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Afinidades Eletivas No Plano Literário

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Por Redação
Atualização:

Os estudantes da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, acertaram em cheio nas afinidades literárias quando convidaram Euclides da Cunha para proferir uma conferência sobre o "Poeta dos Escravos". O preito a uma de suas maiores admirações redobraria quando nosso escritor tomasse posse na Academia Brasileira de Letras, e justamente na cadeira que tinha o baiano por patrono. Sobre Euclides e Castro Alves projeta-se a sombra daquele que foi o poeta romântico por excelência, Victor Hugo. Os dois brasileiros miravam-se no exemplo de sua trajetória de bardo heroico e libertário, campeão dos oprimidos, que olha a História nos olhos e não se acovarda. Desafiando os poderosos, o francês seria banido por suas convicções em favor da plebe e viveria no exílio durante 20 anos. Na esteira do historiador Michelet, primeiro a postular o povo como agente da história - e não mais os indivíduos, sejam eles reis, líderes, heróis -, Victor Hugo dera primazia à personagem coletiva popular. Seria venerado e imitado entre nós, inspirando o "condoreirismo", versão americana da águia europeia formulada como emblema de elevação. Se a grande causa humanitária de Victor Hugo foi a dos revolucionários de 1848 e da Comuna de Paris, a de Castro Alves seria a dos escravos, enquanto Euclides se voltaria para os sertanejos e os seringueiros. Os três assemelham-se na concepção do artista como vate inspirado, arauto e profeta, anunciador do futuro e cantor da liberdade. Convergiriam em oratória grandiloquente e metáforas titânicas, bem como no uso de antíteses, apóstrofes e invectivas. A imaginação cósmica fez de Castro Alves uma testemunha da "marcha dos séculos", com visões dos "oceanos em tropa" e de protagonistas que "tropeçam na eternidade". Tanto nele quanto em Euclides ressaltam o gosto da antítese e de seus contrastes, valendo-se dos valores simbólicos da oposição entre luz (liberdade, emancipação, idealismo) e trevas (servidão, ignorância, opressão). Hugoano e castroalvino, Euclides amiúde receberia o sinete do primeiro já afeiçoado pelo segundo.

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