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O fim inevitável de todas as coisas

Em Cinemateca, Eucanaã Ferraz faz da luz metáfora da passagem do tempo

Por Francisco Quinteiro Pires
Atualização:

O poeta carioca Eucanaã Ferraz (1961) diz pensar com o olho. Em Cinemateca, que chega às livrarias hoje, ele dialoga com o cinema: os poemas, agora mais narrativos do que nos primeiros livros - Livro primeiro (1990) e Martelo (1997) -, exploram elementos de alta plasticidade. ''Descubro um título, que é um conceito, e o livro gira em torno dele depois'', diz. Não seria diferente com quem acordou para a poesia a partir das obras do escultor austríaco Franz Weissmann e do pintor francês Henri Matisse. Para ele, a manipulação da forma poética é um jeito de conter a emoção, com o cuidado de não desidratá-la. Dividido em três partes - 1ª, 2ª e 3ª Luz -, Cinemateca (Companhia das Letras, 170 págs., R$ 36), ao flertar com um dos aspectos do cinema além da câmera e ação, também se configura em metáfora da passagem do tempo. É um livro que vai escurecendo do começo para o fim (as luzes enfraquecem) e no qual estão a manhã, a tarde e a noite de uma vida, de um amor, de um lugar, de um único dia. Assim, a claridade dá lugar à escuridão, o amor ao desencontro, a sanidade à loucura, a vitalidade à decrepitude num fluxo irrefreável. ''A odisséia do homem moderno é diária.'' Eucanaã Ferraz transforma o cotidiano - as situações banais, apesar do viver ser em si extraordinário, como ele diz - no alimento central para sua poesia. ''Embora não procure nada além, gosto do absurdo da existência.'' Os versos se fazem cenário de vários personagens, entre eles o doido, o pintor, o mágico, a empregada doméstica, para mostrar os momentos dramáticos desses indivíduos que poderiam ser os próprios leitores de Cinemateca.

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