PUBLICIDADE

Aberto o arquivo de Hemingway

Papéis escritos durante sua passagem por Cuba foram digitalizados e liberados

Por Ed Pilkington e The Guardian
Atualização:

Estudiosos da obra de Ernest Hemingway, o romancista ganhador do prêmio Nobel com um poderoso ímpeto literário e factual, receberam um presente importante na semana passada, com a abertura de um arquivo digital de papéis que ele deixou dos dias em que viveu em Cuba. Os documentos, fotos e livros ficaram durante décadas no porão úmido da casa de Hemingway, a 11 quilômetros de Havana. Entre as gemas estão um epílogo não publicado de seu romance Por Quem os Sinos Dobram e um roteiro de cinema para O Velho e o Mar. A coleção toda dos esboços de textos e cartas de Hemingway escritos durante os 21 anos que ele passou em Cuba estava em risco de se desintegrar em meio ao calor, à umidade e às infestações de insetos no porão de sua propriedade, La Finca Vigia. Durante anos, o trabalho de restauradores foi prejudicado pelo embargo americano à ilha que impedia a troca de expertise e o aporte de recursos. Mas um projeto de restauração foi lançado em 2002, depois que um antropólogo americano ficou horrorizado ao encontrar a casa ameaçada sob um telhado com vazamentos e o mofo se espalhando pelas paredes. Uma permissão especial do governo norte-americano foi obtida por uma missão conjunta de resgate cubano-americana que resultou na liberação de documentos na semana passada. Os papéis foram restaurados, preservados e escaneados para o uso digital. Os estudiosos agora podem solicitar acesso a documentos específicos do Museo Ernest Hemingway em Havana, que é responsável pela arca do tesouro; ou da biblioteca John F. Kennedy, em Boston, que abriga o resto do arquivo de Hemingway e recebeu um conjunto de CDs e microfilmes de Finca Vigia. Não existem planos para permitam o acesso direto do público aos documentos na internet, mas as autoridades cubanas dizem que isso poderá ocorrer no futuro. A coleção digitalizada já inclui cerca de 2 mil documentos, e outros mil estão a caminho. "Muitas pessoas perguntam: ?Como era a vida de Hemingway em Cuba?? Isso responde a algumas dessas perguntas", disse Ada Rosa Alfonso, diretora do museu de Finca Vigia, à Associated Press. Hemingway viveu em Cuba de 1939 até voltar aos Estados Unidos em 1960. As paixões e o tormento do escritor ainda são visíveis na casa transformada em museu, incluindo sua propensão para a bebida na forma de garrafas cheias pela metade de bourbon Old Forester e Cinzano espalhadas pela casa; seu amor por touradas e caça com pinturas de touradas e cabeças de antílope nas paredes; e animais de estimação, com seus quatro cachorros enterrados em túmulos marcados no jardim. Na sala de visitas , a mesa está posta para entreter: Errol Flynn e Cary Grant costumavam visitar Finca Vigia, e Ava Gardner nadava nua na piscina agora vazia. O barco de pesca de 15 metros de Hemingway, El Pilar, também está preservado numa doca seca. Foi nessa embarcação que ele vasculhou os mares ao norte de Cuba durante a 2ª Guerra Mundial atrás de evidências do que acreditava ser o reabastecimento de combustível por submarinos alemães. Textos sobre essas viagens, escritos em código por Hemingway, estão entre os documentos recentemente digitalizados. Mas aparentemente não há obras literárias não publicadas nesse acervo. Depois que o escritor se matou, em 1961, um ano após seu retorno aos Estados Unidos, sua viúva, Mary Welsh, contou com a ajuda do presidente americano John Kennedy para romper o embargo a Cuba e fazer uma última visita a Finca Vigia. Nessa ocasião, ela levou a maioria das obras em progresso não publicadas do escritor para os Estados Unidos. Mas os pesquisadores provavelmente ficarão interessados na correspondência que Hemingway recebia de seus editores americanos e de outros escritores, bem como as cartas associadas a seu relacionamento com a condessa italiana Adriana Ivancich, que tem sido identificada como uma possível modelo para a heroína de seu romance Do Outro Lado do Rio, Entre as Árvores, publicado originalmente em 1950. Hemingway era um entesourador inveterado. Mary Welsh disse em certo momento que ele "nunca jogava nada fora, exceto embalagens de revistas e jornais de três anos". Seu apetite literário voraz também está exposto em La Finca Vigia, que abriga 9.000 livros, muitos deles marcados com comentários seus nas margens. TRADUÇÃO DE CELSO MAURO PACIORNIK

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.