Levin consegue tudo com elegância

Em apresentação memorável, Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro exibe exato senso de estilo em Campos do Jordão

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Por Lauro Machado Coelho
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Pela primeira vez, fora de Brasília, pôde-se ver a Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro que, desde o início do ano, tem Ira Levin como seu diretor artístico: ela se apresentou quinta-feira no Festival de Inverno de Campos do Jordão. E pôde-se constatar o salto de qualidade, em relação à fase anterior, registrado pela orquestra desde que o seu novo regente assumiu. Num programa iniciado com o classicismo austríaco, que chegou até o pós-romantismo nórdico e o nacionalismo brasileiro, evidenciou-se o exato senso de estilo com que Levin fez a orquestra abordar cada peça. Transparência de texturas, leveza de fraseado marcaram a Sinfonia Nº 82 em Dó Maior, a primeira da série parisiense de Joseph Haydn, chamada ''''o Urso'''' devido ao tom circense de seu dançante finale. O tom marcial do Vivace assai inicial, as duplas variações do Allegretto, a sutileza de orquestração do Minueto prepararam a explosão de sonoridades do Vivace em que, à elegância das cordas, respondeu a precisão das madeiras. Nesse movimento final, um dos mais surpreendentes dentro do vasto edifício sinfônico haydniano, Levin e a OSTNCS chegaram a um nível invejável de polimento na execução. Sem ser exatamente música da melhor qualidade, o Concerto em Mi Bemol de Johann Nepomuk Hummel, que começa com um corte mozartiano e se encerra com arroubos já pré-românticos, oferece ao solista possibilidades técnicas de que a jovem trompetista inglesa Alison Balsom soube tirar o mais brilhante partido. Seu legato perfeito fez cantar, no Andante, a elegíaca linha melódica de natureza vocal. Mas foi com os fogos de artifício do Rondó final que Balsom fez uma espetacular demonstração de virtuosismo. A sensual Dança de Negros com que se abriu a segunda parte constituiu uma homenagem ao centenário de Camargo Guarnieri. Mas viria, em seguida, o ponto culminante da apresentação: a Sinfonia Nº 4 de Carl Nielsen, verdadeiro hino à vontade de viver cuja estrutura, em movimentos encadeados, justifica o título de ''''Inextinguível''''. Aqui, Levin demonstrou como pôde extrair de sua orquestra as mais sutis gradações expressivas: os crescendos convulsivos e fortissimos incandescentes do Allegro, opostos a súbitos pianíssimos; o doce canto do oboé contra cordas em pizzicato, no Poco Allegretto; o diálogo dramático dos címbalos que, segundo a indicação de Nielsen, devem ser colocados em pontos extremos da orquestra. Nesta peça, em especial, pôde-se constatar a qualidade dos metais da OSNTCS, aos quais incumbem passagens de extrema complexidade. O lirismo intenso de Nimrod, a mais bela das Variações Enigma, de Elgar, foi, finalmente, um extra perfeito para colocar o ponto final num excelente concerto.

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