menino que, com ajuda de alguns animais, consegue capturar e mandar para o zoológico um lobo que tirava o sossego da sua aldeia, não fez parte do universo infantil dos Campana. "O que a gente escutava era história de Saci e mula-sem-cabeça", lembra Humberto, o mais velho dos dois. Mas é das brincadeiras de meninos criados no interior de São Paulo que vem criatividade e destreza para o trabalho deles, transformando corda, pedaços de carpete, varas de bambu ou retalhos em obras de arte que figuram em coleções de museus como o Beaubourg, de Paris, e o MoMA, de Nova York. O mais recente reconhecimento foi o prêmio Designer of the Year, que eles receberam, no início do mês, na Design Miami 2008. Antes deles, a feira americana de design premiou a iraquiana Zaha Hadid, o australiano Marc Newson e o japonês Tokujin Yoshioka? Criada em 1984, a Works & Process estimula o público a explorar o processo criativo de artistas plásticos, escritores e músicos contemporâneos. "Sempre achei que, para as crianças, faltava alguma coisa nas apresentações tradicionais de Pedro e o Lobo, só com os instrumentos e o narrador. As que assistirem ao concerto esta semana vão relacionar os personagens da história com os sons dos instrumentos e também com os objetos poéticos criados pelos Campana", diz Charles Fabius, um dos produtores da série. A poética desses objetos tem muito da criatividade artesanal brasileira e ênfase na transformação e reciclagem. O passarinho (que Prokofiev escolheu para representar a flauta), o pato (oboé), o gato (clarinete) e o lobo (trompas) foram feitos de madeira balsa e estruturados como a cadeira Favela, que os Campana criaram em 1990. O rabo do lobo é de gravetos, lembrando sua natureza selvagem. O corpo de Pedro (cordas) e do seu avô (fagote) é feito de bonequinhas produzidas por mulheres da zona rural de Esperança, na Paraíba, iguais às que os designers usaram para compor a cadeira Multidão, em 2003. Para as montanhas nevadas no fundo do cenário, Humberto e Fernando fizeram estruturas geométricas cobertas de plástico usado para transporte de gelo. A iluminação foi criada por Jennifer Tipton, uma das mais premiadas iluminadoras americanas. Dispostos no palco, o cenário e os personagens são iluminados conforme a entrada dos instrumentos na narrativa da música, que dura cerca de 30 minutos. Ao fim dos concertos, o público participa de uma discussão sobre a composição de Prokofiev e o trabalho dos Campana. Depois de Nova York, as esculturas criadas para Pedro e o Lobo vão fazer parte da retrospectiva sobre a obra deles que está sendo organizada pelo Vitra Design Museum, da Alemanha. A exposição deve ser inaugurada lá, no ano que vem, e fazer turnê internacional nos cinco anos seguintes.

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