Falar da morte, mas com o olhar voltado para a vida

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Por Crítica Luiz Zanin Oricchio
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Em meio à enxurrada dos candidatos ao Oscar, entra em cartaz, para contrapeso, um filme francês - As Testemunhas. E logo de André Téchiné, tido, para muitos, como um dos herdeiros presuntivos da nouvelle vague, movimento que está comemorando seus 50 anos de vida. De fato, Téchiné vem desenvolvendo obra coerente com filmes sensíveis como Rosas Selvagens, ou inovadoras como Os Ladrões. Em As Testemunhas, Téchiné elege por tema o aparecimento da aids em meados dos anos 80. O surgimento do vírus, e suas consequências letais, são vistos no interior de um grupo fechado de personagens. O jovem Manu (Johan Libéreau) chega a Paris para morar com a irmã (Julie Depardieu), aspirante a cantora lírica. Ele tem um flerte com o médico homossexual Adrien (Michel Blanc). Mas Manu se liga mesmo a um policial, Mehdi (Sami Bouajila), casado com a linda escritora Sarah (Emmanuelle Béart), com quem tem um filho. Desse imbróglio sexual e existencial emerge a personalidade forte de Manu, o adolescente cheio de vida e que enreda a todos com seu erotismo e alegria. A opção de Téchiné é fazer da voz off da escritora narração contínua da história a ser contada. Sarah é escritora e escritores têm a vocação do testemunho. É como se as palavras salvassem a vida que escapa entre os dedos e pudessem eternizar passagens efêmeras sobre a Terra. Esse é o lado bonito da coisa. Infelizmente, Téchiné faz também a opção por um cinema muito falado, com os personagens se empenhando o tempo todo em réplicas e tréplicas escandidas em francês rapidíssimo. Às vezes parece teatro. Pena, porque a movimentação da câmera é muito boa e Téchiné tem o sentido do ritmo, quando não se deixa embriagar pelo verbo. Além disso, o filme padece de certo didatismo em relação à aids, preocupação que faria sentido nos anos 80, mas parece um tanto deslocada nos dias de hoje. A dinâmica entre os personagens, no entanto, é interessante e salva até certo ponto o ritmo desse filme um tanto longo. Téchiné evita a pieguice e a autocomplacência, o que não é fácil ao se tratar esse tema. Mas, ao mesmo tempo em que pretende falar da morte fazendo uma ode à vida, fica devendo um pouco de emoção e envolvimento ao espectador.

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