PUBLICIDADE

''O grande desafio é educar''

A desigualdade no Brasil não vai diminuir, avisa Neca Setúbal, se não tivermos uma educação de qualidade

Por Sonia Racy
Atualização:

Maria Alice Setúbal - como o sobrenome indica - poderia ter optado por não trabalhar. Ou então, trabalhar pouco. Não foi o que aconteceu. A vida da única filha mulher de Olavo Setúbal era bem parecida com a de muitas outras mulheres até quando resolveu ter seu primeiro filho. Neca, como a chamam os amigos - apelido que veio de "Boneca", tratamento que lhe dava o pai - era socióloga formada e dava então aulas no Mackenzie. Decidida a se tornar mãe competente, fez meia-volta e mergulhou nos livros. Encantou-se com as idéias do francês Jean Piaget, juntou-se com duas amigas e criou uma pré-escola. Sua cruzada, desde então, foi ajudar a fazer da educação um proceso de transformação, de fato, das pessoas e da sociedade. À frente de uma ONG, o Centro de Estudos e Pesquisa de Educação e Cultura e Ação Comunitária, ou Cenpec, ela arregaçou as mangas, conheceu os abismos entre teoria e prática, o peso da burocracia, a distância entre pais e escolas. Hoje, a Cenpec trabalha com 400 dos 1.200 municípios selecionados pelo MEC como os mais carentes. "O grande desafio neste país é educar", avisa. "Mas falta gente e muita qualidade, faltam 200 mil professores em áreas de matemática, ciências, física." Nesta conversa com a coluna, ela adverte: "Se a gente quer ser um país desenvolvido tem de se transformar em uma sociedade mais justa. E a educação é um grande fator para diminuir um pouco a desigualdade." Cada vez mais gente diz que a principal, ou única, saída para o Brasil é a educação. Você concorda? Sim. Nenhum país no mundo entrou num estágio desenvolvido, com qualidade de vida, sem uma educação básica de qualidade. Mas ela sozinha não resolve. Por exemplo, a educação não bastou para fazer de Cuba um país desenvolvido. E no Brasil, sem educar, não teremos desenvolvimento. Falta mão-de-obra qualificada. Dou um exemplo: eu e meus irmãos temos uma fundação, a Tide Setúbal - não tem nada a ver com o Banco Itaú. Nosso foco de atuação é São Miguel Paulista. Ali articulamos parcerias com prefeitura, ONGs, empresas, associações. E temos um trabalho intenso com as escolas e universidades. E o que nos dizem os líderes comunitários? Que a questão maior não é falta de emprego, é a qualificação. A população tem consciência disso e prioriza a educação? De um modo geral, sim. Mas vejo também um grande abismo entre as escolas e os pais. De um lado a escola não abre as portas. E do outro, os professores põem a culpa da baixa qualidade da educação nesses pais, que não ligam, nem vão às reuniões. Por que isso acontece? São dois mundos que não se falam, que têm lógicas diferentes. No geral, a escola é muito fechada. E há outra questão crucial que é a gestão nos municípios. Muita coisa depende do Ministério da Educação, que fica em Brasília. O município, lá longe, no Piauí, não tem recursos, nem sabe onde pedir. É aí que entra o Cenpec? Ele fez parte de um trabalho que era chegar ao município e formular um projeto pedagógico, para ser apresentado ao MEC. Hoje, lidamos com 400 dos 1.200 municípios mais carentes, todos no Norte e Nordeste. Como é esse trabalho? A primeira etapa de contato já foi feita. Na segunda, são quatro visitas técnicas ao longo do ano. Para ver se o dinheiro chegou, se está sendo bem usado. Também capacitar os secretários, o próprio prefeito. Fizemos um trabalho aqui, com a secretária de Educação paulista, Maria Helena Guimarães, visando à recuperação dos alunos. O Cenpec desenvolve todo o material didático dessa recuperação. E faz trabalhos com fundações empresariais. O Itaú Social tem projetos de apoio a escola em municípios como São Carlos, São Bernardo do Campo - e aí define uma parceria com o secretário da Educação, sobre educação básica, ensino médio, pré-escola, educação infantil. Como você se interessou por educação? Por formação, sou socióloga. Dei aulas de Sociologia no Mackenzie, fiz mestrado na USP. Quando tive filho, minha vida mudou radicalmente, comecei a me interessar por educação. Com duas amigas, criei uma pré-escola e resolvi assumir, ser professora de pré. Comecei a ler os livros de Jean Piaget, fiquei encantada com essa forma de trabalhar. E daí para a prática? Em 1985 escrevi um livro relatando toda essa história. Foi um sucesso, até ganhou o Prêmio Jabuti em 1987. O livro motivou a editora Ática, que o havia editado, a fazer um teste da metodologia em duas escolas públicas, em Osasco e Carapicuíba. Para tanto, criei uma forma jurídica para eles apoiarem. Era o Centec. Isso não seria uma coisa para o Estado fazer? O Estado é o fator principal na educação, mas acho que ele sozinho não consegue fazer uma sociedade organizada. Em alguns lugares, como Belo Horizonte e São Paulo, a sociedade tem um papel articulado com as políticas públicas. Mas no geral falta muita gente e muita qualidade. Faltam 200 mil professores nas áreas de matemática, ciências, física, química. Por isso apóio muito a secretária Maria Helena, em São Paulo, onde estão premiando os melhores resultados. Mas a sociedade tem de participar disso, não? A sociedade já faz muito, mas ela tem de pressionar, cobrar. Mas veja o caso do ensino médio. Os jovens estão abandonando a escola, porque os pais os pressionam a trabalhar. Se o jovem não terminar o ensino médio, não vamos sair da linha de pobreza. Nisso estamos engatinhando. As pessoas não confundem você com o Itaú? Muito. No começo foi complicado. Com o tempo comecei a perceber que o problema era mais meu que das outras pessoas. Aí, tudo ficou melhor. Você passou algum tempo na Colômbia, não? Trabalhei em 1998/99 na Unicef e me convidaram para ser responsável pela educação na América Latina e Caribe, pela instituição. Para isso eu precisaria morar na Colômbia - e não podia. Negociamos ficar 15 dias lá e 15 aqui. Conheci muitos países do continente. Acho bonito você ir a um lugar que não tem condições e encontrar uma pessoa maravilhosa, dedicada, que constrói coisas a partir do nada. Como socióloga, acha que um dia o mundo vai ser mais justo? Se a gente quer ser desenvolvido, tem de se transformar em uma sociedade mais justa. Acho que nisso estamos caminhando. E seu conceito de ser humano? Acredito no ser humano, mas não sou ingênua. É tão fácil explodir as coisas, roubar, seqüestrar, mas ao mesmo tempo você vê atos tão maravilhosos das pessoas. É fácil também distribuir, construir. Na frente Saiu da prancheta de Isay Weinfeld o projeto do quiosque de vendas do empreendimento imobiliário que os irmãos Kim e George Esteve lançam, hoje, na Chácara Flora. Do alto de seus 23 anos, Scarlett Johansson quer mais. A atriz - e atual musa de Woody Allen - vai lançar um disco, no qual divide duas faixas com David Bowie. E mais: acaba de fazer sua estréia atrás das câmeras, dirigindo Kevin Bacon. Marcada para hoje a entrega do Troféu Imprensa, no SBT. Detalhe: durante toda a semana foram anunciados os indicados. Maioria absoluta da Globo... Os 50 anos da Rádio Eldorado serão comemorados de forma ecológica. Cinqüenta mudas vão ser plantadas numa cerimônia marcada para amanhã, no Projeto Pomar Urbano. Guru da antiginástica, Thérèse Bertherat acaba de desembarcar no Brasil para acompanhar grupos de formação e reciclagem. Carlos e Rita França - do Buffet França - embarcaram para temporada de gastronomia em Paris. Voltam com Axel Benmessahel - do estrelado L?Atelier - a tiracolo, para intensivão com os cozinheiros locais. Os arquitetos Thiago Bernardes e Paulo Jacobsen acabam de ganhar quatro páginas na Domus, prestigiada revista italiana de arquitetura e design. Em pauta, a área de convivência criada pela dupla para o TIM Festival, no Rio. De bem com a crítica americana, o artista brasileiro Gustavo Von Ha levou uma de suas instalações para a Fire House Art Gallery, em Nova York. Se faz parte de seus planos uma temporada de esqui em Portillo, desista. Não há mais vagas para as semanas de férias. Com dólar em baixa, os brasileiros - literalmente - invadiram a área. Impressão pessoal Celso Amorim Tem de tudo nesta novela trágica Venezuela-Equador-Colômbia. O chanceler Celso Amorim saiu-se com esta, em depoimento no Senado, semana passada: "Não classificamos as Farcs de grupo guerrilheiro, beligerante ou criminoso porque isso poderia atrapalhar nossas estratégias diplomáticas e humanitárias." Ministro, não deixe eles saberem disto não...

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.