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A vida da stripper que ganhou Oscar

Com a mesma verve do roteiro de Juno, Diablo Cody conta as memórias do ano que passou tirando a roupa no palco

Por Patricia Villalba
Atualização:

Não dá para afirmar com certeza qual foi o momento em que o Corvette vermelho de Brook Busey virou rumo à estrada da indecência para que ela cultivasse a persona Diablo Cody, seu pseudônimo de stripper. Mas boa parte das impressões sobre como a vida pode ser vista do alto de um poste de bordel ou da "vitrine" onde são exibidas as moças que estrelam as cabines de peepshow estão em Minha Vida de Stripper (Nova Fronteira, 224 págs., R$ 34,90), que chega às livrarias em tradução de Ana Carolina Bento Ribeiro. Diablo tornou-se conhecida neste ano como "a ex-stripper que ganhou o Oscar", depois de escrever o roteiro do delicado Juno. Quem viu o filme sobre a adolescente que engravida e sai em busca de pais adotivos para seu bebê sabe que a autora não é fã de clichês ou soluções fáceis. E mesmo com uma matéria-prima que é capaz de agregar todos os grandes clichês da literatura pop, ela consegue fugir do óbvio, da vitimização e do discurso neofeminista que costuma rodear livros do tipo "memórias de uma profissional do sexo". Muito pelo contrário, o leitor não vai encontrar ali traumas de infância, necessidade de vingança de pais ou muito menos conclusões pseudo-antropológicas. "Acho que você não vai encontrar nada disso aqui", avisa elas aos leitores, no último capítulo. "Esse é o lance das histórias reais: raramente elas têm um clímax." Sem clímax, mas com realismo e um humor instigantes, Diablo leva o leitor para além do fumacê dos bordéis de Minneapolis. A cidade do Estado americano de Minnesota não poderia ser menos provável neste tema. Fria e pouco amigável, não há ali bordéis luxuosos como os de Miami ou Las Vegas, por exemplo. E é também por isso, entre tantos outros aspectos, que o relato se torna mais interessante. "Ninguém vem para Minnesota para tirar a roupa, pelo menos até onde eu sei", filosofa a autora, já na primeira frase do livro. Nascida em Chicago, Brook Busey formou-se com louvor em Redação Criativa na universidade. E, mesmo que as tatuagens espalhadas pelo corpo pudessem dar a impressão do contrário, ela vivia uma "azia psicológica". Logo teria de viver uma vida plenamente adulta, mas ainda sentia um formigamento de adolescente. "Nunca joguei bebida na cara de alguém no meio de um porre. Nunca furtei um batom numa loja bacana. Eu era um saco, queridos", admite Diablo. A vida de stripper começa quando ela resolve mudar-se para Minneapolis, depois de conhecer pessoalmente um namorado que arranjou na internet. Lá, começa a trabalhar como digitadora, emprego que permite que ela acesse pornografia na internet entre uma tarefa e outra. Da digitação para o strip-tease é um pulo - com vários hematomas. Atraída pela diversão e pelo dinheiro aparentemente fácil, ela se lança na Noite Amadora de um clube local. Um desastre. "Stripper é uma profissão que parece superglamourosa, mas a idéia de tirar a roupa no circuito amador me desesperava tanto quanto uma cidadezinha no interior do Texas", define. A estréia foi muito ruim, a começar pela cara do sujeito que recebia as inscrições das "amadoras" na porta do clube. Mas não traumatizou. Diablo resolve ir adiante, como se um desafio tivesse sido imposto. Primeiro, conseguiria transformar sua figura pouco comum - veja a foto dela, nada parecida com "as barbies" que perambulam pelos clubes oferecendo lapdances por US$ 20 - numa outra, atraente sob a luz negra. Depois, ganharia dinheiro de verdade. Oscar? Não, esse não estava nos planos. Nem o livro, aliás, parecia estar nos planos de Diablo. Se estava, ela disfarça muito bem ao compor um livro que, mesmo com pretensões menores, remete ao clima do grande A Mulher do Próximo, de Gay Talese. E, note-se, sem a chatice do discurso "prostituta intelectualizada", repetido à exaustão depois que Jane Fonda viveu Bree Daniels no cinema.

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