Expresso do Oriente

Nas passarelas do Ibirapuera e com programação voltada para o centenário da imigração japonesa, começam hoje e vão até segunda os desfiles de primavera-verão da São Paulo Fashion Week

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Por Lilian Pacce e Mariana Abreu Sodré
Atualização:

Tomada pelo espírito oriental, começa hoje a São Paulo Fashion Week, com lançamentos para a primavera-verão 2008/09. Ontem, foi dada a largada com desfile especial da MintDesigns, da dupla japonesa Não Yagi e Hokuto Katsui. "São parte da nova geração do japonismo. Nao Yagi foi assistente do estilista Hussein Chalayan e Hokuto Katsui, de Alexander McQueen. Eles quebram paradigmas dando novas leituras aos clássicos", conta Paulo Rezende, coordenador de eventos do Senac São Paulo, responsável pela vinda da dupla participante do Tóquio Fashion Week ao Brasil. "Hoje, a marca é comparada ao que Kenzo foi nos anos 80", diz referindo-se ao criador de moda Kenzo Takada, o grande convidado desta SPFW (leia na pág. 18). O contraste entre Kenzo e a MintDesigns dá o tom de tradição e modernidade que promete permear o prédio da Bienal, sede do evento. Logo na entrada, uma instalação do artista plástico Felipe Tassara une também o Brasil e o Japão: a cerejeira nipônica e o ipê tupiniquim. "Há ainda uma torre que faz alusão aos luminosos do bairro de Kanji, em Tóquio", conta Daniella Thomas, co-autora do projeto ao lado de Tassara. Uma exposição de quimonos vindos do Bunka Fashion College e do Bunkyo Museu da Imigração e outras duas mostras com fotos de Cristiano Mascaro e André Passos, além de uma terceira com looks assinados por expoentes da moda japonesa como Issey Miyake, Junya Watanabe e Rei Kawakubo, completam o roteiro paralelo aos desfiles. Na passarela, o assunto só é sublinhado pela estilista nipo-brasileira Érika Ikezili, que toma espaço no pavilhão japonês do Parque do Ibirapuera. "Minha coleção é um mix étnico que mostra a moda cem anos depois da imigração", diz Érika, que pretende colocar a Miss Centenário, a bancária Karina Eiko Nakahara, em sua passarela. Esta edição da São Paulo Fashion Week também marca a volta de Gisele Bündchen às passarelas do evento. A top é exclusiva da Colcci, que migrou do Fashion Rio, como é chamada a semana de moda carioca. A mudança é parte de uma estratégia comercial voltada para São Paulo. "Queremos dar chance pra quem quer ver a marca e a Gisele, mas não pode ir ao Rio", afirma a estilista Jéssica Lengyel, que batiza a coleção de Cabaré Botânico. Com força no jeans, o desfile terá passarela tripla de madeira reflorestada. O fenômeno de modelos tão ou mais importantes quanto às marcas para as quais desfilam, tomou o hemisfério norte nos anos 90, quando Naomi Campbell, Claudia Schiffer, Kate Moss e até Carla Bruni formavam um dream team (time dos sonhos). Como bem observa o estilista Dudu Bertholini - que assina as marcas Neon e Cori ao lado de Rita Comparato -, a cena noventista se repete agora por aqui. "É nossa safra de supermodelos", afirma sobre Gisele, Raquel Zimmermann, Isabeli Fontana e companhia. "Elas são as grandes vitoriosas da moda nacional." Mas o highlight do desfile da Neon serão as peças da nova etiqueta Batom, de moda praia, que resgata as origens da marca e que aparecerão entre as da Neon e as da etiqueta Rubi, que segue uma linha mais sofisticada. "Mas as três etiquetas serão inspiradas em ?mulheres de ilha?, com estampas de indiazinhas nuas", conta Dudu. "Aliás, cada look será praticamente uma estampa." Ilha também é o tema da estreante Maria Garcia, a marca jovem da tradicional Huis Clos. Camila Cutolo, estilista da marca, foi a Coney Island, ilha do Estado de Nova York, buscar referências para seu primeiro desfile no SPFW. A Maria Garcia apresentará peças alusivas ao carnaval da ilha, a Marmade Parade, onde os foliões desfilam fantasiados de elementos do mar. Outras criações mais numerosas lembram as velas dos barcos e os anos 20, época em que a ilha foi inaugurada como o maior parque de diversões do mundo. "Era um lugar para ser feliz, mas hoje está deteriorado. Há relíquias como uma montanha russa de madeira e outras curiosidades que deram um toque lúdico à coleção, que se chama Coney Island - A Ilha da Democracia e traz moda para diferentes gostos", diz. Camila Cutolo, principal aposta de Paulo Borges nesta temporada, não foi ao fundo do mar para criar, mas passou por ali. Enquanto a Ellus diz mergulhar de cabeça na imensidão azul. "As formas gráficas dos corais e peixes são muito importantes no verão 2009, que traz muito azul e jeanswear em difentes lavagens", diz Adriana Bozon, diretora criativa da marca. "Vamos levar um aquário enorme para a passarela, onde os modelos ficarão imersos", revela, apostando na calça boca de sino como hit da estação. Valdemar Iódice não vai levar a água para a passarela, mas sua coleção se baseia na história de Atlântida, a cidade submersa. Já Simone Nunes que apostou no mix de grunge e nerd na edição passada, quer sombra e água fresca, com aquela sensação que só a beira-mar é capaz de trazer. Por isso, optou por uma coleção que mistura beachwear e outwear com tons cítricos e cor da pele e preto. O tema mar, que foi amplamente explorado no Fashion Rio, deve repetir o sucesso por aqui. Mas há estilistas que buscam outras fontes, como o jovem Pedro Lourenço, de 17 anos, que volta ao SPFW com desfile conceitual (que não será comercializado) com apenas 16 looks, todos em homenagem à obra do gênio Leonardo Da Vinci. "São looks marcantes e complexos, que remetem a cavaleiros medievais com bordados alucinantes", diz Pedro Lourenço. "Levei minhas bordadeiras à exposição da Pinacoteca para elas estudarem o trabalho feito nos quimonos antigos, e estudei muito as técnicas de Madeleine Vionnet. Um trabalho consistente tem muito estudo por trás", acredita. "As modelos andarão rápido numa analogia à minha geração que tem pressa e não consegue mais sair do ritmo acelerado em que entrou", diz Pedro. "O que os outros chamam de futuro, eu chamo de hoje. Faço parte desta geração." Já Glória Coelho, mãe de Pedro, constrói seu verão em cerimônias, tecnologia e personagens históricos, como Elizabeth I e Joana D?Arc. Enquanto Reinaldo Lourenço, pai de Pedro, garante que seu desfile será superfeminino e "frágil". O estilista David Azulay, da Blue Man, volta ao evento depois de algumas temporadas no Fashion Rio. "Estou no SPFW porque quero mexer com a energia da marca", filosofa David. "Acredito nas peças com recortes com forro cor da pele. Mas é bem básico porque faço biquíni para vender", diz. Quando saiu da SPFW, David levou uma rusga com Amir Slama, da Rosa Chá, que coincidentemente também está de volta, só que com a coleção masculina (a feminina é apresentada em Nova York). "A rusga é coisa do passado", garante David, que prefere pensar no tema Brasilidade Pop. Amir Slama quer manter um certo mistério com o seu "masculino" que, apesar de estar sempre presente na coleção, era pouco explorado em desfiles. "O mercado masculino cresceu e tem informação de moda, por isso decidi destacá-lo", conta Amir, que buscou inspiração em artistas contemporâneos brasileiros, como Vic Muniz e Gonçalo Ivo. Outra marca de moda praia, a Cia Marítima aposta na modelo internacional Karolina Kurkova para rechear seus biquínis que olham para os anos 70, década-referência da marca. O coletivo carioca Oestudio, outra marca que retorna ao SPFW, pesquisa as células do grupo - ou sua identidade - como tema. A trilha sonora será ao vivo usando como instrumento o videogame Nintendo Wii. A Uma, de Raquel Davidowicz, também promete inovar transformando tecidos de coleções passadas em outros inéditos por meio de colagens e intervenções, ressaltando o caráter ecológico da grife que é carbon free desde 2005. A estilista Fabia Bercsek também vai de colagens, texturas e experimentações numa coleção repleta de estampas e surrealismo. "Deu vontade de trazer o sonho de volta à moda", diz. Fause Haten, que vendeu sua marca ao grupo I?M na última temporada, faz experimentações reeditando clássicos. "Trabalhei muito o artesanal, que só é notado se observado de perto. Usei, por exemplo, dois mil lacinhos de cetim numa peça que lembra o tweed da Chanel", diz, deixando seu masculino de escanteio - segundo o mercado, reflexo de sua situação pós-venda, que é extremamente delicada. Estreantes no SPFW, os meninos da Reserva seguem a linha "reedição criativa" e exploram um dândi moderno cujo sobrenome é "da Silva", bem brasileiro. Para dar início ao turbilhão criativo e às propostas do verão 2009, Oskar Metsavaht, da Osklen, deixa a prancha de surfe de lado e vai para as montanhas tomar chuva. Ele abre o evento hoje com um verão chuvoso. "Conforto é a palavra-chave. Muitas peças foram desenvolvidas em moulage para aproveitar o caimento natural do tecido no corpo. Há algodão, linho, seda, chamois, plástico, tyvek e resinados, além de tecidos sustentáveis", diz. Então, que venha o verão! E que as chuvas sejam só mesmo as tropicais!

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