Amor e morte em P.S: Eu Te Amo

Filme de Richard LaGravenese com Hilary Swank e Gerard Butler foge ao lugar-comum das comédias românticas

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Por Crítica Luiz Carlos Merten
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Duas vezes indicado para o Oscar - por Pescador de Ilusões (Fisher King), de Terry Gilliam, e Erin Brockovich, Uma Mulher de Talento, de Steven Soderbergh -, Richard LaGravenese ganhou um prêmio humanitário pela direção do longa Escritores da Liberdade, com Hilary Swank. No ano passado, ele também realizou em episódio (Pigalle) do longa coletivo Paris, Eu Te Amo, que o diretor-geral do Festival de Cannes encomendou a cineastas de todo o mundo para ser lançado no evento de cinema mais cosmopolita do mundo. LaGravenese está de volta à direção, e de novo com Hilary Swank. Assista ao trailer do filme P.S: Eu Te Amo Ela própria vencedora de dois Oscars - por Meninos Não Choram, de Kimberly Peirce, e Menina de Ouro, de Clint Eastwood -, Hilary ganhou projeção interpretando personagens duros e, de alguma forma, ''''viris''''. A garota que se disfarça como homem e a pugilista passam pela vida retribuindo as pancadas que recebem. LaGravenese faz outra idéia da atriz. Ele gosta de filmar a Hilary Swank ''''mulherzinha''''. P.S: Eu Te Amo é uma comédia romântica, a mais romântica que Hilary já interpretou. Mas, prepare-se, é diferente da maioria dos filmes do gênero que você está acostumado(a) a ver. Afinal, é bom lembrar que LaGravenese escreveu também As Pontes de Madison, para Clint Eastwood, que pode ser definido tanto como um filme sobre o amor maduro quanto um filme maduro sobre o amor. Começa com o casal na rua. Gerard Butler, de 300, correndo atrás de Hilary. Eles estão brigando. Parece mais Cenas de Um Casamento, sem Ingmar Bergman, do que qualquer das comédias românticas que você tenha visto recentemente. A briga prossegue no apartamento, com direito a um strip-tease de Gerard Butler para tentar melhorar a relação. Ele termina a cena cantando, mas não se entusiasme - em vez de sunga, o herói veste uma cueca samba-canção. O choque vem em seguida e, talvez, se você preferir senti-lo de maneira inesperada, no cinema, talvez seja melhor abandonar o texto por aqui, voltando depois para complementá-lo. A câmera afasta-se do retrato de Gerard, colocado sobre uma cômoda. Sim, ele morreu. Como? Uma comédia romântica em que o herói morre na segunda cena? Será que o filme se chama Um Casamento e Um Funeral? Mas não eram Quatro Casamentos (na comédia de Mike Newell com Hugh Grant)? Passaram-se menos de dez minutos e P.S: Eu Te Amo já terminou. A pergunta que não quer calar é - o que o roteirista e diretor Richard LaGravenese vai fazer para manter a narrativa andando por mais duas horas, já que P.S: Eu Te Amo tem em torno de 130 minutos? Não subestime a capacidade de LaGravenese. Vale lembrar que, em O Pescador de Ilusões, ele também falou sobre o efeito transformador da morte na vida dos que ficam. Lá, era Jeff Bridges, no papel do radialista que se sentia responsável por uma morte e vivia como um marginal - como um sem-teto -, até ter a coragem de recomeçar. Poderia ser um bom resumo para P.S: Eu Te Amo . A personagem de Hilary vai ao fundo do poço, mas também ela vai encontrar a forma de dar a volta por cima. E recomeçar. A questão, claro, é como isso ocorre. A originalidade de P.S: Eu Te Amo - por menos que o filme pareça original - está no fato de que o falecido aponta o caminho. Gerard Butler deixa um roteiro de cartas que Hilary vai recebendo, regularmente. Não se pergunte agora como elas vão chegando, porque uma das graças do filme está justamente na revelação da identidade da personagem que o ajuda, postumamente. As cartas vão mapeando a reconstrução sentimental da viúva. E, de repente, não é somente ela. A família toda - a mãe -, os amigos. Todos participam da história, que vai sendo contada em dois tempos - no presente e por meio dos flash-backs que mantêm o herói em cena (com o conseqüente aquecimento do romance). Talvez a definição, mais do que comédia romântica, para P.S: Eu Te Amo seja a de ''''women''''s picture''''. Um filme de mulher, não apenas dirigido preferencialmente para elas - e as mulheres levam os homens ao cinema, é o que as pesquisas não se cansam de nas dizer -, mas sobre elas. Toda a construção dramática converge para que não apenas Hilary, mas todas as demais personagens vão resolvendo seus problemas afetivos (e não apenas esses). A mãe, Kathy Bates, sofreu outro tipo de abandono e agora vive às turras com a filha. A amiga (Lisa Kudrow - leia entrevista ao lado) busca formar um par e a sua abordagem direta dos homens é sempre divertida, embora para muitos possa ser assustadora (pela franqueza). Se você não seguiu o conselho e continuou lendo este texto até aqui saiba que, lá pelas tantas, a ação se transfere para a Irlanda, e não deve ser por acaso. A Irlanda, no cinema, é um território mítico, como Monument Valley, e por obra do mesmo artista que filmou todos aqueles westerns na reserva do Utah, John Ford. Em Depois do Vendaval, o Homero do western filmou o mais irlandês dos romances da tela. A Irlanda não é só uma paisagem. É um estado de espírito, um conceito, quem sabe uma descoberta? Interessado(a) em saber? Veja P.S: Eu Te Amo. Richard LaGravenese, de certa forma, filmando amor e morte, fez o anti-Ghost.

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