PUBLICIDADE

Para rever Gonzaguinha, político ou romântico

Gravado em 1981, no auge do sucesso do compositor, Luiz Gonzaga do Nascimento Junior mostra reencontro de pai e filho

Por Roberta Pennafort
Atualização:

Gonzaguinha está no centro do palco e puxa o pai pela mão. Gonzagão entra e solta o vozeirão para cantar Légua Tirana, parceria sua com Humberto Teixeira. O filho fica de lado, acompanhando, com expressão de admiração e ternura. A cena é linda, e as que se seguirão são ainda mais: os dois, que sempre tiveram uma relação extremamente difícil, dividindo músicas, de mãos dadas, dançando, se abraçando, se acarinhando. O reencontro familiar, que pouco depois iria se consolidar na turnê conjunta Vida de Viajante, é o ponto alto do DVD Luiz Gonzaga do Nascimento Junior, programa da série Grandes Nomes, da TV Globo. Gravado em 1981, no auge do sucesso e prestígio de Gonzaguinha, foi remixado, teve as imagens restauradas e está sendo lançado pela EMI e a Globo Marcas - a Trama já havia lançado Elis Regina Carvalho Costa, Rita Lee Jones e Paulo Cesar Baptista de Faria (Paulinho da Viola). A série fez grande sucesso. À época, o elenco da Globo disputava convites para assistir aos maiores artistas da MPB cantarem seus hits. Com roteiro coassinado por Gonzaguinha, o especial foi dirigido por Daniel Filho e teve produção e direção de Guto Graça Mello. Já faz 28 anos, e Graça Mello não se recorda de muita coisa da experiência. Mas uma lembrança ficou: a da reaproximação de pai e filho, ali, no palco do Teatro Fênix. "Foi bonito ver aquilo, emocionante. Gonzaguinha sabia que o pai ia, mas havia uma tensão. Ele só chegou na hora. O Luiz Gonzaga estava muito tenso, suando. Dali eles foram conversar no camarim", rememora o produtor. Wagner Tiso foi convidado pelo amigo Gonzaguinha - tocou com sua banda, Jota Moraes, Frederico Oliveira, João Cortez, Paulo Maranhão, Ary Pissarolo, Pascoal Meirelles -, e também ficou comovido. "Gonzaguinha estava muito entusiasmado; cantar com o pai foi uma felicidade. Ele tinha adoração pelo Gonzagão." Depois de Légua Tirana, Gonzaguinha passa a mão em sua cabeça e canta, olhando em seus olhos, Eu Apenas Queria Que Você Soubesse - um momento tocante: "Eu apenas queria que você soubesse/ Que aquela alegria ainda está comigo/ E que a minha ternura não ficou na estrada/ Não ficou no tempo presa na poeira." Em seguida, os dois apresentam juntos Vida de Viajante (Gonzagão/Hervê Cordovil). Eles estão vestidos de forma parecida: blusa social aberta até o peito e calça social (o pai não está com o chapéu de couro nem carrega a inseparável sanfona). O pernambucano Gonzagão morreria em 1989, aos 77 anos; o carioca Gonzaguinha, dois anos depois, aos 46, num acidente de carro. A origem dos problemas entre os dois estava na ausência, desde cedo, do pai, que viajava o País fazendo shows. Gonzaguinha foi criado pelos padrinhos, Dina e Xavier, no Morro de São Carlos (a mãe morrera quando ele tinha apenas 2 anos). Havia também a dúvida sobre sua paternidade, jamais dirimida. No DVD, está o Gonzaguinha rasga-coração de canções como Não Dá Mais pra Segurar (Explode Coração), que abre o show, Começaria Tudo Outra Vez, que fecha, Ponto de Interrogação e Sangrando. O Gonzaguinha político, de Fala Brasil, E Vamos à Luta (as duas com participação do sambista Roberto Ribeiro, também falecido), Achados e Perdidos, Pequena Memória para Um Tempo Sem Memória, A Cidade Contra o Crime e Pacato Cidadão predomina. Dois números, com Simone e As Frenéticas, ficaram de fora por questões jurídicas. Para os fãs, que seguem ouvindo seus discos e se contentam com homenagens aqui e ali, é pena que acabe logo (são só 45 minutos, 19 músicas) e não tem extras. Vale seu apelo no fim: "Por favor, eu só peço que vocês que gostam de mim, assim como eu aprendi a gostar de mim, assim como nós devemos aprender a nos gostar e nos respeitar, me ajudem no sentido de que eu não perca jamais aquela sujeira da minha simplicidade."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.