Adriana Varejão atinge o patamar de Anita Malfatti

A pintora contemporânea foi vendida por R$ 6 milhões na SP-Arte, valor equivalente ao da pintora modernista

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Por Antonio Gonçalves Filho
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O que caracteriza uma feira cosmopolita é sua capacidade de absorver obras artistas de diferentes tendências (e origens) e galerias com trânsito internacional. Com quase duas décadas de existência, a  SP-Arte confirmou sua adesão a esse modelo, retomando seu formato presencial no Pavilhão da Bienal com sucesso nesta segunda edição pós-pandemia. Com 133 galerias participantes (32 delas de design), a feira deste ano não se rendeu ao esquema de edições anteriores, em que a passagem de um estande a outro era quase imperceptível em virtude da homogeneidade de repertório e uniformização na escolha dos artistas – invariavelmente era sempre um nome predominante, como se toda a feira fosse a extensão de uma mostra individual (e o nome de Mira Schendel surge como o exemplo mais recorrente nas edições anteriores).

Pois a edição deste ano contemplou não só os vetores da arte moderna e contemporânea como novos artistas cujo advento no mercado é fruto dessa mudança de percepção. Para citar apenas um exemplo, a galeria que leva o nome da marchande Marli Matsumoto (que trabalhou com a veterana Luisa Strina por mais de dez anos)radicalizou e apresentou na feira só artistas com idade entre 28 e 40 anos, do carioca Elvis Almeida, que foi assistente do pintor Luiz Zerbini (com uma exposição no Masp), à ex-bailarina transexual gaúcha Elle de Bernardini, de 31 anos, que pulou da Royal Academy of Dance de Londres para o palco das artes visuais. Ou Raphaela Melsohn, de 28 anos, que vira Bruce Nauman do avesso numa obra pós-conceitual carregada de humor. Ou ainda Juan Casemiro, de Itajubá, que faz um aggiornameno do ready-made de Duchamp comobjetos reciclados.

A tela 'Sauna" de Adriana Varejão foi vendida pela Almeida & Dale por R$ 6 milhões Foto: Galeria Almieda& Dale

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Claro, são jovens em começo de carreira, cujas obras oscilam entre R$ 5 mil e R$ 30 mil. Numa feira que tinha Miró (por R$ 12 milhões, ainda em negociação até o fechamento desta edição), Tarsila do Amaral (R$ 10,5 milhões), várias esculturas de Anish Kapoor (média de R$ 5,5 milhões) ou Lygia Clark (R$ 2,5 milhões), é quase nada, mas, como dizia aquela velha canção dos anos 1960 de André Previn (You Gonna Hear From Me), os jovens artistas citados ainda esperam chegar lá algum dia.

O fato é que os colecionadores estavam atrás de obras milionárias, nem tanto as históricas – e surpreende que, no ano do centenário da Semana de Arte Moderna de 22, poucas galerias tenham apostado em seu legado. Claro, Di Cavalcanti podia ser visto em vários estandes, mas o pintor já é uma presença constante nas feiras  (e algumas telas suas foram venidas por preços entre R$ 2 milhões e R$ 5 milhões).

A Dan Galeria apostou alto e colocou frente a frente um retrato de Tarsila (pintado em 1922 e muito reproduzido, mas não vendido ) e uma tela de Anita Malfatti de 1925 (A Mulher e o Jogo), avaliada em R$ 6,5 milhões e vendida por preço equivalente. Considerando as cotações do surrealista Ismael Nery na mesma Dan (entre R$ 8 milhões e R$ 14 milhões),a da primeira geração das pintoras modernistas era razoável.

A obra "Ou em Outro Lugar', de 2007, do escultor carioca Waltercio Caldas Foto: Galeria Raquel Arnaud

Coube à pintora contemporânea Adriana Varejão atingir o patamar dos modernistas da Semana de 22. A Galeria Almeida e Dale vendeu sua tela Sauna, de grandes dimensões, por R$ 6 milhões, e ainda um Volpi por R$ 2,8 milhões, entre outras obras de seu estande, que tinha, entre outros nomes, o das pintoras portuguesa Paula Rego e a alemã Eleonore Koch, única discípula de Volpi.

Volpi, outra presença permanente na SP-Arte, manteve seu lugar no pódio (preços entre R$ 550 mil e R$ 2,6 milhões), mas quem subiu de posição foi o pintor baiano Rubem Valentim (1922-1991), duplamente homenageado em seu centenário pela galeria Almeida e Dale e pela Pinakotheke, com um livro e breve exposição no Rio) . O preço médio de uma boa tela de Valentim, de dimensões médias, girou em torno de R$ 1 milhão (as pequenas giravam em torno de R$ 120 mil), um pouco mais que a rara pintura do carioca Ivan Serpa dos anos 1960 (R$ 750 mil) à venda na galeria de Aloísio Cravo Neto, ao lado de uma rara aquarela ( R$ 250 mil) de Léger. Por um pouco mais (RS 400 mil), a Galeria Raquela Arnaud vendeu uma escultura de Waltercio Caldas.

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Poucas galerias estrangeiras participaram da feira este ano, mas as brasileiras estavam repletas de obras de artistas de fora (Damien Hirst, Calder, Miró). Duas concorrentes do Uruguai, a Sur a Galeria de las Missiones, ambas com foco no construtivismo de Torres García (preços em torno de US$ 1 milhão), apostaram em María Freire (preços a partir de US$ 35 mil) e Pedro Figari (preços entre US$ 30 mil e US$ 120 mil), dois dos maiores nomes da moderna arte uruguaia, hoje objetos do desejo de colecionadores brasileiros.

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