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Morre Paula Rego, pintora ícone do feminismo

Artista portuguesa radicada em Londres tinha 87 anos e foi condecorada pela rainha Elizabeth

Por Matheus Lopes Quirino
Atualização:

Morreu nesta quinta-feira, 8, a pintora Paula Rego, aos 87 anos, em sua casa em Londres, onde era radicada desde a década de 1970. O governo de Portugal declarou luto oficial em memória da artista, uma das mais influentes da pintura modernista portuguesa, com obras em museus estrangeiros como Victoria and Albert e Tate, ambos na capital inglesa. 

De família abastada, Paula Rego viveu à beira-mar quando criança, sofria de tuberculose, morou no Estoril e também em Ericeira, pequeno vilarejo que lhe rendeu memórias para o resto da vida. Em entrevista ao jornal português Público, a pintora classificou que suas mais profundas lembranças surgiram daquele lugar.

A pintora portuguesa Paula Rego em 2004, ela criou trabalhos inspirados em contos de fada Foto: Paulo Duarte/AP

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Das memórias de infância, a pintora criou todo um imaginário lúdico em sua obra, tendo começado, na década de 1970, uma pesquisa  baseada nos contos populares portugueses, com uma série de guaches. 

Feminista, as mulheres tiveram um papel central na obra da pintora, que retratou a força feminina em diferentes alegorias, como na série em pastel Mulher Cão, de 1994, uma referência à própria obra (na década passada, 1980, começou a pintar várias telas em outra série que intitulou  Menina e o Cão), em que discutia o lugar desta força e questões de domínio. Paula Rego foi antenada na política de sua terra natal, mesmo morando no exterior, tendo apoiado a emancipação feminina e as pautas do movimento em Portugal, como o aborto. Ela pintou diversas cenas de mulheres em situações degradantes, que viraram referência para artistas das novas gerações. 

Uma das pinturas da exposição 'Old meets new', que estão no Cascais, no museu da artista, com trabalhos inspirados na obra de Eça de Queiroz Foto: EFE

Prolífica, a artista bateu recorde em um leilão de 2015 com o quadro O Cadete e Sua Irmã, de 1988, que foi arrematado por 1,6 milhão de euros. 

Várias fases marcam o trabalho da artista, ela experimentou com diversas técnicas, como colagens, óleos, desenhos e esculturas, tendo, durante sua carreira, mudanças radicais em seu estilo, mas sempre com a figura da mulher no centro, em narrativas que remetem à dor e transcendência. Era uma pintora poderosa, tendo refeito sua carreira depois da bancarrota familiar, ainda na juventude, e trilhado caminho acadêmico no estrangeiro (foi professora de pintura). 

ícone do movimento feminista, ela pintou uma série inspirada no aborto, tema que mobilizou portgal há alguns anos Foto: Pinacoteca do Estado de São Paulo/divulgação

Paula Rego enfrentou a depressão e a doença do marido Victor Willing (1928 – 1988), que morreu após uma esclerose múltipla. Esse espírito de morte, por vezes, foi transportado para seus quadros atmosferas soturnas e figuras enfastiadas, como na série de desenhos sobre depressão produzida entre os anos 2006 e 2007. 

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Nos últimos anos, a pintora ganhou um documentário, Paula Rego: Histórias & Segredos, de Nick Willing, seu filho, co-produzido pela BBC. Em seu universo, o onírico se misturava com o zoomorfismo, em pinturas de animais estilizados, em fusão com personas humanas e criações que transitavam entre o animal e o homem. Esse aspecto animalesco, sem rudeza, era projetado em telas com toque de conto de fadas. 

Condecorada pela rainha Elizabeth 2º em 2010, com a comenda da Ordem do Império Britânico dada pela sua contribuição com as artes do país, Paula Rego ganhou dezenas de prêmios e, em 2009, inaugurou-se o seu museu no Caiscais, a Casa das Histórias Paula Rego. 

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