Bonner faz sua leitura sobre o JN

Noticiário chega aos 40 com livro que relata o mecanismo de seus bastidores

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Por Cristina Padiglione
Atualização:

A obsessão de ser compreendido por um público tão heterogêneo quanto permitem as dimensões de um país como Brasil faz de William Bonner um didático por excelência. A evidência de quem persegue o tom está no livro Jornal Nacional - Modo de Fazer (Ed. Globo, 244 págs., R$ 35,90), que o editor chefe e apresentador do JN lança agora, para celebrar os 40 anos que o maior noticiário do País completa na terça-feira. Bonner relata como é feito o JN, quem são os profissionais envolvidos nele e, melhor, cenas de bastidores. Ao Estado, ele falou por e-mail, desculpando-se pela falta de tempo para uma conversa de viva voz: "Vamos estrear cenário novo na segunda, temos gravado pilotos diariamente", conta. O livro é bastante didático. A quem ele é dirigido? Sobre a questão do didatismo, imaginei que seria necessário para que os mecanismos do JN fossem compreendidos por quem quer que se interessasse pela leitura. É claro que jornalistas poderão ter essa curiosidade - e certas explicações lhes parecerão dispensáveis. Mas haverá também leitores entre estudantes e telespectadores que são leigos em jornalismo. Você se mostra muito tranquilo para quem comanda o principal telejornal do País. Qual foi o momento de maior tensão durante o JN? Preciso observar que não sou tão tranquilo assim. O rigor que aplicamos na apuração jornalística exige atenção absoluta, além de uma humildade que não combina com a imagem que muita gente possa ter de um editor-chefe de Jornal Nacional. O cargo exige a humildade de ouvir opiniões divergentes das minhas. Ao mesmo tempo em que um chefe tende a baixar a adrenalina de todos, um chefe que muda de ideia, convencido por novos argumentos, precisa mudar a ordem de paginação do jornal, os tempos reservados aos assuntos... E isso eleva muito a adrenalina dele. Sobre tensão durante a apresentação, tenho que dizer que todas as apresentações do JN são tensas. Seja porque a edição de textos e a apresentação ocorrem simultaneamente, seja porque não conheço ninguém que fala com tanta gente sem um certo nível de tensão. E conto um "causo": perguntei ao Cid Moreira, no dia em que o vi de perfil pela primeira vez (e nunca esqueci isso, porque a TV só mostrava o Cid de frente), quando ele deixou de ficar nervoso para apresentar o JN. E ele, com aquela voz: "Nunca. Eu sempre fico nervoso quando estou aqui." No livro, você esclarece que o termo ?âncora? não implica emitir opinião, como faz Boris Casoy, e que o JN não emite opinião. Casoy diz que a seleção dos assuntos, o tempo dado a cada um e a inflexão do apresentador também são um meio de expressar opinião. Você concorda? Não concordo - embora tenha um respeito enorme pelo Boris, que me levou a citá-lo, no livro. A seleção de assuntos diz respeito ao processo incontornável de edição, que, no caso de um jornal generalista como o JN, tem o objetivo de levar as principais notícias aos telespectadores. Se eu, como editor chefe, escolhesse assuntos distantes desse objetivo, talvez pudesse aceitar que escolher é opinar. Mas a comparação entre o que o JN noticia com os principais jornais do Brasil e do mundo mostrará um alto grau de coincidência: geralmente a manchete do JN é a manchete dos jornais, o conteúdo do JN se assemelha às primeiras páginas. E, dentro de cada reportagem, a gente oferece opiniões plurais, emitidas por pessoas que divergem. É diferente de eu ou Fátima dizermos se um dos lados está certo ou errado. O JN inaugura novo cenário na próxima segunda-feira. De que forma você interfere nessa repaginação? O cenário foi concebido pela equipe do diretor de arte Alexandre Arrabal com a supervisão da direção do Jornalismo. No cenário, mesmo, dei um pitaco ou outro, mas mal os reconheço no resultado final porque evoluíram para soluções melhores. A bancada nova do JN foi desenvolvida em absoluto respeito à ergonomia. Isso faz uma diferença incrível. É a melhor bancada que já tivemos (Fátima não se cansa de elogiar). Acho bem difícil que haja algo melhor em qualquer outra televisão do mundo em termos de funcionalidade para a edição e conforto para a apresentação. A reforma será só no cenário ou pressupõe mudanças no formato? O cenário é a etapa final de um processo de reformulação que começou há cinco meses. Primeiro, com a mudança na forma de participações ao vivo dos repórteres: mais longas, mais frequentes e com maior interação com os apresentadores. Depois, modificamos as formas de enquadramento das câmeras. Você e Fátima Bernardes têm adotado tom mais coloquial na bancada. O que motivou essa aproximação? Depois de tantas edições em que um estava na bancada e o outro estava fora, nós percebemos que é absolutamente possível apresentarmos o JN com menos "sisudez", digamos assim, sem perdermos a seriedade. Nós nos tornamos menos solenes. E isso vai ficar mais evidente com o cenário novo. Por fim, mas não menos importante: quem escolhe suas gravatas? Tá brincando? Eu, ué!

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