''Não há drama na volta de Dedé''

Renato Aragão e o parceiro falam da reconciliação após 15 anos, mas não explicam razão da briga

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Por Patricia Villalba
Atualização:

No reino das vaidades que é o meio artístico, não é comum ver alguém voltar atrás e superar desavenças. Circenses que são e, por isso, membros de uma mesma família, Renato Aragão, o Didi, e Dedé Santana retomaram uma parceria que estava em suspenso por 15 anos, quando o quarteto Os Trapalhões (além dos dois, Mussum e Zacarias) anunciou a separação. "Ele é o meu irmão de criação. Criação de pato, galinha, porco...", caçoa Didi numa cena de A Turma do Didi, que a TV Globo exibe aos domingos. Dedé voltou a gravar na Globo no dia 17 de junho, após uma pequena via-crúcis de Renato Aragão nos bastidores da emissora. Desde que rompera com Renato, ele havia passado pela Record e se apresentava no parque Beto Carrero World. "Durou só uma semana", relatou Didi, procurando afastar os boatos de que havia resistência da Globo à recontratação de Dedé. "Enfim, conseguimos." Os dois humoristas receberam o Estado nos estúdios da Globo minutos antes da gravação de A Turma do Didi. Falaram sobre a volta que já entrou para a história da TV e sobre piadas que as crianças sempre riem, como "quem nasce no Alasca é lascado". Por que foi tão difícil trazer o Dedé de volta para a Rede Globo? Renato: Na primeira investida, nós conversamos pelo telefone, mas o Dedé tinha contrato com o (parque) Beto Carreiro World e não é ético da parte da Rede Globo chamar um artista que tem contrato com outra empresa. Essa foi a dificuldade. O tempo passou, o contrato terminou e eu retomei a negociação com a Globo. Daí não teve muito problema não, não houve resistência nenhuma. Não teve, então, aquela história de que você estaria convencendo a Globo aceitar o Dedé de volta? Renato: Teve, mas pouco. Não foi nada dramático. Você sabe como é que é. Começaram a dizer: "A Globo não quer o Dedé." Não foi nada disso. A Globo quis saber como era a situação dele, se não tinha mais contrato com ninguém, coisas normais. Para falar com um diretor-geral,é necessário tempo, você não chega numa pessoa dessas com facilidade. Teve uma via-crúcis dentro da emissora, mas durou só uma semana. Enfim, conseguimos. A volta de vocês foi muito comentada pelos fãs na internet. Como foi para vocês voltar a trabalhar juntos? Renato: Não imaginava que teria tanta repercussão entre os fãs dos Trapalhões, que foi quem assistiu a gente junto e que tinha muita saudade daquela época. Ficamos muito felizes. Por um lado, por nos reencontrar, e por outro, por causar essa alegria tão grande. Dedé: Meu irmão (Tino Santana), que fez vários filmes com a gente, chorou quando nos viu na TV. Foi mais um sonho que eu realizei. Um deles, era dirigir um filme. E quem o realizou pra mim foi o Renato, que me pôs na direção de um filme (Atrapalhando a Suate, 1983). Agora, ele realizou outro, que era voltar a trabalhar com ele. Na época dos Trapalhões, vocês pareciam trabalhar bastante com improvisações e tinham muito entrosamento. Como foi quando pisaram de novo no estúdio, a parceria estava com ou sem ferrugem? Renato: Esse negócio de trabalhar com humor é igual a andar de bicicleta, você não perde nunca. Pega na hora. Na verdade, a gente trabalhou junto vinte e tantos anos, e aquilo ficou na memória. Foi só montar um esquete parecido com aqueles e engrenou. Mas logo quero fazer algumas mudanças no programa. Deu para perceber que o que vocês fizeram no primeiro episódio foi igual ao tempo dos Trapalhões. Renato: Pois é. Vai haver mudança, mas não é uma mudança muito grande não. É igual, mas também é diferente. Mas o humor em geral não mudou desde os tempos dos Trapalhões? Renato: Não é o humor que mudou, mas a sociedade mesmo. A criança hoje convive com videogame, internet, um circo eletrônico, recebe uma quantidade enorme de informação. Agora, o humor de um modo geral compete com isso. O nosso humor é diferente, porque é circense, universal. Não quero fazer humor para adulto, sátira política, nem humor intelectual. Quero fazer humor para a família e para a criança. E esse humor não muda, é o mesmo desde os tempos do circo. Dedé: O Chico Anysio disse uma vez para o Renato: "Você tem sorte, porque criança nasce todos os dias." O nosso humor se renova automaticamente. E, afinal, vocês ficaram sem se falar mesmo durante todo esse tempo? Por que vocês brigaram? Renato: Não quero falar sobre isso. Faz 15 anos que isso aconteceu e vocês (jornalistas) perguntam sempre. Agora, eu é que pergunto para você: como é que foi a briga? (risos) Não tenho certeza, ouvi dizer que foi divergência envolvendo dinheiro. Renato: Nada disso. Cada um foi trabalhar separado. Eu tinha a minha empresa, eles tinham a deles (Dedé, Mussum e Zacarias). Eu fico chateado porque às vezes valorizam mais essa briga do que o nosso próprio trabalho na televisão. Isso é ingrato com a gente. Dedé: Nós nos falamos durante esse tempo. Houve muita injustiça com o Renato. Renato: Sempre senti que a gente era muito discriminado no cinema e na televisão pelo nosso tipo de humor, mas eu nunca quis fazer humor político para ser reconhecido. Eu sabia que esse reconhecimento viria. Será que isso se dá porque as crianças que assistiam vocês nos anos 70 são adultos hoje? Renato: Sim, deve ser. Agora eles podem dizer. Aquela geração ranheta já passou. Falavam que a gente fazia um humor de subdesenvolvido. Não tenho essa memória, sempre achei que vocês eram estrelas. Renato: Ah, você não tem idéia... Dedé: A gente jogava torta um na cara do outro e os caras metiam o cacete na gente. Pensa que cair de uma cadeira é fácil? Não é. Você quase quebra as costelas na cena e ainda falam mal de você depois. Renato: Quando a gente começou, o humor vinha do rádio. Era um humor parado, e se você estivesse de costas para a televisão, conseguia entender. A gente chegou na televisão com um humor visual, de televisão mesmo. Os próprios humoristas, os medalhões, ficaram revoltados com a gente. Aí, as crianças se sentiram atraídas pela ação e não por aquela palavra apenas falada. A parceria de vocês vai voltar ao cinema também? Renato: O próximo projeto - O Guerreiro Didi e a Ninja Lili 2 - já estava escrito sem o Dedé. Mas no próximo, espero que estejamos juntos. Mas o principal agora é transformar A Turma do Didi para receber bem o Dedé. Não precisa mudar muito, todos aqui do elenco adoraram ele. E vocês se conheceram como? Renato: Foi nos anos 60. Eu tinha vindo do Ceará. Dedé: E eu já usava o nome Dedé no teatro. Renato: Eu ia ser contratado pela TV Tupi e precisava formar uma dupla. Conheci vários, até encontrar o Dedé. Começamos com um quadro chamado Os Legionários, em 64. Era um tempo de ditadura e eu queria fazer um quadro com recrutas, mas não podia falar nada sobre o Exército. Usamos, então, legionários. E como quem fez humor em plena ditadura convive com o patrulhamento politicamente correto? Algumas piadas do Mussum, por exemplo, não poderiam ser feitas na televisão hoje em dia. Renato: Exatamente. O politicamente correto é muito ruim, porque você não pode falar sobre determinadas coisas. Nada que remeta a racismo, nem gordo, nem magro, nem feio, nem a mulher, nem o homem. Antes podia, mas não era para ofender, mas sim para brincar. Hoje não pode mais. Mas, também, não faz diferença pra gente. Onde tiver torta na cara, água, falta de luz, corre-corre, extintor de incêndio, a gente se vira.

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