Em busca do essencial nas histórias

A atriz Juliana Carneiro da Cunha fala sobre processo de criação da peça

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Terça-feira, 4 de setembro, estréia de Les Éphémères em Buenos Aires. Juliana Carneiro da Cunha fala ao Estado por telefone e pode-se ouvir as vozes das atrizes, marteladas, objetos metálicos que se batem. "Estamos fazendo maquiagem, últimos preparativos", diz. Foi divulgado que a trupe viria com 61 pessoas. "Eu também li esse número em algum lugar, mas hoje me dei conta de que somos 75." Na conversa que se segue, a atriz fala sobre esse espetáculo cujo texto não é assinado por Hélène Cixous, a dramaturga do Théâtre du Soleil, mas pelos atores. Outra novidade é a opção pela linguagem dramática, surpreendente nesse grupo que sempre valorizou a narrativa épica. "Quando começamos a preparar esse espetáculo, Ariane nos fez a seguinte proposta para improvisação: imagine que em dois meses a Terra vai ser destruída por um asteróide e nada ou ninguém vai sobrar, a humanidade acaba. O que você faria nesse tempo?" Juliana conta que foram bem diversas as cenas criadas, desde a aproximação com a família até os que iriam esconder no fundo da terra livros de ciência e literatura para que no futuro pudessem ?contar? do mundo que existiu. "Talvez por isso Ariane tenha falado em bondade. A consciência do efêmero faz esquecer brigas vãs. Vieram à tona seres que exerciam a compaixão, a alegria, os lados positivos da vida." Mas depois de um tempo chegou-se à conclusão de que o tema era cinematográfico demais. "Nas improvisações a gente se deu conta disso. A idéia inicial mudou, mas ficou a busca do essencial." A atriz admite que há mesmo diferença temática e de linguagem com relação aos espetáculos anteriores. "Sempre tratamos da História, com H maiúsculo. Também pelo fato de criarmos a partir de improvisações e de termos um músico, o Jean-Jacques Lemêtre, compondo com a gente desde o primeiro segundo de ensaio, a forma épica é decorrência quase natural. Mas desta vez a linguagem não é narrativa, é dramática. Do jeito que contamos as histórias nem ?atuamos?, é experiência vivida mesmo." Ainda assim ela reforça a idéia já expressa pela diretora Ariane Mnouchkine em entrevista em São Paulo, de que o épico está presente nessa linguagem dramática. "Acho que a gente sente como épico pela profundidade com que as pessoas atuam, o que faz saltar para o universal. Eu mesma ainda me pergunto por que as pessoas gostam tanto de uma criação tão simples..." Ela aproveita para dizer que tudo é visto muito de pertinho. "O espectador pode ver os mínimos detalhes." E eles são muitos, dos objetos de cena ao sentimentos. São várias histórias que se entrelaçam ou não, contadas num único fôlego ou fragmentadas. Os próprios atores empurram pequenos tablados, palcos móveis, que trazem sobre eles a cenografia e os atores. Juliana conta que criou vários personagens ao longo das improvisações, mas nenhum deles está em cena. "Ariane dizia que deixava eu ir até o fim porque eram terapêuticos para mim, brotavam de vivências pessoais, mas não serviam." Mas a atriz pode ser vista em muitos papéis. "Eu havia passado três anos fora do Soleil, no Brasil, pela necessidade de atuar em português. Então voltei muito disponível. Cada ator que precisava de uma mãe na improvisação - entrei no Soleil em 1990 e sou mais velha - era a mim que chamava." Todos, segundo quem já viu o espetáculo, parecem ter brotado de dentro dela. "Eu não sei disso, mas tem uma médica, em especial, chamada Neli que, os outros dizem, se parece muito comigo."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.