Carol Saboya valoriza Mário Sève cancionista

Cantora revela maturidade no ótimo CD Chão Aberto

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Por Lauro Lisboa Garcia
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Fugir do convencional e do eclético é uma característica da cantora Carol Saboya, talvez, como ela reconhece, por influência do pai, Antonio Adolfo, um pioneiro dentre os músicos independentes. Até quando gravou um álbum dedicado a Tom Jobim (Janelas Abertas, 1999), com o guitarrista Nelson Faria, ela transcendeu o óbvio. Agora Carol se debruçou exclusivamente sobre as composições de Mário Sève, no ótimo álbum Chão Aberto (Sala de Som Records). Ouça a música Draganjo Entre os parceiros de Sève, que toca sopros (flauta, flautim e saxes) e fez os arranjos do CD, o mais constante é Mauro Aguiar. "Ninguém melhor do que ele para fazer os arranjos", assinala Carol. Mas suas excelentes melodias também ganharam letras à altura de Makely Ka, Chico César, Pedro Luís, Cecília Stanzione, Edu Krieger e Guile Wisnik - uma boa amostra de talentos emergentes. Como intérprete tenho mais é que lançar gente, mostrar coisas novas que estão sendo feitas", defende Carol. Como outras jovens cantoras que despontaram depois dela, Carol parece concentrada na busca de identidade com seus pares musicais em cada projeto que realiza, e realiza plenamente seu objetivo na rebuscada musicalidade de Sève. "O repertório dele tem muito a ver com o que eu gosto, são canções de muita classe, sofisticadas", confirma a cantora. Mais conhecido como instrumentista, Sève teve a companhia de Carol desde o início de sua fase de cancionista. Tudo começou com Imaginária, "uma música de instrumentista" que "virou uma canção por acaso", defendida por ela, ao lado da coautora Suely Mesquita, com arranjo de Antonio Adolfo, no Festival da Música Brasileira (TV Globo), em 2000. Vieram a partir daí a frutífera parceria com Guile Wisnik e a participação em outros festivais. Imaginária entrou no álbum Casa de Todo Mundo (2007), um dos mais brilhantes de música brasileira desta década, e foi interpretada por Carol também no show de lançamento do CD. Esse reencontro despertou nela o interesse em fazer um disco só com suas canções, como lembra a cantora. O canto de Carol revela o domínio da técnica, mas com o cuidado de não suplantar a expressão do sentimento. Tem a suavidade de uma bossa-novista (como em Águas Passadas), mas com a mesma desenvoltura com que desliza por uma balada (Finais Possíveis), baila um tango (Canción Necesaria) languidamente, balança na ginga de um ijexá (Bonde Iorubá), de um maxixe (Trocando as Pernas) ou de frevos (Um Segredo, lento, e Outros Carnavais, mais acelerado), e encara um xaxado (Draganjo). Esta última, uma das parcerias de Sève com Mauro Aguiar, é dificílima, "um pedaço de cordel", que ela canta em duo com o contrastante Daniel Gonzaga. Trocando as Pernas tem a participação do coautor Edu Krieger. "Desde o show de 50 anos de Aldir Blanc, tenho uma certa fama de gostar de cantar coisas difíceis", brinca Carol. Era 1999, ela estava começando a carreira e pouca gente a conhecia quando decidiu encarar a intrincada Carta de Pedra (Igreja da Penha), de Blanc e Guinga, no show. Causou impacto. Hoje, embora ache que esse Chão Aberto tenha coisas "bem tranquilas" de cantar, ela continua gostando de desafios. "Cantar músicas difíceis, juntando técnica e emoção, é algo que aos poucos a gente vai adquirindo, amadurecendo, e Mário dá muito valor às melodias." Sève escreveu no encarte de Chão Aberto que Carol, "com timbre doce e fraseado melódico e sensível, coloca a entonação precisa nas palavras". De fato, Carol sabe das coisas, sempre foi bastante criteriosa no que escolhe para cantar e aqui ela acerta em cheio, da primeira à última faixa, nessa entrada no décimo ano de carreira.

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