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Morre Béjart, coreógrafo do aqui e agora

Sempre contemporâneo, tinha 80 anos e, mesmo doente, trabalhava

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Por Redação
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Morreu ontem em Lausanne, Suíça, o coreógrafo e bailarino francês Maurice Béjart, aos 80 anos. Ele tinha sido hospitalizado no dia 16, pela segunda vez, para um tratamento renal e cardíaco. Deixou cerca de 250 balés. Apesar da saúde frágil, Béjart supervisionava cotidianamente as atividades de sua companhia, especialmente o novíssimo balé A Volta ao Mundo em 80 Minutos (Tour du Monde en 80 Minutes), que deverá estrear no dia 20 de dezembro em première mundial em Lausanne, depois vai a Paris, em fevereiro, e segue para turnê mundial. Nascido no dia 1º de janeiro de 1927 em Marselha, França, Maurice Berger (que mais tarde adotaria, em tributo a Molière, o sobrenome da esposa deste, Armande Béjart) era filho do filósofo Gaston Berger. Estudou filosofia, mas abandonou os estudos para se dedicar à dança, descoberta quando tinha 14 anos por conselho do seu médico, ''''para fortificar seu corpo franzino''''. Seguiu-se uma formação clássica em Londres e Paris e ele assinou sua primeira coreografia em 1952. Em 1955, iniciou sua revolução ao montar Symphonie pour un Homme Seul (1955), com os pais da música concreta, Pierre Henry e Pierre Schaeffer. A música se tornava física, sensual, mas houve resistência da dança tradicional e Béjart achou melhor se auto-exilar em Bruxelas, onde montou com impacto sua Sagração da Primavera, no Théâtre Royal de la Monnaie (TRM). Um ano mais tarde, fundou a companhia Balés do Século 20 (Les Ballets du XXème Siècle). Suas coreografias, montadas em um ritmo rápido na capital belga antes de partirem em turnê pelo mundo, tornaram-se rapidamente sucesso. Entre as realizações, estão Bolero (1960), La IXème Symphonie de Beethoven (1964), Romeu e Julieta (1966), Missa pelos Tempos Presentes (1967) e Malraux (1986). J.C. Viola montou no Brasil, com grande sucesso, Nijinsky, o Palhaço de Deus (1971). Em outubro de 2003, ele rendeu homenagem a Fellini no balé Ciao Federico. Sua influência é imensa. Foi mestre e colaborador da alemã Pina Bausch e das brasileiras Laura Proença e Marcia Haydée. ''''Dança é a combinação de tempo com espaço: a música é o tempo e o movimento ocupa o espaço'''', disse ele. Foi apaixonado pelo bailarino Jorge Donn, que morreu de aids, e flertou sempre com as expressões populares - era grande admirador de Freddie Mercury, cantor do Queen. Béjart veio algumas vezes ao Brasil, a partir de 1963. ''''Você sabe que fiz um balé em 1957 para minha companhia, a então Ballet Théâtre de Paris, com música de Villa-Lobos?'''', disse ele ao Estado, em 1997. ''''Chamava-se L''''Étranger.'''' Mantinha uma tradição: doava a uma instituição que cuidava de pacientes com aids, em cada país que visitava, uma parte da sua renda pessoal nos espetáculos. Em Barroco Bel Canto, balé concebido especialmente para o Brasil, o coreógrafo usou figurinos criados por Gianni Versace e inspirados nas cores dos pássaros da Amazônia. ''''Esse é um balé para ser apresentado no Teatro de Manaus'''', sugeriu. Abriu seu balé em Lausanne, na Suíça, em 1987, e depois também abriu escolas em Dacar e Bruxelas. O imperador japonês Hiroito lhe deu a comenda da Ordem do Sol Levante (1986), o rei belga Balduíno o nomeou Grand Officier de la Couronne, e a Academia Francesa de Belas Artes o admitiu em 1994. ''''Estou sempre mudando, porque só se pára quando se morre. A evolução, a mudança, isso é o natural da vida. Mas não se pode esquecer que existe também uma constante de estabilidade, sem a qual as transformações não podem ocorrer. Sei que a palavra Béjart é uma marca hoje, mas na verdade não sei quem sou. Porque sou aquele jovem de 20 anos que era bailarino e também aquele outro jovem de 32 anos que fez A Sagração da Primavera e o coreógrafo de 70 anos com mais de 200 obras encenadas. Tudo o que sei é o que sou agora às 16h20 deste sábado, nesta tarde no Ritz. Em uma hora, tudo pode mudar'''', disse o coreógrafo ao Estado.

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