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Janela para o tempo

No novo filme de Carlos Sorín, homem decifra enigma da vida

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Foi o primeiro filme sério, de arte, que Carlos Sorín viu. Ele era um garoto cinemaníaco, mas via preferencialmente westerns, filmes de ação, de guerra. Um dia assistiu a Morangos Silvestres e a obra-prima de Ingmar Bergman lhe produziu uma perturbação muito grande. O filme permaneceu com ele. Depois, não foi sendo esquecido, mas meio colocado de lado. Há algum tempo, Sorín estava indeciso entre vários projetos. Havia tentado adquirir, sem êxito, os direitos de uma história de Raymond Carver - e ele cita o título em espanhol, Tres Rosas Amarillas, sobre os últimos dias de Chekhov. Um roteiro, entre os vários em que trabalhava, começou a tomar forma. Um velho doente, nos umbrais da morte, decifra o enigma da própria vida. "Era Bergman!", exclama Sorín, que terminou por optar por este filme e fez A Janela, que estreia amanhã na cidade. É maravilhoso, mas não espere uma adaptação de Bergman, talvez uma variação, como se fosse uma música. "A psicologia, o tempo, a densidade emocional, foi isso que Bergman me ensinou", disse ao repórter do Estado o diretor argentino, numa entrevista realizada segunda-feira, no final da tarde, num hotel da região da Av. Paulista. Carlos Sorín havia chegado pouco antes. À noite, prestigiou a pré-estreia de seu filme na Reserva Cultural e, no dia seguinte, já estava no Rio, para outra pré-estreia. Logo em seguida, regressou à Argentina, mas não por muito tempo. A estreia de A Janela o tem levado a correr mundo. Esteve recentemente na Europa, Espanha e França. Os EUA integram a rota. Na Argentina, as histórias mínimas que Sorín gosta de contar fazem dele um autor para pequenas plateias (e estimado pelos críticos). Na França, O Cachorro fez mais de 250 mil espectadores e A Janela vai ser lançado com 60 cópias. "É muito, para o tamanho do filme, mas o distribuidor está otimista", observa o diretor. O filme ?bergmaniano? de Sorín reflete outras influências, ou referências que fazem parte do seu imaginário. Jorge Luís Borges, Adolfo Bioy Casares e A Invenção de Morel. A Janela tem tanto de Morangos Silvestres quanto de A Invenção de Morel, mas você não precisa ter visto um nem lido o outro para se sensibilizar com a história do velho que está morrendo, nesta casa isolada em que um afinador de pianos prepara o instrumento para a chegada do filho do protagonista, um pianista famoso que ele não vê há tempos. Notas musicais esparsas quebram o silêncio. Um filme sobre o interdito, sobre o não dito. Tudo ou nada - amanhã. Hoje, se você quer ação, há uma matinê legal, Wolverine. Mas não se esqueça de Sorín. Você só tem a ganhar com a sua (dele) arte minimalista.

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