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Centenas de versões, de milhares de páginas

Por Patricia Villalba
Atualização:

Aprendiz de Homero foi um bom pretexto para a reportagem do Estado visitar os preciosos arquivos da escritora Nélida Piñon, que ela mantém com capricho num apartamento do mesmo prédio onde mora, no Rio. Apaixonada pelo processo criativo tanto quanto pela literatura em si, Nélida não é escritora de cortar, mas de aumentar. E não se rendeu completamente ao computador - "Imprimo tudo, só confio na revisão feita no papel", explica ela, na frente das 700 pastas com as várias versões de A República dos Sonhos (1984). Setecentas versões, de um livro de mais de 700 páginas. Faça a soma, e você terá dimensão do que é o arquivo. "Para mim não tem essa de arquivo de computador. Tudo eu imprimo, sou filha de Gutenberg", anuncia, com certa dramaticidade. Em certo momento da visita guiada, Nélida tira uma das pastas de A República dos Sonhos da prateleira. Depois de tanto tempo sem rever os originais, ela mesma fica surpresa - muitas páginas manuscritas, outras tantas datilografas na "maquininha" que foi companheira por tanto tempo. "Eulália começou a morrer na terça-feira", lê a primeira frase do livro. "Quando descobri essa frase, me dei conta do que seria A República dos Sonhos." Há ainda livros, fotografias, homenagens de universidades do mundo todo, relatos de viagens, cartas e até mesmo os e-mails que ela recebe, imprime e acomoda em pastas. Tudo dividido em quatro salas - Machado de Assis, Homero, Cervantes e Clarice Lispector. No corredor, uma foto da escritora criança, olhos faiscantes no colo da mãe, Carmen. "Conto a história dessa foto no livro de memórias que logo vai sair. O Rubem Fonseca olhou o retrato e disse: ?Se nós tivéssemos visto essa foto antes, teríamos nos prevenido contra ela.?", diverte-se ela, ainda menina.

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