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O tenor das multidões

Morre, aos 71 anos, em Modena, sua cidade natal, o italiano Luciano Pavarotti, o mais pop e carismático cantor lírico de todos os tempos

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Por João Luiz Sampaio
Atualização:

O mundo da ópera não será mais o mesmo. É verdade que já há alguns anos o tenor Luciano Pavarotti afastara-se dos palcos, dedicando-se apenas a ocasionais aparições em concertos ao ar live. Mas sua morte, na madrugada de ontem, aos 71 anos, deixa um vazio difícil de ser preenchido. Havia, antes de mais nada, a voz, um timbre inconfundível, espontâneo, instintivo, natural mesmo. Mas não era só isso. Nenhum outro cantor lírico alcançou sua fama e atraiu tantas multidões por onde passava. Carismático, os braços abertos com o inconfundível lenço branco nas mãos, o sorriso largo... Pavarotti foi o tenor das multidões. E, com ele, se vai um dos personagens mais importantes de toda a história do gênero operístico. O tenor havia anunciado para 2006 sua turnê de despedida. Após alguns concertos, no entanto, foi hospitalizado em Nova York e passou por uma cirurgia devido a um câncer no pâncreas. Do hospital seguiu para a sua Modena natal, onde passou os últimos tempos acompanhado da família. Há cerca de dois meses, sua filha Giuliana afirmara em entrevista a uma revista italiana que seu pai sabia ter ''''pouco tempo de vida'''' à sua frente. Desmentidos oficiais se seguiram. Mas no início de agosto ele foi internado em uma clínica de Modena, por conta de uma febre alta. Há cerca de duas semanas, voltou para casa. Na tarde de quarta-feira, no entanto, fontes ligadas à família informaram a uma emissora de TV italiana que Pavarotti estava inconsciente e apresentava um quadro de insuficiência renal. Acompanhado por familiares e amigos, morreu em casa, às 5 da manhã (meia-noite no horário de Brasília). Obituários, perfis, entrevistas vão tentar dar conta nos próximos tempos da importância de Pavarotti. Não vai ser tarefa fácil. Por um lado, temos os seus grandes triunfos nos teatros de ópera - seu Rodolfo em La Bohème, os inúmeros papéis de Donizetti em que ele era imbatível, as gravações que deixou com Mirella Freni, Joan Sutherland e Montserrat Caballé, suas grandes companheiras de palco. Mas há também um Pavarotti mais polêmico, o cantor que nem sempre sabia escolher seu repertório, que fustigava a rivalidade com outros tenores, que enlouquecia os colegas com exigências como ensaios em seu quarto de hotel, que fazia concertos para multidões, cantando lado a lado com astros da música pop em duetos que muitas vezes beiravam o constrangedor, chegando a receber mais de US$ 1 milhão por aparição. De cara, o que se pode dizer é que os dois lados são fundamentais para se compreender Pavarotti e os motivos que fizeram dele, ainda em vida, um verdadeiro mito. Nos últimos anos, a cada temporada surgia no cenário um candidato ao posto de ''''o novo Pavarotti'''' - Roberto Alagna, Salvatore Licitra, etc, etc, etc. Uma coisa é clara. Pode esquecer. Pavarotti houve um só, no que teve de melhor e de mais contraditório. E figuras como ele não aparecem a todo momento.

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