Nixon, elo entre as obras de Howard e Snyder

Ex-presidente faz a ponte entre Frost/Nixon e Watchmen, que misturam TV e quadrinhos e realidade e ficção para retraçar a história dos Estados Unidos

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Há um elo que une Watchmen, de Zack Snyder, e Frost/Nixon, de Ron Howard, duas das principais estreias de hoje nos cinemas de São Paulo. Há uma terceira grande estreia e é Quem Quer Ser Um Milionário?, de Danny Boyle, vencedor de oito Oscars, incluindo melhor filme e direção, na recente premiação da Academia de Hollywood. Mas Watchmen e Frost/Nixon interessam mais, neste momento. O elo é o ex-presidente Richard Milhous Nixon, um dos mais polêmicos da história dos EUA. Veja trailer de Frost/Nixon Em 1975, pressionado pelo clamor produzido pelas denúncias de seu envolvimento no caso Watergate, Nixon renunciou à Presidência, para evitar o impeachment. Frost/Nixon começa justamente com a renúncia. Nixon abandonou a Casa Branca, mas não admitiu sua culpa nem pediu desculpas ao povo norte-americano. O jornalista britânico David Frost farejou o que seria a grande matéria - uma entrevista, na TV, em que Nixon, encurralado, abriria enfim a guarda para falar sobre Watergate. O fato ocorreu, a história é real, mas, como volta e meia ocorre nas ficções do diretor Howard, a realidade é mais complexa e intervém de forma inesperada. Em Apollo 13, os astronautas norte-americanos ficam sem rumo no espaço e o que seria uma tragédia vira um relato de segunda chance. Em Frost/Nixon, quem começa a se sentir encurralado é o jornalista, não o ex-presidente, um político ladino que tira proveito de sua imagem de estadista. Chega o momento em que Frost, sozinho na noite, avalia o que parece sua derrota e até desmoralização profissional. É quando toca o telefone. Do outro lado da linha, Nixon. O telefonema ocorreu de fato? O próprio ex-presidente faz a pergunta a Frost. Pode ser licença poética, ou dramatúrgica, do roteirista Perter Morgan, mas funciona admiravelmente, como ponto de inversão. O duelo entre os atores Michael Sheen e Frank Langella é sensacional e Langella, como Nixon, consegue ser mais nixoniano do que o ex-presidente. Pode ser outra licença do roteirista, mas o desfecho, quando ele, tenso, abandona o local da entrevista e trava aquele curto diálogo com a dona do cão a quem acaricia, beira a perfeição. Richard Milhous Nixon, cão sem dono? Um outro Nixon, interpretado por Robert Wisden, aparece em Watchmen. O filme de Zack Snyder, diretor de Madrugada dos Mortos e 300, baseia-se na graphic novel de Alan Moore e Dave Gibbons. Moore é um dos personagens mais excêntricos dos quadrinhos, recluso como o lendário J.D. Salinger, de O Apanhador no Campo de Centeio. O próprio Moore, que cria quadrinhos como romances, declarou certa vez que considerava Watchmen ?intrinsicamente infilmável? e Terry Gilliam, que acalentou durante anos o sonho de adaptar a graphic novel, desistiu porque achava que, menos de cinco horas e meia de duração, equivaleriam a uma diluição do original. A versão de Zack Snyder tem 2h40. Como em A Liga dos Heróis, é a história de uma fraternidade de super-heróis, que, logo no começo, estão dispersos ou sendo dizimados. A ação passa-se nos anos 70, sob a presidência de Nixon. Os super-heróis haviam adquirido tal poder que sua atividade foi regulamentada pelo Congresso dos EUA. É nesse quadro que se tece a intriga. Quem está liquidando os Watchmen, e por quê? A trama complicada envolve heróis que perderam o bonde da história. São amargurados e solitários. Nixon, mentiroso contumaz, é o presidente - sugestivamente com um nariz de Pinóquio. Alguém está tentando evitar o apocalipse atômico - ainda havia a URSS - e selando um acordo de paz, mas há um alto preço a pagar. Watchmen mostra o mundo como poderia ter sido, a partir da Guerra do Vietnã. Nixon é peça fundamental. O visual, como sempre em se tratando de Zack Snyder, impressiona e é o máximo que se pode elogiar. Serviço Frost/Nixon (Frost/Nixon, EUA/Reino Unido, 2008, 122 min.) - Drama. Dir. Ron Howard. 14 anos. Cotação: Bom

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