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Nos 50 anos de carreira, o fotógrafo Cristiano Mascaro ganha mostra

'O Que os Olhos Alcançam' reúne imagens que contam sua trajetória desde o início como fotojornalista até seus clássicos registros da paisagem urbana e humana das cidades

Por Simonetta Persichetti
Atualização:
A intensa movimentação no Viaduto do Chá, em 1983 Foto: Cristiano Mascaro

Foi assim, quase como uma epifania, que o aluno da Faculdade e Arquitetura da USP (FAU) Cristiano Mascaro, que gostava de se refugiar na biblioteca da escola naqueles anos 1960, descobriu a imagem. 

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Foi com o livro Images à la Sauvette, do fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson (1908-2004), que a fotografia entrou na sua vida, há 50 anos. E agora essa trajetória do seu olhar, que há meio século nos narra a história das cidades, foi reunida na exposição O Que os Olhos Alcançam. Mostra que será aberta nesta quinta-feira, dia 28 de março, no Sesc Pinheiros sob a batuta do pesquisador e curador Rubens Fernandes Junior, que garimpou no arquivo do fotógrafo os momentos de um olhar preciso e precioso que, palmilhando ruas e sonhos, nos ensina a observar o nosso entorno que, simplório na aparência, revela imagens incríveis. 

O resultado são 200 fotografias reunidas desde suas primeiras investidas, sua passagem pelo fotojornalismo, até se tornar conhecido como o fotógrafo das cidades, não do registro e da arquitetura, mas da interpretação dos lugares que habitamos, que vivemos e que nos constituem como cidadãos. 

O fotógrafo e arquiteto Cristiano Mascaro Foto: Gabriela Biló/Estadão

“Ao selecionar as fotografias dentro de um repertório eclético e versátil, trabalhamos com a possibilidade de relacionar algumas potências que sua carreira permite vislumbrar, por exemplo: a questão técnica (analógico e digital); diferentes câmeras e formatos (negativos 35 mm, 6X6, 6X9, matriz digital); a história do Brasil (ciclo da cana, do ouro, da borracha, do café); as questões políticas (centradas no início de sua trajetória no fotojornalismo); a arquitetura e os principais profissionais do Brasil e do exterior; múltiplas narrativas e a influência da literatura em seu trabalho; as principais influências – Henri Cartier-Bresson, Robert Frank, G.E. Kidder Smith, entre outros; a história da fotografia de São Paulo e de outras cidades por meio da arquitetura”, explica o curador.

Curiosamente, Mascaro começou no fotojornalismo. Embora desde adolescente gostasse de andar pelo centro de São Paulo, foi o resultado de uma viagem ao Peru e à Bolívia em busca do mito Che Guevara, que, “infelizmente ele não encontrou”, atraído pela paisagem urbana e humana resolveu se inscrever num concurso de fotografia, cujo júri composto por seu professor João Xavier e pelos fotógrafos Claudia Andujar e Fernando Lemos lhe deu o primeiro lugar, ao lado de outro concorrente.

Entusiasmado, procurou Claudia Andujar, já conhecida por suas imagens na revista Realidade, publicada pela lendária Editora Abril, nos anos 1960. Claudia o levou para a Veja, que estava nascendo, e foi lá na revista lançada em 1968, que Cristiano Mascaro, começou na fotografia: “Estava encantado com a revista Realidade, com a revista Life e com a agência Magnum. O fotojornalismo foi minha primeira escola”, comenta. Uma escola que lhe deu a expertise para ele sempre voltar com uma fotografia. Não havia tempo, chuva ou demora, o importante sempre foi conseguir a imagem. Foram três anos de fotojornalismo, quebrados por um intervalo de dois vividos em Paris com uma bolsa de estudos de arquitetura, junto com sua mulher, Satiko. 

Ao retornar, foi convidado a gerenciar o laboratório audiovisual da FAU. Com sua experiência jornalística, começa a criar as próprias pautas, a viajar pelo País, pelo mundo, sempre com a mesma ideia de contar a história das cidades. Passa a viver exclusivamente da fotografia. Mas, além dos trabalhos de outros fotógrafos, sua inspiração vem principalmente da literatura, em especial de Antonio Candido (1918-2017). “Lembro do livro Recortes, no qual Candido escreve uma crônica, Desfeito e Refeito, que tem tudo a ver com a fotografia, o olhar e recriar”, relata Mascaro.

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A cidade de Recife refletida nas águas doRio Capibaribe, em 2006 Foto: Cristiano Mascaro

Também cita outra forte influência, o escritor argentino Ernesto Sabato (1911-2011) e seu livro O Escritor e Seus Fantasmas. “Admiro a possibilidade narrativa da literatura, de contar histórias”, afirma ao reverenciar Italo Calvino (1923-1985) e suas Cidades Invisíveis.

Na fotografia, seu grande mestre talvez seja Robert Frank (1924) que, em 1958, quebrou todas as regras técnicas e saiu fotografando pelo mundo e registrando apenas o que via. Assim é Cristiano Mascaro, que também sai pelo mundo retratando o que seu olho lhe permite ver, ou – retomando o nome da exposição – o que seu olhar alcança. 

Ao mesmo tempo, segue e registra as esculturas do norte-americano Richard Serra (1938), a paisagem de Portugal, o Patrimônio do Brasil, a arquitetura dos grandes mestres e, por que não, uma imagem de celular, que não perde a poesia do seu olhar.  “Fotografar é criar com a força transfiguradora do olhar”, afirma, aos 74 anos, o fotógrafo e arquiteto paulista. CRISTIANO MASCAROSesc Pinheiros. Rua Paes Leme, 195, tel. 3095-9400. 3ª a 6ª, 10h/22h; sáb., dom. e feriados 10h/19h. Até 23/6 

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