De carro, no sul da Bahia, até errar o caminho vale a pena

PUBLICIDADE

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Uma viagem de carro para o sul da Bahia, já pensou? De uma tacada só conhecer Ilhéus, Canavieiras e Itacaré, na Costa do Cacau, Trancoso e Caraíva - no meio do caminho - e, se quiser ir ainda mais fundo, Abrolhos, Morro de São Paulo e Maraú. Dê só uma olhada no mapa. Fica tudo mais ou menos perto, na beira do mar, do rio e da mata. Chegar a cada um desses lugares é uma aventura. Mas nada que um 4X4 e alguma determinação não resolvam. Só a paisagem - mata atlântica verdinha pontilhada de tons de vermelho, amarelo e laranja, coqueirais, um mar que não tem tamanho - já vale a pena. O único problema é que dá vontade de entrar em cada seta da estrada para descobrir um lugar novo. Se der na telha, entre, dê uma volta, um mergulho, faça o seu caminho. Quando sentir que aquele é o lugar, fique, ora. Se não, siga em frente. Então, vamos lá. De Salvador, pode-se ir a Morro de São Paulo direto de catamarã, em duas horas. É uma possibilidade. Isso fazem os turistas. Viajantes atravessam a Baía de Todos os Santos de ferry-boat, pegam uma estrada sinuosa, de vegetação exuberante, lindíssima, em direção a Valença. Gastam o dobro do tempo, mas curtem infinitamente mais. Passam por Nazaré das Farinhas e Santo Antonio de Jesus, duas graças. Passam em povoados com fileiras de casinhas e gente na porta - gente humilde que até dá vontade de chorar - jardins, campinhos de futebol, cachorros, galinhas... Viajantes vêem tanta coisa! Em Valença, deixam o carro em um estacionamento perto do porto e pegam um barco para Morro. A hora que chegar está chegado porque há sempre um barqueiro disposto a fazer a travessia. De dia é mais bonito, claro, mas à noite também tem seu encanto. Vento e água salgada no rosto, o barco pulando em ondas imensas à medida que se aproxima da ilha. Pura emoção. Chegada inesquecível. Leve só o que puder carregar porque no Morro só se anda a pé e entre o cais e a vilinha tem um ladeirão. Pronto, chegou, achou a pousada, jantou. Se ainda tiver pique, a balada fica na Segunda Praia. No dia seguinte, oh dúvida cruel: Primeira, Segunda, Terceira, Quarta ou Quinta Praia? Vá até onde suas pernas o levarem lembrando sempre que tem de voltar. No caminho, muitas poças, muitos peixes e um sol! No fim da tarde, uma romaria inicia a subida para as Ruínas da Fortaleza, presídio construído em 1630, onde fica o Farol do Morro, que data de 1835. No ponto mais alto, todos se posicionam para esperar o grande acontecimento de todos os dias: o pôr-do-sol. De lá,com sorte, também se pode assistir ao show dos golfinhos. Se quiser saber como era o Morro de São Paulo antes da grande invasão dos turistas - principalmente estrangeiros - vá à Ilha de Boipeba, logo ali. É outro mundo. Considerada Área de Proteção Ambiental, a ilha conserva ares rústicos de colônia de pescadores. São 20 quilômetros de praias cercadas por recifes e coqueiros, com águas calmas, piscinas naturais e rica vida marinha. Esse recanto escondido do litoral baiano tem poucas pousadas e poucos turistas. Em um passeio de barco se percorre toda a ilha. Com as próprias pernas pode-se chegar a Garapuá (o percurso leva cerca de duas horas e meia), encantadora vila de pescadores com piscinas naturais formada pelos recifes de corais. Os barcos param ali somente para as pessoas darem um mergulhinho entre peixes nas suas águas tépidas. Se preferir, concentre-se nas cidades da Costa do Cacau, todas com praias emolduradas por mata atlântica, rios e cachoeiras. São quase 200 quilômetros de mar azul e mata preservada. Em Ilhéus, conheça o cenário dos livros de Jorge Amado e personagens que parecem saídos das páginas de Gabriela, Cravo e Canela e Terras do Sem Fim. Da época dos barões do cacau, pouco se mantém conservado. Mas os famosos Bar Vesúvio e o cabaré Bataclan ainda estão lá. As praias mais distantes são as melhores. No caminho, pela janela do carro, encha os olhos com as plantações de coco e dendê. E, se quiser conhecer uma fazenda de cacau, a história e o processo de seleção e beneficiamento do fruto, vá até Itabuna, a apenas 32 quilômetros. Em Canavieiras, caminhe pelo centro histórico e observe o casario erguido na próspera época da cana-de-açúcar, entre o fim do século 19 e o começo do século 20. Vale passear por aquelas ruas velhas e tomar uma cerveja na orla. Não perca o passeio de barco pelo Rio Pardo, por áreas de manguezais, com direito a revoada de garças, no fim da tarde. E, na maré baixa, o banho de lama negra que, dizem, tem efeitos medicinais. Antiga vila de pescadores, nos anos 1980 Itacaré foi descoberta pelos surfistas, que fizeram da vila a sua praia. O motivo: a geografia do lugar, com praias pequenas e ondas enormes. Chama gente, chama gente e virou um balneário com 150 pousadas, para todos os gostos e bolsos. Pico dos esportes radicais e altos agitos, é a queridinha dos forasteiros. "Caraíva é sossegada demais. Itacaré, não. Vem gente do mundo todo", conta a publicitária Luciana Trindade, de 37 anos, que há 7 trocou São Paulo pelo sul da Bahia. "Quando vou lá fico chocada: trânsito, poluição, pessoas de cara feia", diz. "Não me adapto mais." A estrada para Maraú é ruim de doer, ainda mais com chuva. Por isso, muitos preferem chegar à península pelo Rio Acaraí, em lanchas e barcos que saem do porto de Camamu. Uma vez lá, compensa cada segundo. Não deixe de ir a Algodões, praia larga de perder de vista, de água transparente e corais, onde à noite, com um facho, pode-se até apanhar lagostas com as mãos, na maior covardia, "cegando" as coitadinhas. Em Nova Viçosa pode-se contratar um barco para ir ao Parque Nacional dos Abrolhos. Só se pode desembarcar na Ilha de Siriba com monitores do Ibama. E, ali, chegar junto de aves marinhas como o atolá branco. De julho a novembro, consegue-se avistar baleias. Mas em qualquer época, só de nadar entre corais, peixes e tartarugas já se fica de alma lavada. ILHÉUS E JORGE AMADO Infância - A enchente do Rio Cachoeira destruiu a fazenda de Itabuna, onde o menino Jorge Amado morava com a família. Com 1 ano, ele se mudou para Ilhéus, onde passou toda a infância. Museu - A gratidão de Ilhéus por Jorge Amado pode ser conferida em um museu sobre o autor, no palacete construído por seu pai e onde ele escreveu sua primeira obra, "O País do Carnaval", em 1931. Rua - Leva seu nome a rua onde fica o museu e onde Jorge Amado morou quando criança. Ah, e adivinhem como foi batizado o aeroporto de Ilhéus? Cenário - Um bar da cidade, o Vesúvio, na Praça Dom Eduardo, serviu de cenário para a novela "Gabriela, Cravo e Canela" (1975), da Rede Globo. Lá, uma estátua de Jorge Amado já deve ter se cansado de tanta fotografia. Uma dica: o local serve comida árabe e tem a fama de preparar o melhor quibe do Nordeste. Cabaré - Restaurado na década de 90, o antigo Cabaré Bataclan ficou famoso ao ser citado no livro "Gabriela, Cravo e Canela". Hoje, funciona como espaço cultural, com memorial e o quarto de Maria Machadão (interpretada por Eloísa Mafalda na tevê).

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.