É tudo verdade nesses sobreviventes

O limite tem volta, ensina belo filme de Miriam Chnaiderman hoje, na Cultura

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Basta olhar para a filmografia da psicanalista e cineasta Miriam Chnaiderman. Artesãos da Morte, De Arma na Mão. Miriam gosta de refletir sobre a cultura da violência. Seu novo documentário passa hoje, às 22h10, na TV Cultura. Foi realizado em parceria com Reynaldo Pinheiro. Chama-se Sobreviventes e conta histórias de pessoas que viveram situações-limite, das quais retornaram para contar como foi. Morte, tortura, acidentes de carro, doença, discriminação. Um professor chora lembrando-se da humilhação que sofreu, ou sentiu, na escola por ser negro, como se a cor da pele fosse uma condenação e ele nunca pudesse ter espaço para revelar suas habilidades. Uma mãe que não se conformava com a morte dos filhos num deslizamento aprendeu a nomear a dor e a conviver com ela, desfrutando o que ganhou depois. Um soropositivo, o crítico, escritor e cineasta Jean-Claude Bernardet, reflete sobre a doença nos olhos que está reduzindo sua capacidade de visão. São histórias de vida. Humanas, comoventes - e é tudo verdade. Os planos, em geral, são simples - os mesmos. Uma cadeira, uma parede de tijolos. As pessoas sentadas dão seus depoimentos. Existem pequenas variações na distância da câmera. Poucos recursos para colocar algo mais do que isso na tela. Trens que passam (o tempo?), planos da parede (o limite?) O rosto humano é um território inesgotável. A voz ora é destituída de expressão ou então tem tanta expressividade que você pode fechar os olhos e viajar nas palavras. Os depoimentos que abrem e fecham o filme são de ex-criminosos. Um sobrevivente do Carandiru que se reconstruiu e só espera que os filhos não sigam seu caminho. Outro ?bandido? que foi salvo pela literatura e cuja maior emoção foi ver o filho dizer que tem o maior orgulho do paizão escritor e quer ser como ele. A psicanálise ensina que só se supera um trauma dando-lhe um (res)significado. O documentário de Miriam e Pinheiro é sobre isso. Experiências de vida, de linguagem. Vale a pena viajar nessas histórias.

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