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Mestres e discípulos são reunidos em exposição que comemora os 200 anos da Missão Francesa

Debret e Taunay, que desembarcaram no Brasil em 1816, estão ao lado de Manuel Araújo Porto-Alegre e Francisco Pedro do Amaral na mostra da Pinakotheke Cultural no Rio

Foto do author Antonio Gonçalves Filho
Por Antonio Gonçalves Filho
Atualização:

Organizador da exposição A Missão Artística Francesa no Brasil e Seus Discípulos, que a Pinakotheke Cultural do Rio inaugura hoje, 22, em sua sede (R. São Clemente, 300), no Rio, Max Perlingeiro conseguiu reunir na mostra obras raras dos artistas que, em 1816, desembarcaram no Rio de Janeiro, vindos do porto de Havre para estabelecer aqui o primeiro núcleo de neoclássicos franceses no Brasil.

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Ainda que a existência de uma missão artística francesa, como registrada pelo historiador Afonso d’Escragnolle Taunay (1876-1958), tenha sido posteriormente contestada pelo crítico Mário Pedrosa (1901-1981), convicto de que nunca houve um convite formal da Corte portuguesa, certo é que um grupo de artistas e artífices sob liderança de Joachim Lebreton (1760-1819) de fato desembarcou aqui e foi bem recebido, apesar das diferenças ideológicas que separavam D. João VI desses pintores e arquitetos desapontados com os rumos que tomou a política francesa ou simples renegados políticos.

Entre eles estavam Debret (1768-1848) e o perseguido Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny (1776-1850), que desenhou muitos edifícios para o irmão de Bonaparte. Outros aderiram ao projeto de Lebreton, como o pintor Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830) e seu irmão escultor, Auguste-Marie Taunay (1768-1824), além de dois outros irmãos da família Ferrez, Marc (1788-1850), escultor, e Zépherin (1797-1851), também escultor e gravador.

A exposição da Pinakotheke Cultural, que vem acompanhada de um catálogo com textos assinados por Jacques Leenhardt e Maria Eduarda Marques, ocupa três salas do prédio carioca: na primeira estão as obras de Debret e Taunay; na segunda, as pranchas de Montigny e esculturas de Marc Ferrez, entre outras obras; na terceira sala, os curadores agruparam os discípulos dos artistas neoclássicos franceses, como o gaúcho Manuel Araújo Porto-Alegre (1806-1879) e o português Simplício Rodrigues de Sá (1785-1839).

O destaque da mostra fica com um pintor do século 17 que influenciou não só Debret, mas seu primo David, Nicolas Poussin (1594-1665), guia de todos os pintores neoclássicos franceses dos séculos 17 ao 19. Dele, Max Perlingeiro conseguiu o empréstimo do painel Himeneu Travestido Assistindo a uma Dança em Honra a Príapo, da coleção Masp, restaurado em 2009 e exibido pela primeira vez no Rio.

“Existe no Brasil essa única pintura de Poussin e não poderíamos deixar de mostrá-la ao lado das obras de Debret, 20 delas inéditas”, comemora Perlingeiro, que há um ano trabalha na organização da mostra, para a qual colaboraram diversas instituições além do Masp, entre elas o Instituto Ricardo Brennand de Recife, que emprestou o quadro Mercado de Escravos de Valongo, de Debret, reproduzida nesta página. Anteriormente atribuída a Nicolas-Antoine Taunay, sua autoria foi conferida ao primeiro com base numa litografia de Debret.

Nele, um casal europeu seleciona escravos no mercado como quem escolhe frutas na feira. Debret, o jacobino, pisca para o espectador, mas não é tão enfático como nas aquarelas em que denuncia os maus-tratos aos africanos no Brasil monárquico (há algumas delas na mostra). Compreensível: trata-se de um quadro encomendado pelo casal, interessado em ver registrada a cena. Em todo caso, a exposição, segundo Perlingeiro, não pretende recontar a história dos artistas emigrados ou examinar sua ideologia. O interesse da curadoria converge para a ressonância do programa neoclássico francês da era napoleônica em território brasileiro.

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"As presenças de Manuel Araújo Porto-Alegre e de Francisco Pedro do Amaral, ambos alunos de Debret, são provas dessa influência”, afirma Perlingeiro, destacando, no caso do último, os retratos que fez da marquesa de Santos, inclusive um, alegórico, que mostra a amante de D. Pedro I como uma índia nua com um papagaio na mão esquerda.

A exposição, infelizmente, não é itinerante. Quem for ao Rio, pode ainda ver outra mostra (Debret e a Missão Artística Francesa no Brasil – 200 Anos) com 70 das 700 aquarelas que Debret produziu no Brasil, entre 1816 e 1831, no Museu da Chácara do Céu (até dia 25).

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