PUBLICIDADE

Ensaio de teatro

Estado acompanhou preparação da montagem de A Moratória, homenagem do Grupo Tapa à ensaísta Gilda de Mello e Souza

Por Beth Néspoli
Atualização:

No bairro do Brás, a rua Domingos de Paiva tornou-se ainda mais estreita ao ganhar numa das margens o muro alto da estação do metrô. Quem passa indiferente diante da fachada pichada de um antigo armazém não pode imaginar o que veria se atravessasse o portão velho. É como passar por um portal do tempo para entrar na sala de um casarão de fazenda do início do século passado onde um terrível e comovente drama se desenrola. Não um acanhado drama familiar, mas a tragédia histórica de toda uma classe social. Ali, naquele galpão que o Grupo Tapa transformou em sede de trabalho, sob direção de Eduardo Tolentino, se realiza um ensaio da peça A Moratória, de Jorge Andrade, que estréia em Araraquara na sexta-feira. Na reduzida platéia de amigos estão o crítico literário Antonio Cândido e a ensaísta Iná Camargo Costa. Após a apresentação, o crítico observa o acerto na medida do tom de prepotência que o ator Zecarlos Machado imprime ao fazendeiro Quim e também elogia o vigor na interpretação do ator Augusto Zacche para o jovem Marcelo. No diálogo que se segue, um círculo se forma naturalmente em torno de Antonio Cândido que faz rir e delicia a platéia com histórias saborosas envolvendo personagens da oligarquia rural como os retratados por seu amigo Jorge Andrade em sua obra. Ainda sob efeito da comoção provocada pelo espetáculo, aquela cena, que lembrava antigas ''''contações'''' de casos em torno de um fogão de lenha, tendo o maior crítico literário do País como bem-humorado narrador, no fundo de um galpão do Brás, em plena metrópole paulistana na hora do rush, provoca o sentimento de presenciar um pequeno milagre. Pois é dessa mesma ordem a origem dessa apresentação de A Moratória. Ela integra um evento surpreendente e admirável pela sua importância: Gilda, a Paixão pela Forma, que começou em agosto e só termina no dia 30 de setembro, no Sesc Araraquara, em homenagem à ensaísta Gilda de Mello e Souza (1919-2005). São palestras, peças, filmes, exposições, tudo para celebrar e, sobretudo, conhecer a obra não de uma ''''estrela famosa'''', mas de uma intelectual sensível que deixou obra ensaística relevante. Debater com um público amplo conceitos de estética e métodos de análise crítica de obras de arte era a idéia inicial. E a escolha de Gilda vai além da ligação com Araraquara, onde passou a infância. ''''Ela se desdobrou nas mais diversas áreas do fazer artístico'''', define Antônio Carlos Martinelli Jr, animador cultural do Sesc Araraquara. Em Teatro ao Sul, considerado obra-prima ensaística, ela disseca A Moratória. Daí a realização dessa nova montagem.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.