Os 90 anos do eterno boêmio Nelson Gonçalves

DVD com um programa de tevê de 1981 e outro que vai ao ar na Cultura amanhã celebram o aniversário do cantor gaúcho

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Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

Dois programas de televisão, um de 1981 recém-lançado em DVD e outro que vai ao ar amanhã às 20h30 pela Cultura, fazem um bom apanhado da história de um dos mais populares e pungentes cantores que este país já teve: o eterno boêmio Nelson Gonçalves (1919-1998). O motivo é de festa por sua memória: a comemoração de seus 90 anos de nascimento. O especial Nelson Gonçalves - 40 Anos, da TV Globo, que sai agora no DVD Eternamente Nelson, pela Sony Music, começa com a voz em off do cantor fazendo uma síntese precisa da própria biografia: "Meu nome é Antonio Gonçalves Sobral, gaúcho de Livramento. Minha vida sempre foi uma luta; minha arma, minha voz. Meu escudo, minha mulher, Maria Luiza, meu destino: cantar." Nos extras, entre outras histórias (algumas cômicas, outras barra-pesada) conta como foi rejeitado no início por Ary Barroso (1903-1964) em seu programa de rádio. Nelson comemorava então 40 anos de carreira, nos quais nunca faltaram parceiros fiéis, como o célebre compositor Nelson Cavaquinho (1911-1986), que o acompanha aqui ao violão em O Dono das Calçadas, que ele diz ter feito pensando no cantor. "Como é bom a gente ser amigo, como é bom a gente ser querido", diz a letra do samba, que traduz bem o momento de Nelson, então se recuperando do vício em drogas: "Eu que já vaguei nas madrugadas e já fui o dono das calçadas/ Pra todos aqueles que me estenderam a mão/ Dividi meu coração." Alguns de seus grandes sucessos estão presentes nos números musicais: Negue, Fica Comigo Esta Noite, A Volta do Boêmio, Escultura e Meu Vício É Você - todas com a assinatura de Adelino Moreira, um dos autores mais gravados por Nelson, bem como a dupla Jair Amorim e Evaldo Gouveia (de A Despedida e outras). Nelson também aparece em dueto virtual com Orlando Silva (1915-1978), a quem homenageia com Pedestal de Lágrimas, mais uma de Adelino Moreira. Com Orlando e Francisco Alves (1898-1952), Nelson formou aquela que ficou conhecida como a suprema trindade vocal masculina da era do rádio. Ao contrário de seus contemporâneos, porém, o último remanescente do estilo de voz empostada não ficou preso ao passado. No auge do sucesso caiu no ostracismo ao se atolar na cocaína e foi até preso por conta disso em 1963. Passado o pesadelo, porém, Nelson levantou-se lentamente e a partir da década de 1970, modernizando o repertório, gravou com diversos de seus admiradores - incluindo Maria Bethânia, Chico Buarque, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Lobão. No programa da Globo, exibido em 1981, com a voz recuperada, dividiu o microfone com as então novatas Alcione e Fafá de Belém. A Volta do Boêmio, sua assinatura musical, é prefixo tanto do especial da Globo, como de Mosaicos, da Cultura, narrado por Rolando Boldrin. Como nos outros da série, este resulta de um apanhado de imagens do acervo da emissora, com registros de Nelson em programas como Metrópole, Ensaio e Bem Brasil. Edith Veiga, Caçulinha, Adelino Moreira, Altemar Dutra Jr. e outros lembram Nelson em depoimentos e interpretações inéditas para alguns clássicos que ele imortalizou, como Maria Bethânia (Capiba), Caminhemos (Herivelto Martins) e Alguém me Disse (Evaldo Gouveia/Jair Amorim). Em quase 60 anos de carreira, ele cantou muito samba-canção, estilo romântico que o consagrou, mas também tango, bolero, toada, valsa, fado, modinha, choro e outros gêneros clássicos. Gravou mais de 2 mil canções em 183 discos de 78 RPM, cerca de 100 compactos e 100 LPs, vendendo em torno de 53 milhões de exemplares desses registros todos. Sem dúvida, números impressionantes. Não é pra qualquer um.

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