Entreclássicos propõe novo olhar sobre a crítica

Evolução do enredo e psicologia dos personagens são eixos de novas edições

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Por Francisco Quinteiro Pires
Atualização:

A Entreclássicos (Duetto) volta a circular na sétima edição, dedicada a Fiodor Dostoievski, com um projeto editorial novo. A estrutura da revista, repetida na 8ª edição, dedicada a Franz Kafka, divide-se em quatro seções: vida e obra, grandes romances, obras da juventude e fortuna crítica. Segundo os editores Rodrigo Lacerda e Ana Lima Cecilio, nos seis primeiros números da publicação predominou a visão crítica. Ao convidarem escritores para escrever sobre as obras do russo e do checo, os editores acreditam reproduzir com mais vivacidade a evolução do enredo e a psicologia das personagens. As próximas edições trazem material sobre Jorge Luis Borges, Marcel Proust e Fernando Pessoa. O elenco que escreve sobre Dostoievski é composto por Carlos Eduardo Ortolán, Aurora Fornoni Bernardini, Manuel da Costa Pinto, Ronaldo Correia de Brito, Ricardo Lísias, Francisco Lopes, Joca Reiners Terron, Iuri Pereira, Beatriz Antunes, Leandro Rodrigues e Andréa del Fuego. Para falar sobre Kafka foram chamados Ronaldo Bressane, Beatriz Bracher, Joca Reiners Terron, Ricardo Lísias, Wilson Bueno, Ronaldo Correia de Brito, Ivana Arruda Leite, Bruno Simões, Modesto Carone e Márcio Seligmann-Silva. Na edição dedicada a Dostoievski, surge o homem que sofreu para escrever. A dor possibilitou ao autor de Crime e Castigo mostrar literariamente a feiura de que o mundo é feito. Ele cumpriu à risca o conselho dado a um jovem escritor: "Para escrever bem é preciso sofrer, sofrer." Sua sensibilidade parece ter sido moldada pela brutalidade que o atingiu. Os sobressaltos na sua vida são notados na tormentosa narrativa que revela os estados de espírito dos personagens. Pode-se dizer que, de modo consciente ou não, Dostoievski usou a ficção para tatear um esboço da alma do homem. Uma de suas frases explica por que é necessário tentar esse esboço: "A maior felicidade é quando a pessoa sabe por que é infeliz." Ele revolveu o subsolo da psicologia humana. À beira da morte, pediu à esposa a Bíblia. Essa atitude revela a crença que nunca abandonou Dostoievski - a irmandade entre os homens. Fraternidade que parece ter se tornado uma realidade remotíssima diante das atrocidades do século passado, antecipadas pelas obras de Kafka, autor que buscou a redenção, apesar de viver mergulhado em conflitos insolúveis com o pai, a pátria, a língua e a literatura. Massacrado por dúvidas, ele afirmou que "tudo que não é literatura me aborrece". O trabalho na burocracia despertou nele metáforas sobre o funcionamento de organismos sociais. O que espantava Kafka não era a divisão maniqueísta entre opressores e oprimidos. Causava-lhe horror perceber a apatia dos que se deixavam dominar e o ânimo dos que agiam para dominar.

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