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Osesp terá maestro interino até 2011

Fundação deve anunciar nos próximos dias o regente; fontes ouvidas pelo Estado confirmam nome de Yan Pascal Tortelier

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Por João Luiz Sampaio
Atualização:

Com a demissão do maestro John Neschling, anunciada na noite de quarta-feira pela Fundação Osesp, a orquestra deverá ser regida interinamente até 2011 (quando assume um novo diretor artístico) pelo maestro francês Yan Pascal Tortelier. A Fundação Osesp não confirma ou nega a informação, obtida pelo Estado com fontes ligadas à orquestra; informa apenas que as negociações estão bem adiantadas e que o nome do novo regente principal pode ser anunciado nos próximos dias. Filho do célebre violoncelista Paul Tortelier, o maestro francês já foi regente principal da Filarmônica da BBC e principal regente convidado da Sinfônica de Pittsburgh; em 2008, comandou a Osesp durante duas semanas, com resposta positiva dos músicos e da crítica. A demissão de Neschling foi anunciada em carta enviada por correio ao maestro, que está regendo na Grécia e volta ao Brasil apenas no início de fevereiro. O presidente da Fundação Osesp, Fernando Henrique Cardoso, afirma que as declarações dadas pelo maestro ao Estado em entrevista publicada no dia 9 de dezembro (leia ao lado) repercutiram negativamente entre os músicos, levando o conselho "a analisar a entrevista e estimar seu efeito nas condições em que a sucessão no comando da orquestra se daria nos quase dois anos ainda por decorrer até a expiração do atual contrato". Fernando Henrique Cardoso lamenta ainda que "o passo natural de renovação não tenha sido percorrido de melhor maneira" e encerra com "justas homenagens pelo admirável trabalho realizado". Mas afirma que "à luz da gravidade dos termos da entrevista, o conselho optou pela ruptura contratual imediata". Por intermédio de seu assessor de imprensa, o maestro informa que não vai se pronunciar sobre a demissão antes da chegada ao Brasil e que está consultando seus advogados sobre questões contratuais - segundo a fundação, a conduta pública do regente está em desacordo com as cláusulas de seu contrato. O silêncio, de resto, se espalha. Membros do conselho da Fundação Osesp também recusaram pedidos de entrevista. Maestros das principais orquestras do País procurados pelo Estado, como Roberto Minczuk (ex-diretor artístico adjunto de Neschling e atual diretor da Sinfônica Brasileira e do Municipal do Rio), Isaac Karabtchevsky (diretor da Sinfônica Petrobras), Ira Levin (diretor da Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília) e Jamil Maluf (diretor do Municipal de São Paulo) também preferiram não se pronunciar sobre a questão. Já o secretário-adjunto de Cultura Ronaldo Bianchi disse que o governo "tem profundo respeito pelo trabalho do maestro" e que ficou sabendo da decisão de demiti-lo "da mesma forma que a imprensa e o público". O compositor Gilberto Mendes elogiou, na manhã de ontem, o trabalho de Neschling e afirmou que sua saída é "o fim de uma era, o começo do fim da Osesp". O mesmo espírito pode ser encontrado nos diversos fóruns de discussão que se estabeleceram na internet desde a divulgação da notícia. Da mesma forma, fãs da orquestra criaram na rede um abaixo-assinado no qual pedem a permanência do atual corpo administrativo e artístico da orquestra "para que todo o trabalho realizado até o momento não tenha sido em vão". No Orkut, comunidades têm sido criadas em torno de um vídeo, postado no YouTube, em que, após concerto em dezembro, a plateia da Sala São Paulo inicia um coro de "Fica! Fica! Fica!". "Esse coro pesará para sempre na decisão dessa gente que acha que pode fazer o que quiser com a nossa orquestra. Mas não podem! A orquestra é nossa, não deles!", diz um dos integrantes. A repercussão em torno da demissão toca no ponto nevrálgico da relação da orquestra com o maestro: qual o significado no futuro da Osesp da saída de Neschling? Em seus comunicados oficiais, a fundação tem insistido que o processo de seleção continuará como previsto e que, nas próximas semanas, os critérios que vão guiar a escolha do novo diretor artístico, obtidos em conversas com consultores internacionais, serão divulgados à imprensa e ao público. Entre as possibilidades estudadas, está a divisão de funções: em vez de um diretor artístico também regente-titular, dois profissionais seriam escolhidos, tentativa de diminuir a centralização que foi uma das marcas da gestão Neschling. Ouvidos pelo Estado, músicos da Osesp, que preferiram não se identificar, se disseram "aliviados" com a solução, tendo em vista a "relação tumultuada" dos últimos tempos entre eles e o maestro. Segundo eles, no final de novembro, uma comissão havia enviado uma carta à direção da fundação fazendo reparos ao trabalho do maestro nos últimos meses. "Há um pouco de insegurança no ar por não sabermos ainda quem virá reger a orquestra em seu lugar nos próximos tempos. Mas recebemos da fundação a garantia de que, apesar da decisão final ser do conselho, nós seremos consultados sobre o nome do novo diretor artístico", disse um músico, integrante da orquestra desde o início do processo de reestruturação iniciado pelo maestro em 1997. Quanto à escolha de Yan Pascal Tortelier para o posto de regente-titular interino, parece não haver polêmicas. "Gostamos muito de trabalhar também com o Mario Venzago e com o Frank Shipway. Mas o Tortelier fez um excelente trabalho", disse o músico. Estava marcada para o começo da tarde de ontem uma reunião entre a orquestra e membros do conselho. Relação de Sucesso e Polêmica A CHEGADA Em 1996, o maestro John Neschling é anunciado pelo governo do Estado como regente-titular e diretor artístico da Osesp, com o objetivo de reconstruir o grupo, plano que previa a construção da Sala São Paulo e o aumento dos salários dos artistas, tendo em vista programações regulares e ambiciosas. A PRIMEIRA POLÊMICA Em 2001, após desentendimentos com o maestro Minczuk, na época diretor artístico e regente-titular adjunto, oito músicos, entre eles representantes da orquestra, são demitidos por telefone por Neschling, levando a manifestações de entidades de artistas. TURNÊ E DEMISSÃO Após a primeira turnê da orquestra pelos EUA, a diretora-executiva da Osesp, Cláudia Toni, deixa o cargo presumidamente por conta de desentendimentos com o maestro John Neschling sobre problemas na produção da viagem. FESTIVAL Em 2004, Roberto Minczuk é escolhido pelo governo para dirigir o Festival de Campos do Jordão. Começava, nos bastidores, o desentendimento entre ele e Neschling. No ano seguinte, Minczuk deixaria o posto de adjunto, assumindo a posição de regente convidado principal. Antes do fim da temporada, no entanto, ele deixaria a orquestra, alegando falta de clima propício ao trabalho. VIRADA CULTURAL Em 2005, no primeiro ano da gestão de José Serra como prefeito de São Paulo, a Osesp recusa-se a participar da Virada Cultural, alegando falta de condições de trabalho. Começava ali o desentendimento entre maestro e governante. CONCURSO Em 2006, a reputação do Concurso Internacional de Piano Villa-Lobos é colocada em questão com acusações de fraude e interferência na seleção de candidatos. Ilan Rechtman, coordenador do evento e antigo colaborador de Neschling, faz as denúncias e é processado pelo maestro. Sua mulher, violoncelista do grupo, é demitida meses depois. FARPAS Continuam, no início de 2007, os desentendimentos públicos entre Neschling e o governo do Estado. O secretário de Cultura João Sayad diz à imprensa que considera alto o salário do regente. No Festival de Campos do Jordão, Serra encontra-se com Minczuk para jantar no Palácio Boa Vista, gerando boatos de que ele poderia empossá-lo como novo diretor da Osesp. YOUTUBE Meses depois, surge no YouTube vídeo em que Neschling chama o governador de "menino mimado e autoritário". SAÍDA Em junho, a fundação Osesp informa a decisão de John Neschling de não renovar seu contrato em 2010. PROCESSO SELETIVO Dia 3 de dezembro, chega a SP Timothy Walker, o primeiro dos consultores internacionais convocados para ajudar a Osesp na escolha do novo maestro. Em seguida, veio ao País Henry Fogel, ex-presidente da Liga das Orquestras Sinfônicas Americanas. ENTREVISTA Dia 9 de dezembro, falando ao Estado, Neschling critica abertamente a condução do processo de seleção.

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