PUBLICIDADE

Cine PE homenageia Recife e a nova família

Inusitada relação pai e filho e um tributo à cidade pernambucana abrem a mostra

Por Luiz Carlos Merten e Recife
Atualização:

Na cena mais impactante de Simples Mortais, de Mauro Giuntini, primeiro longa da mostra competitiva do Cine PE, na segunda-feira, pai e filho fumam um baseado juntos e finalmente conseguem se comunicar. A família tradicional está em fase de mudança e o Festival de Audiovisual do Recife documenta a mudança. No curta documentário Amanda e Monick, de André da Costa Pinto, primeiro programa da noite, um travesti que se prostitui numa cidadezinha de 6 mil habitantes no Cariri paraibano tem um filho com uma lésbica e anuncia que ele vai ser a mãe do bebê e ela, o pai. Se necessário, anuncia, vai continuar se prostituindo para garantir a sobrevivência da criança. Houve discurso e show na noite de abertura - Sagração das Etnias, um espetáculo longo, mas bonito, que homenageia folguedos pernambucanos. As projeções de filmes, curtos e longos, estenderam-se até o início da madrugada. Houve pouca coisa realmente boa. A animação Pajerama, de Leonardo Cavadal, trata de um indiozinho perdido entre dois mundos (uma floresta que vira cidade vertiginosa, e vice-versa). O documentário longo Guia Prático, Histórico e Sentimental, de Leo Falcão, baseia-se no guia pioneiro que Gilberto Freyre lançou em 1934. Falcão revisita, por meio de imagens e depoimentos, a cidade celebrada por Freyre. Foi o programa mais aplaudido da noite e era covardia - afinal, os recifenses celebraram com ovação prolongada a cidade que é a deles. O curta de André da Costa Pinto é almodovariano, menos pela forma do que pelos personagens. Aqueles dois travestis - um que se prostitui, o outro que leciona numa escola de 1º grau - parecem invenções de Pedro Almodóvar. O problema é que o diretor fez um filme ''quadrado'' e reiterativo, talvez porque tenha partido do pressuposto de que, com aquela dupla, transgredir em termos de linguagem fosse excessivo. Outro curta, Engano, de Cavi Borges, mostrou um rapaz que erra o número ao fazer ligação no celular. Entra esta garota, com quem ele conversa. A situação evolui, eles resolvem se conhecer, mas, na hora H do encontro, os celulares saem de área. A tecnologia, mais até do que o preconceito - como o enfrentado pelos travestis Amanda e Monick -, está separando as pessoas, adverte Cavi Borges. Simples Mortais reúne as histórias de várias pessoas cujos destinos se cruzam no final, num elevador, sem que o espectador saiba muito bem para onde estão indo. Entre eles, há uma apresentadora de TV que, à força de tanto querer um filho, inferniza a vida do companheiro; um professor de poesia casado que se envolve com aluna sexy; e a dupla formada por pai e filho. O filme é produzido pelo brasiliense Márcio Cury, o mesmo de Romance do Vaqueiro Voador, em cartaz em São Paulo (corra para ver). Pai e filho formam a dupla mais interessante. Cinéfilos de carteirinha devem se lembrar do encontro geracional filmado por Coppola em O Selvagem da Motocicleta - a geração do álcool encontrando a das drogas. Mauro Giuntini fez a versão nacional, sem que seja necessário esclarecer se foi influenciado, ou não, por Coppola. A platéia adorou a cena, muito aplaudida.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.