''''Neocensura impõe limite absurdo''''

Prestes a testar novo formato, Carlos Lombardi critica a classificação etária que diz promover uma ''''caretização'''' da narrativa

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Por Patricia Villalba
Atualização:

Romances açucarados, opostos que se atraem, explosões e Marcos Pasquim (provavelmente) sem camisa são alguns dos ingredientes de Guerra e Paz, especial de fim de ano da Globo que leva a assinatura de Carlos Lombardi. Senhor do horário das 7 na emissora, o autor volta à TV num formato diferenciado, mas sem deixar de lado os elementos que garantem há anos o sucesso de seus folhetins, como as saudosas Vereda Tropical (1984), Quatro por Quatro (1988) e Bebê a Bordo (1994). Lombardi une mais uma vez Pasquim e Danielle Winits, um dos seus casais preferidos de atores, que dele fizeram também Uga-Uga (2000), a minissérie O Quinto dos Infernos (2002) e Kubanacan (2003). Ela é Bárbara, escritora frustrada que leva a vida escrevendo romances açucarados de banca de jornal, sob o pseudônimo Paloma Paz. Ele é o policial Pedro Guerra, um ex-conquistador que hoje é amargurado e sonha ser padre. Os dois foram colegas de escola e - adivinhe - o moço foi a grande paixão da moça na adolescência. Num improvável reencontro, eles acabam envolvidos num crime. Nesta entrevista, Lombardi fala sobre o programa, a vontade de voltar a escrever para o cinema (é dele, por exemplo, o roteiro de Um Trem para As Estrelas, de 1987), a classificação etária da programação e a aventura de conquistar a audiência do problemático horário das 7. Um policial que quer ser padre e uma escritora de livros açucarados. Onde entra o livro de Tolstoi na história? Ou o nome do programa não tem mesmo nada a ver com o clássico? Nada a ver com Tolstoi. Só a brincadeira do título. O policial se chama Pedro Guerra e o pseudônimo artístico de Bárbara, a escritora, é Paloma Paz. Você escalou Danielle Winits e Marcos Pasquim mais uma vez. Podemos dizer que é seu casal preferido de atores? É um deles. Não o preferido. Não tenho um casal preferido. Tenho alguns. Eles estão na lista. A gente sabe que a Globo testa novos programas no fim do ano. Qual a expectativa de que Guerra e Paz entre na grade da emissora no ano que vem? Se o programa continuar, segue o formato de uma sitcom? Não sei se entra na grade ou não. Quem determina é a Globo. Depende de a gente mostrar que dá pra fazer um programa semanal mais barato que o especial, com certeza. Mas não é uma sitcom. É uma comédia-policial, ou seja, tem externas e ação. A comédia romântica, estilo de Guerra e Paz, não é amplamente explorada no cinema brasileiro. Você não pensa em voltar a escrever para o cinema? Tem algum projeto? Eu penso em escrever, sim. O problema é que não sou eu quem me escalo, são os produtores e diretores. Aguardo convites. Tenho um do (produtor) Diller para um filme, adaptação de um romance que sugeri pra ele. Em janeiro vou saber se vou poder escrevê-lo ou não. Sua atuação como autor de novelas é fundamentalmente no horário das 7. E você tem no currículo boa parte dos títulos mais memoráveis dessa faixa, como Bebê a Bordo, Vereda Tropical, Quatro por Quatro. Hoje, a gente ouve falar que o horário das 7 é difícil. Concorda com isso, acha que o público desse horário é mais difícil de agradar? Acho (e sempre achei) dificílimo. Agora é mais. Especialmente com os limites absurdos que a neocensura tem nos imposto. Você sabia que Uga-Uga e Kubanacan não podem ser reprisadas no Vale a Pena Ver de Novo porque não receberam classificação livre? Embora a telenovela ainda seja muito vista, a gente percebe que as tramas não causam mais aquele arrebatamento inicial de antes, demoram mais para obter a fidelidade do público. A audiência hoje preocupa mais, menos ou igual aos tempos de Bebê a Bordo, por exemplo? Preocupação a gente sempre tem. O que acontece agora é que há muito mais opções para a audiência. Acho que está havendo um processo de caretização da narrativa que é prejudicial para a Globo, o público dela sempre esteve acostumado com mais ousadia. Cada noveleiro de renome tem sua marca. Dizem que a sua é a ação, humor e diálogos ágeis. Eu vejo outra coisa, além disso: suas novelas são sempre muito joviais, cheias de frescor - e pelo que sei de Guerra e Paz, isso se mantém. Você tem uma receita para passar tanto tempo falando sobre e para esse público da casa dos 20 anos sem parecer um tio, imprimindo autenticidade? Não tenho receita nenhuma. Tento só ser antenado. Mas vendo a lista do público no Orkut, vendo as idades do pessoal que (graças a Deus) gosta dos meus trabalhos, sinto-me um tio Sukita. Com charme, mas tio. Lendo sobre você para a pesquisa desta entrevista, me toquei de que você foi colaborador de Silvio de Abreu. Não me surpreendeu, dá para perceber uma linha ligando os textos de vocês dois, embora tenham estilos diferentes. Qual foi a melhor lição que aprendeu com ele, naquela época de Vereda Tropical? Fui colaborador de Silvio em Jogo da Vida e em Guerra dos Sexos. Vereda foi uma novela minha com supervisão do Silvio. Fui também colaborador de Cassiano (Gabus Mendes) em Elas por Elas e quebrei alguns galhos pra ele em outras novelas que estavam pela metade. Aprendi com os dois a respeitar minha intuição, a escrever para o elenco que eu tenho, a valorizar o trabalho de atores e atrizes e que novela, antes de mais nada, é uma guerra. Aprendi com eles sobre carpintaria, sobre construção de personagens, tive a sorte de ter dois professores de primeiríssima. Converso com Silvio e tenho saudades de Cassiano.

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