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Ai Weiwei se decepciona com a China

Artista diz que seu país não valoriza a arte que expressaria sua abertura política

Por Stephen Wade
Atualização:

Ai Weiwei é um dos artistas mais famosos da China, e muitos o consideram um dos maiores artistas vivos do mundo. Trabalhando com o escritório de arquitetura suíço Herzog & de Meuron, ele ajudou a projetar o Estádio Ninho de Pássaro, a peça central dos Jogos Olímpicos de Verão de Pequim em 2008.

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O estádio no norte de Pequim, instantaneamente reconhecível por sua trama de vigas de aço curvas, também sediará a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim, em 4 de fevereiro.

Na fase do projeto, Ai esperava que a forma de treliça do estádio e a presença das Olimpíadas simbolizassem a nova abertura da China. Mas se decepcionou. Seguidas vezes ele descreveu o estádio e as Olimpíadas de 2008 como um “sorriso falso” que a China apresentou ao mundo.

O artista Ai Weiwei posa com sua escultura'Forever Bicycles'em Lisboa, em 2021. Foto: Armando Franca/AP

Ai acha que os Jogos de Inverno vão oferecer mais do mesmo.

Mesmo antes de sua fama lhe dar o emprego de designer, Ai era um crítico implacável do Partido Comunista Chinês. Ele foi preso em 2011 por crimes não especificados e agora é um franco dissidente que vive no exílio em Portugal. Ele também viveu exilado na Alemanha – onde ainda mantém um estúdio – e na Grã-Bretanha.

Sua arte – que vai da escultura à arquitetura, passando por fotografia, vídeo e palavra escrita – é quase sempre provocativa, e ele é mordaz sobre a censura e a ausência de liberdades civis em seu país natal.

Seu livro de memórias – 1000 Years of Joys and Sorrows – foi publicado no ano passado e detalha a sobreposição de sua vida e carreira com a de seu pai, Ai Qing, famoso poeta que foi mandado para o exílio interno em 1957, ano em que Ai Weiwei nasceu.

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Ai escreve em suas memórias: “No ano em que nasci, Mao Tsé-Tung desencadeou uma tempestade política – a Campanha Antidireitista, destinada a expurgar os intelectuais ‘direitistas’ que criticavam o governo. O redemoinho que engoliu meu pai também mudou minha vida, deixando em mim uma marca que carrego até hoje”.

Ele cita seu pai: “Suprimir as vozes do povo é a forma mais cruel de violência”.

Ai respondeu a uma lista de perguntas da Associated Press por e-mail. Ele mencionou suas esperanças frustradas com o Ninho de Pássaro para ilustrar como a China mudou desde 2008.

“Como arquiteto, meu objetivo era o mesmo de outros arquitetos, ou seja, fazer o projeto mais perfeito possível”, escreveu Ai à Associated Press. “A maneira como a obra foi usada depois foi na direção oposta aos nossos ideais. Esperávamos que nossa arquitetura pudesse ser um símbolo de liberdade e abertura e representar otimismo e uma força positiva, algo muito diferente da forma como foi usada no final das contas: uma ferramenta de autopromoção”.

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As Olimpíadas de 2008 geralmente são vistas como uma festa de “saída do armário” para a China. Quando o Comitê Olímpico Internacional concedeu a realização dos jogos a Pequim, em 2001, disse que o evento poderia ajudar a melhorar os direitos humanos no país. Ai, em vez disso, classificou as Olimpíadas de 2008 como um “desastre”, pois trabalhadores migrantes foram forçados a sair da cidade, pequenas lojas foram fechadas e vendedores ambulantes foram removidos, e outdoors do tamanho de quarteirões inteiros apareceram, pintados com palmeiras e cenas de praia, para esconder bairros pobres da vista.

“Todas as Olimpíadas ocorreram sob a situação de controle extremo”, disse Ai à AP. “Para o público em geral não houve alegria. Em vez disso, houve uma estreita colaboração entre o Comitê Olímpico Internacional e o regime chinês, que fizeram um show juntos para obter capital econômico e político”.

Ai escreve em seu livro que assistiu à cerimônia de abertura pela televisão, longe do estádio, e anotou o seguinte.

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“Neste mundo onde tudo tem uma dimensão política, agora nos dizem que não devemos politizar as coisas: é só um evento esportivo, desvinculado da história, das ideias e dos valores – desvinculado até da natureza humana”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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