PUBLICIDADE

Branca de Neve em versão dark

O espetáculo 7 transforma a fábula infantil em musical, narrado por canções soturnas de Ed Motta

Foto do author Ubiratan Brasil
Por Ubiratan Brasil
Atualização:

Sete são os pecados capitais e também as maravilhas do mundo. As pragas do Egito são sete assim como as cores do arco-íris. E sete são os anões da Branca de Neve, história infantil que inspirou o mais autoral trabalho da dupla Claudio Botelho e Charles Möeller, que estreia hoje para convidados, no Teatro Sérgio Cardoso, e que se chama justamente 7 - O Musical. "O número é emblemático e nos surgiu durante o processo", conta Möeller, autor do texto e responsável pela direção. "E a fábula da Branca de Neve é apenas o ponto de partida, pois a história é como um tratado sobre a inveja", completa Botelho. A trama desconstrói a história infantil ao centralizar a narração na madrasta má, Amélia (Alessandra Maestrini), que é trocada pelo namorado por Bianca (Alessandra Verney), jovem pura, simples e bonita. Aconselhada por sua madrinha (Eliana Pittman), Amélia consulta uma cartomante, Carmen dos Baralhos (Zezé Motta), que a submete a sete pedidos para recuperar o amor. De todas, a sétima tarefa revela-se a mais complicada: conseguir o coração de alguém que nunca tenha se apaixonado. Com isso, Amélia vai parar no bordel de Dona Odete (Rogéria), onde se envolve com o jovem Álvaro (Pedro Sol) e sofre nas mãos de outras funcionárias do local, Madalena (Janaína Azevedo) e Elvira (Ivana Domenico). Ao mesmo tempo em que a trama segue, uma misteriosa velhinha, Senhora A. (Suzana Faini), conta para a afilhada a história de Branca de Neve, em uma das chaves do misterioso enredo. Os fatos se desenrolam em uma Rio de Janeiro que bem poderia ter sido recriada por Tim Burton: escura, tenebrosa e onde até neva. O tom de ópera dark surgiu quando Botelho e Möeller foram surpreendidos pelo cantor e compositor Ed Motta. "Em 2001, depois de assistir à nossa montagem de Company, ele nos procurou para dizer que tinha algumas canções sem letra que se encaixariam em um musical", lembra Botelho, que ficou com um CD demo. A audição foi surpreendente. "Não eram canções simples, pois sugeriam personagens, dramaturgia, com diálogos já desenhados entre contralto e soprano. Não tinha assunto, mas era absolutamente teatral." Admirador de autores clássicos dos musicais como Stephen Sondheim e Cy Coleman, Ed Motta já ensaiava há muito uma aproximação com o gênero. "Compus algumas canções cuja melodia acabei incorporando em meus álbuns", conta ele, sensivelmente inspirado por artistas diversos, como Carla Bley e Paul Haines (Escalator Over the Hill ) e até Frank Zappa (Absolutely Free). "Para o musical, é preciso uma acuidade sonora muito grande, um controle com o desenho de cordas, com a letra." Claudio Botelho, então, realizou o sonho de criar letras para as canções - autor das elogiadas versões em português dos grandes musicais da Broadway recentemente montados no Brasil, ele domina a dicção do gênero, sabendo qual sílaba é a mais correta para determinada nota. Assim, o trabalho com Motta começou em 2004 e terminou três anos depois. O tom soturno das composições ("Acho que ouvi muito Sweeney Todd, do Sondheim", brinca Motta) logo inspirou Charles Möeller a criar sua melancólica história sobre a frieza que domina as almas humanas. Não foi difícil pois ele já pesquisava sobre os contos dos irmãos Grimm - não as versões edulcoradas de Walt Disney, mas os aspectos mais adultos, especialmente a crueldade. "Charles é um obcecado estudioso desses contos, colecionando versões e traduções ao longo do tempo", conta Botelho. Para dar vida a personagens tão marcantes e distintas, Möeller e Botelho decidiram escalar um elenco sui generis, com artistas de gerações e trajetórias bem distintas, além de uma cantora, Eliana Pittman, estreando como atriz. "São mulheres de forte personalidade, que exigiam papéis especialmente escritos para cada uma", explica Möeller. Do grupo que encenou o musical no Rio de Janeiro, apenas uma alteração sentida: Suzana Faini substitui Ida Gomes, que interpretou Senhora A. até janeiro deste ano, um mês antes de morrer. "Ida foi uma das primeiras atrizes escolhidas, pois queríamos alguém que tivesse uma voz marcante", lembra Botelho. "Como fez muitas dublagens para filmes e desenhos, Ida tinha um tom muito conhecido, que contribuiu fundamentalmente para a criação de toda a atmosfera do espetáculo." Como não observou cuidadosamente o trabalho de Ida, Suzana Faini sentiu-se à vontade para criar seu próprio trabalho. "Não me lembro de detalhes da atuação dela, o que me ajudou", conta a atriz que, curiosamente, utiliza o mesmo figurino da antecessora. "As roupas e os sapatos serviram bem. É como se ela estivesse ainda acompanhando o espetáculo." Serviço 7 - O Musical. 135 min. 14 anos. Teatro Sérgio Cardoso. Rua Rui Barbosa, 153, 3288-0136. 6.ª, 21h30; sáb., 21h; dom., 18h. R$ 20 (balcão) e R$ 40 (plateia). Hoje, para convidados. Até 6/6 UM ELENCO INUSITADO ELIANA PITTMAN: Com uma discografia que ultrapassa 20 álbuns, a cantora conta que precisou adaptar-se para o musical. "Nos shows, eu enlouqueço; no palco, porém, tenho de seguir o que manda o diretor", conta ela, que tem dois solos em cena. ZEZÉ MOTTA: Com vasta carreira, a atriz e cantora sentiu-se agradavelmente surpreendida com seu papel em 7: "Pela primeira vez, vou interpretar uma personagem má", brinca ela, que vive a cartomante Carmen. "Por isso, tive dificuldade em descobrir a melhor forma de interpretá-la." ROGÉRIA: Sem esconder a idade (completa 66 anos em maio), a artista que já fez shows na Europa e na África conta que ficou apavorada quando foi convidada para o musical. "Saí da mesmice e ainda criei a maquiagem que uso em cena."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.