Para Werner Herzog, Dieter ainda quer voar

Diretor retoma como ficção tema de documentário de 1997

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Está sendo um ano de grandes interpretações masculinas, o que promete uma disputa renhida para as indicações do Oscar da categoria. Nos filmes já em cartaz nos cinemas brasileiros, podem-se citar atuações como as de Tommy Lee Jones em No Vale das Sombras, Joaquin Phoenix em Os Donos da Noite e Brad Pitt em O Assassinato de Jesse James pelo Covarde Robert Ford. A eles vem se somar agora Christian Bale, excepcional em O Sobrevivente, novo filme do alemão Werner Herzog, que estréia hoje nos cinemas do País. Christian Bale constrói seu personagem com rara densidade e sutileza, enfrentando as duras provas físicas que ele lhe exige. Veja trailer do filme O Sobrevivente O Sobrevivente pode ser definido como uma dupla raridade na obra do diretor alemão de 65 anos (nasceu em 1942). Nos últimos anos, Herzog tem se dedicado quase exclusivamente ao documentário e o fato de voltar à ficção é tanto mais notável porque O Sobrevivente, como vários de seus grandes filmes, situa-se nas bordas de ambas as tendências. É uma ficção porque é interpretado (recriado) por atores, mas a base da história é real e Herzog vai ao limite para mantê-la como tal. Ao mesmo tempo, o filme é o mais ''''mainstream'''' do diretor, que sempre trabalhou num registro mais independente. A história de O Sobrevivente não é novidade na carreira de Herzog, que, há dez anos, realizou um documentário intitulado O Pequeno Dieter Precisa Voar, justamente contando a experiência do personagem agora interpretado por Christian Bale. Seu nome é Dieter Dengler, um alemão, naturalizado norte-americano, que virou piloto e foi capturado no Laos, durante a Guerra do Vietnã. No documentário, o próprio Dieter Dengler relatava o que o tornou um personagem tão extraordinário - ele não apenas sobreviveu às condições inóspitas, leia-se desumanas, do cativeiro, como planejou uma fuga audaciosa, na qual terminou envolvendo outros colegas prisioneiros. Os filmes sobre fugas de prisioneiros de guerra se constituem numa tendência específica de Hollywood. No cultuado Fugindo do Inferno, John Sturges mostrou o lendário Steve McQueen em fuga de um campo nazista no lombo de uma motocicleta. Nada mais diferente do que o cenário de O Sobrevivente - a selva do Laos, como se Herzog estivesse voltando aos ambientes de dois pesadelos que filmou nos anos 60 e 80. Aguirre, a Cólera dos Deuses e Fitzcarraldo, ambos com Klaus Kinski, construíram personagens obsessivos em luta por seus sonhos na selva amazônica. Em Aguirre, Kinski busca a mítica cidade de ouro de Eldorado. Em Fitzcarraldo, ele atravessa a selva carregando um barco pelo seco, todo esse esforço servindo ao objetivo de construir um teatro habilitado para o canto lírico. O Sobrevivente narra a saga de outro herói obsessivo, bem dentro do perfil que atrai Herzog, esse construtor de sonhos mais louco, pelos padrões habituais de ''''normalidade'''', do que qualquer de seus personagens. O filme possui grandes cenas, grandes atuações - a de Christian Bale -, mas é irregular e termina de forma um tanto decepcionante. Mas tem a marca de Herzog, o que equivale dizer - pode ser um programão para cinéfilos. Serviço O Sobrevivente (RescueDawn, EUA/2006, 126 min.) - Drama. Dir. Werner Herzog. 14 anos. Cotação: Bom

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.