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Os valores por trás de um ofício

Apesar do contato com vários bambas, instrumentista deve seu destino artístico a Monarco e Rildo Hora

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Por Redação
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Em regra, os músicos costumam ter grande dificuldade para falar com detalhes das suas influências. O principal receio é em relação ao que os outros vão pensar - ao citarem seus mestres, julgam estar se comparando a eles. Mas é inevitável que com o tempo as influências, ao se diluírem e combinarem, resultem no estilo, uma maneira nova e automática de sentir o mundo e de transformar esse sentimento em arte. Paulão 7 Cordas conheceu muitos bambas, com quem aprendeu certas manhas, mas ele deve o seu destino artístico a duas pessoas - Monarco e Rildo Hora. A lista dos sambistas com quem ele tocou é longa e desperta respeito: Nelson Cavaquinho, Mauro Duarte, João Nogueira, Zé Ketti, Jamelão, Elton Medeiros, Dona Ivone Lara, Jovelina Pérola Negra, Paulinho da Viola, Argemiro Patrocínio, Xangô da Mangueira, Nelson Sargento, Martinho da Vila, Almir Guineto, Zeca Pagodinho, Alcione... E isso ficando só no universo do samba e esquecendo Ney Matogrosso, Jorge Mautner, Fafá de Belém, Ivete Sangalo... Monarco, baluarte da Velha Guarda da Portela e apelido de Hildemar Diniz (1933), é o padrinho de Paulão 7 Cordas. A virada começa em 1978. "Ele me apresentou o Nelson Cavaquinho e foi aí que as coisas se abriram, eu abracei o samba por causa do Monarco", ele diz. Até então sua formação instrumental era resultado da convivência com chorões - iniciou-se profissionalmente no conjunto do bandolinista Walter Moura. Embora importantes, foram poucas as aulas formais de violão. Paulão 7 Cordas convive com a Velha Guarda da Portela desde jovem e vê Monarco como um dos guardiães de " imenso tesouro musical, que é o repertório da escola." Ele chama de "tradicional" o samba da Portela, feito de melodias sofisticadas e de ritmo singular, em que se destacam a limpeza e a cadência. Criado em Oswaldo Cruz, berço dos integrantes da Portela, Monarco passou a integrar a ala de compositores em 1950. Nos anos 1960, ele chegou a sair de lá para integrar a Unidos de Jacarezinho, mas, no fim daquela década, estava de volta à agremiação para integrar a velha guarda. Com a morte do compositor Manacéa, sua liderança se fortaleceu. Nos anos 1970, começaram a gravar com sucesso as suas composições: os primeiros são Paulinho da Viola (Lenço, parceria com Chico Santana) e Roberto Ribeiro (Proposta Amorosa). Em 1974, grava o seu primeiro elepê - Monarco. Desde meados dos anos 1980, Zeca Pagodinho costuma incluir composições de Monarco em seus discos. Os valores portelenses, como o respeito ao passado e o senso de coletividade, Paulão costuma aplicá-los aos projetos de produção e à direção dos shows, segundo os depoimentos dos seus colegas de ofício (leia mais no box ao lado). Ele está atento ao outro. "O segredo para fazer bons shows e bons discos é saber aglutinar as pessoas", diz. "Elas têm de gostar do que estão tocando e, se gostarem, dão aquele algo a mais que beneficia o conjunto." Não por acaso ele diz que seu mestre na produção musical é o pernambucano Rildo Alexandre Barretto da Hora (1939), compositor, gaitista, violinista e arranjador. Rildo revelou talento precoce para a música. Morando em Madureira - sua família se mudara para o subúrbio do Rio em 1945 -, ele frequentou bares aonde ia o pessoal da Portela, como Chico Santana, Alvaiade, Manacéa e Candeia. "Muita gente me serviu de exemplo, mas a experiência de dez anos como assistente de produção do maestro Rildo nos discos do Zeca Pagodinho foi muito importante para mim", diz. "Aprendi a encarar nas músicas as coisas como elas são e a costurá-las." Paulão resume essa postura a um só tempo profissional e solidária em três palavras: "ética", "respeito" e "clareza". Nos dez anos com Rildo, ele se lembra, emocionado, da participação no projeto de Samba pras Moças (1995), do Zeca. Ao terminar o trabalho como assistente, Paulão 7 Cordas já formara seu estilo de produzir, que começa pela atenção ao ritmo e depois passa, nesta ordem, para a harmonia e o coro. "E, claro, não podemos esquecer que o repertório tem de ser bom." É o caso em que a união faz a força de uma arte.

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