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Exposições históricas marcam a temporada

Mira Schendel e Hans Hartung estão entre as principais de 2014

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Por Antonio Gonçalves Filho
Atualização:

As retrospectivas marcaram um ano que já começou com um tributo à vanguarda com a abertura, em abril, na Pinacoteca do Estado, de uma exposição dedicada ao Zero, grupo criado em 1958 na Alemanha e que antecipou manifestações e tendências contemporâneas como o happening e a arte conceitual. A mesma Pinacoteca inaugurou em julho a melhor das mostras retrospectivas de 2014, vinda da Tate Modern, que reuniu parte expressiva da produção da artista suíça, naturalizada brasileira, Mira Schendel (1919-1988). Também de fora veio a retrospectiva do franco-alemão Hans Hartung (1904-1989), mestre da arte informal representado na mostra do Centro Cultural Banco do Brasil (de maio a julho) por 162 obras abstratas.

Quatro mestres brasileiros foram igualmente homenageados com retrospectivas históricas. Em março, a Galeria Almeida & Dale abriu uma mostra de raras pinturas de Alfredo Volpi (1896-1988) com 80 telas de diferentes fases, cobrindo todos os períodos de produção do nosso maior mestre moderno. A curadoria revisitou das primeiras pinturas dos anos 1920 até as últimas, passando pela transição do figurativo para a abstração geométrica nos anos 1950.

Coerência. Exposição de Mira Schendel revelou relação entre tela de 1964 e os 'sarrafos' da última fase Foto: DIVULGAÇÃO

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Nome tão importante como Volpi, o gravador expressionista Oswaldo Goeldi (1895-1961) também ganhou, em julho, na Galeria Millan, uma mostra de aquarelas e desenhos raramente expostos, além de uma série de xilogravuras que dialogam com o melhor produzido pelos expressionistas alemães dos anos 1930, interlocutores íntimos de Goeldi.

Duas outras mostras retrospectivas completam o quadro das melhores exposições dedicadas aos históricos do construtivismo geométrico: o Instituto de Arte Contemporânea (IAC) abriu em setembro a de Lothar Charoux (1912-1987), que participou da fundação do grupo Ruptura, em 1952, embrião do movimento concreto. A Galeria Berenice Arvani inaugurou no começo de dezembro a de Arnaldo Ferrari (1906-1974), que teve uma experiência similar à de Volpi, começando como pintor dos arrabaldes e terminando por geometrizar fachadas e casarios, como o construtivista uruguaio Torres-García.

O ano também foi marcado por exposições de grande porte produzidas por museus e institutos culturais. A Pinacoteca abriu em novembro a exposição do contemporâneo Ron Mueck, australiano que produz esculturas gulliverianas com até 3 metros de altura em resina, fibra de vidro, acrílico e silicone, buscando uma correspondência anatômica fiel com seus modelos. Mueck impressiona pelo realismo, mas é fogo de artifício, artista para as massas, como a japonesa Yayoi Kusama, obcecada por bolinhas, que fez sucesso no auge da arte pop e foi resgatada numa retrospectiva do Instituto Tomie Ohtake, que também promove a mostra dedicada ao surrealista Salvador Dalí, em cartaz até 11 de janeiro. Menos concorrida, a mostra Tauromaquia, no Museu de Arte Brasileira da Faap, trouxe obras mais expressivas de artistas espanhóis – Goya, Picasso e também Dalí – que mostram como os dois últimos têm uma dívida enorme com o mestre.

Ainda entre as retrospectivas, o centenário do pintor gaúcho Iberê Camargo (1914-1994) foi lembrado em mostras na fundação que leva o seu nome e no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). A de Porto Alegre tentou um inútil diálogo entre o solitário Iberê e contemporâneos. A do CCBB, em São Paulo, melhor, foi dedicada a uma revisão de seu trabalho desde 1940. Finalizando o capítulo revisionista, a da coleção Fadel no Museu de Arte Moderna de São Paulo, com 216 obras do colecionador carioca, foi superlativa.

Entre as exposições individuais de artistas brasileiros destacaram-se as do pintor Cássio Michalany na Galeria Raquel Arnaud, a de Cildo Meireles na Galeria Luisa Strina e a de Rodrigo Andrade na Galeria Millan. De fora vieram exposições de Julian Schnabel (no Masp e na Galeria Raquel Arnaud), Francis Bacon (Paço das Artes) e Damien Hirst (White Cube).

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DESTAQUES

Mira Schendel - Mostra da Pinacoteca cobriu todos os períodos da produção da artista e traçou uma correspondência entre as primeiras e as últimas obras da artista

Coleção Fadel - O melhor da arte construtiva do Brasil num acervo de 216 obras, de Mary Vieira ao talento vivo de Judith Lauand, com 93 anos

Retrospectiva Volpi - Obras raras que mostram a evolução do maior pintor moderno do País, de 1920 a 1988

Cássio Michalany - A melhor exposição de um pintor radical, avesso a concessões

Iberê Camargo - A face trágica do expressionista gaúcho no País do tropicalismo

Lygia Clark em Nova York se destaca em ano de Bienal fraca

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Mostra da artista no MoMA foi um marco para o Brasil em meio a uma onda de mudanças nos principais museus do País

por Camila Molina

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Com a desmontagem da exposição do pintor e cineasta Julian Schnabel, encerrada dia 7, a retirada dos painéis de madeira que encobriam as janelas de vidro do subsolo do Masp faz reaparecer os detalhes da arquitetura do prédio projetado por Lina Bo Bardi (1914-1992). Ações de “redescoberta” do edifício, assim como a inauguração recente da mostra Masp em Processo, que coloca lado a lado obras emblemáticas e peças menos conhecidas do acervo da instituição, marcam a passagem do museu para uma nova fase, o fato mais importante em 2014.

Desde 1994, o Masp vivia sob mesma governança. Com a eleição, em setembro, de conselheiros e diretoria, que tem como presidente Heitor Martins, foi iniciada uma nova gestão profissionalizante com o desafio de sanar as dívidas do museu (anunciadas em torno de R$ 12 milhões). Em meados de dezembro, o diretor artístico da instituição, Adriano Pedrosa, apresentou os membros de sua equipe curatorial, formada, entre outros, pela venezuelana Julieta González e a artista brasileira Rosângela Rennó. É grande a expectativa em torno dos rumos do museu, que, apenas para relembrar, já teve sua luz cortada em 2006 por falta de pagamento.

O mesmo sentimento se estende a outras instituições de peso de São Paulo, que tiveram o ano marcado por mudanças de gestão. Em outubro, a Pinacoteca do Estado confirmou a saída de Ivo Mesquita de seu cargo de diretor técnico para dar lugar, em fevereiro de 2015, ao historiador e curador Tadeu Chiarelli. O Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP também está sob nova direção desde abril, quando o professor Hugo Segawa foi eleito para o lugar ocupado por Chiarelli.

Se, de um lado, instituições estabelecidas vêm tomando novos ares como os descritos acima, é interessante também destacar iniciativas apresentadas em espaços de experimentação, principalmente, no centro da cidade. Projeto Gameleira 1971, que a artista Lais Myrrha exibiu entre junho e agosto no Pivô, no edifício Copan, foi uma das mais bem-sucedidas mostras do calendário por tão bem aliar construção formal e reflexão sobre a memória, usando como mote o desabamento, na década de 1970, do Pavilhão de Exposições de Belo Horizonte, obra creditada a Oscar Niemeyer. Outra construção ousada e potente de 2014 foi a monumental Transarquitetônica, de Henrique Oliveira, concebida especialmente para o anexo do MAC-USP. Em termos de exposições, ainda, no de uma 31.ª Bienal de São Paulo controversa e de pouca expressão, é importante mencionar a realização de alentadas mostras sobre a obra de importantes criadoras, de gerações diferentes. Não por uma questão de gênero, mas de pertinência, algumas mulheres se destacaram em 2014. O Abandono da Arte, a retrospectiva de Lygia Clark (1920- 1988) no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York, entre maio e agosto, foi um marco internacional em torno da produção da brasileira. A exposição cobriu toda a carreira da criadora, desde suas pinturas concretistas até suas investigações no campo terapêutico.

Devem ser ainda destacadas as mostras de Mira Schendel (1919-1988) na Pinacoteca do Estado – depois de exibida na Tate de Londres; a exposição panorâmicas de Rivane Neuenschwander no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo; de Mona Hatoum na Estação Pinacoteca (ainda em cartaz); e de Yayoi Kusama no Instituto Tomie Ohtake.

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Não é possível deixar de lembrar ainda que este foi o ano do centenário da arquiteta Lina Bo Bardi. Nome de interesse crescente em diversos países, a ítalo-brasileira, autora do Sesc Pompeia, teve como uma das mais elogiadas homenagens a exposição Maneiras de Expor – Arquitetura Expositiva de Lina Bo Bardi, no Museu da Casa Brasileira. A volta de seus cavaletes de vidro ao Masp, criados por ela na década de 1960 para a exposição da coleção do museu, já é uma das aguardadas promessas do novo diretor artístico, Adriano Pedrosa, para o segundo semestre de 2015 na própria instituição.

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