Girl Talk sampleia na velocidade da luz

Produtor americano faz uma farra pop com seu laptop implacável, misturando trechos de músicas em busca de algo novo

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Por Jotabê Medeiros
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Um laptop na mão e 1 milhão de samples na cabeça. Girl Talk representa a nova ordem libertária da música sem dono da era digital. Seu disco Night Ripper, de 2006, rapina trechos de músicas de 167 artistas, alguns deles mais de uma vez, repetidamente, o que dá uma média de citação, num único álbum, de 6.250 samples. Com um detalhe: Girl Talk não pediu autorização legal a ninguém para usar as músicas. Girl Talk é o codinome do garoto Gregg Gillis, da Pensilvânia, de 25 anos, uma das grandes atrações do próximo TIM Festival, nos dias 26 de outubro (na Marina da Glória, Rio de Janeiro) e 27 de outubro (The Week, São Paulo). Durante alguns anos, Gregg Gillis só fazia shows nos fins de semana. Durante a semana, ele era um aplicado engenheiro biomédico em Pittsburgh, onde vive. Abandonou o velho emprego. A pergunta é: quantos processos por infração de copyright ele levou até agora? ''''Não tive problemas legais'''', revelou Gregg Gillis, falando por telefone ao Estado, na tarde de terça-feira. Gregg conta que, quando optou por lançar um disco convencional feito de colagens, ele já se preparou para o pior - tinha até advogado e defesa preparada, baseada na idéia do ''''fair use'''', que justifica uma obra de arte feita de citações, desde que ela represente uma obra autônoma, independente. Você vai completar 26 anos bem no dia do seu show, aqui no Brasil. Quais os planos para celebrar? É verdade. Não tenho planos ainda, você pode me dar uma pista? Amigos meus dizem maravilhas do Brasil, falam que o Rio de Janeiro é espetacular. Acho que vai ser bem legal. Vi no YouTube seu set em Coachella 2007, e há uma multidão dançando no palco. Aquilo é muito doido. Sim, é uma festa pop. Mas é mais difícil fazer isso em festivais. Em pequenos clubes é mais fácil interagir e todo mundo dançar. É um show pop, o convite acontece naturalmente. Normalmente, nos clubes, eu convido todo o público a subir ao palco. Dependendo do tamanho do local do show aí no Brasil, convido todo mundo também. Quando você põe coisas como Nirvana e outras dos anos 90 em seu disco, qual é sua perspectiva? Gosto muito do hip-hop dos anos 80 e 90. Adoro Public Enemy. É um tipo de homenagem, é o elemento mais familiar. Mas me relaciono com todo tipo de música. Não sou muito fã do hip-hop atual. O álbum Night Ripper põe lado a lado 167 artistas diferentes. Desde que você o lançou, você recebeu alguma ação legal. Não, nenhum problema até agora. Acho que é uma coisa positiva, significa que a indústria musical está abraçando de vez a tecnologia e que consideram que meu CD não é uma coisa negativa para a indústria. Você diz que não é um DJ. Considera o que faz uma coisa nova? Eu me considero um produtor de samples básicos. Um tipo de artista de remixes. Eu sei que uso o material de outras pessoas, não é algo novo, não toco guitarra, mas invento guitarras a partir de acordes que não são novos, são tirados de outros, manipulados de diferentes fontes. Vê alguma similaridade entre você e o do britânico Aphex Twin. Sou um grande fã dele. Ele é muito influente no meu trabalho. Para mim, ele mostra que colocar as coisas juntas em música exige uma atitude criativa, uma habilidade tátil. Ter atenção ao detalhe, foi que aprendi ouvindo Aphex Twin. Ouvi dizer que você é um grande fã de basquete. O que acha do Anderson Varejão? Eu também jogo basquete há um tempo. Ele joga justamente para os Cleveland Cavaliers, que é o meu time do coração. Ele é muito bom, um dos mais energéticos jogadores que já vi em cena na Liga. LeBron James, que também joga nos Cavs, é meu jogador preferido. É verdade que você trabalha também como engenheiro biomédico? Sou biomédico, mas deixei o trabalho dois anos atrás. Agora sou músico tempo integral. Música sempre foi minha paixão. Eu gostava daquele trabalho, mas era penoso. Fiz as duas coisas durante um bom tempo, estou há dez anos fazendo música. Agora estou mais livre, posso ficar na noite até mais tarde. Você fez um CD físico, mas nós estamos numa época de grande mudança na indústria musical. O que você projeta para o futuro da música? Acho que o CD ainda estará por aí por algum tempo. Pessoas da minha idade ainda vão se divertir com o objeto, com a mídia física. Mas acho que a noção de álbum está também em xeque, as pessoas vão deixar de fazer álbuns e colocar canções individuais . Eu fico animado com as mudanças, acho que é a maior que já aconteceu desde o surgimento das obras de arte físicas, e acho que elas abrem uma grande perspectiva, mais aberta, mais disposta a aceitar todo tipo de produção.

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