A Pátria e a Dinastia

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Por Redação
Atualização:

Os últimos acontecimentos demonstram eloquentemente que o governo atual, apeado ao terreno infecundo dos expedientes, abandonou consciente da própria esterilidade a verdadeira política, desviando de todo o seu espírito da elaboração elevada das verdades sociológicas imediatamente, adaptadas à direção positiva da nossa nacionalidade. Ignorante, diante das noções mais rudimentares do direito constitucional e além disto profundamente incompatibilizado com o elevado destino da política americana, a sua posição até então indefinida - perante a civilização - começa a assumir um caráter nimiamente agressivo. No entretanto, nenhuma quadra melhor se apresentaria a receber o influxo, a ação poderosa de uma política francamente progressista que aproveitando e orientando racionalmente a vitalidade da Pátria, criasse, através da comunhão necessária dos interesses a grandiosa harmonia, a ligação indispensável de seu futuro ao de suas coirmãs da América. Leia a íntegra do texto Nada disto, porém, sequer intentou realizar. (...) Como explicar esse imprevisto movimento de armas, agora - em que se devia iniciar a convergência de todas as atividades para a luta prodigiosa da paz e do trabalho?... Não acreditamos que seja uma medida de ordem puramente administrativa - nem que o governo inspirando-se nas teorias do eminente criador do poder moderador - pretenda entregando aos cidadãos armados, à guarda nacional, a segurança interior do estado, investir a força arregimentada de sua verdadeira função que é defendê-lo no exterior. Esta medida seria precipitada sobre ser extemporânea. A guarda nacional é entre nós um mito - e que o não fosse pior ocasião não se poderia apresentar, para esse movimento assustador de dez mil baionetas na direção de uma fronteira - já de si fortalecida pela debilidade da nação limítrofe. Se pretende fazer sentir nos destinos das nacionalidades em litígio a sua influência, no peso da espada de um marechal ilustre - patenteia um triste retrocesso mental, fere de frente o direito constitucional, que negando-lhe a faculdade de declarar a guerra impede-lhe, portanto, de originar-lhe causas e indica limpidamente ter a mentalidade trancada ao maior ideal da política moderna, feito pela sistematização de todos os princípios generosos, em que a supremacia mental inspira e onde a fortaleza das ideias concorre vitoriosamente com o frágil vigor das espadas. Colocou, além disto, de um lado ou doutro dos próximos beligerantes, ou entre ambos, dez mil homens, dez mil temperamentos, expostos a todas as emoções, à magia e às esperanças da glória e dos combates - é ocasionar a guerra, o estéril dispêndio no exterior - agora - em que assoberba-o, crescente, no interior - a anarquia econômica! Pretenderá dar ao nosso século - o escândalo de uma guerra de conquista?... Acreditamos que não. A causa (...)- da ação teatral do governo - já está de há muito desvendada. Sentindo desaparecer dia a dia, o automatismo que por tanto tempo aniquilou a orientação digna da maioria dos atos da sociedade brasileira; compreendendo, diante do espírito nacional vigorosamente alentado por novas aspirações, a fragilidade do cômodo regime que o sustenta; notando - o que é mais sério - que a fronte do soldado, banhada nas correntes iluminadas do espírito contemporâneo, ousava cometer um delito, não previsto pelo conde de Lippe - racionar, o que transmudava-o numa força, força que se traduzia num movimento desassombrado e harmônico com o da sociedade; temendo, sobretudo, esse consórcio do pensamento com a espada - aliança que coloca esta ao lado do futuro e da liberdade - o governo resolveu antepor à política da Pátria a política imperial. E adotou a norma banal de dispensar para enfraquecer. Dispensa o exército, e tendo-o assim, não podendo destruir-lhe no cérebro a noção digna que começa a ter do futuro - excita-lhe a ambição com a imagem encantadora de futuras glórias. Santa ilusão, porém, em tudo isto!... Desiluda-se o governo. A civilização é o corolário mais próximo da atividade humana sobre o mundo; emanada imediatamente de um fato, que assume hoje na ciência social o caráter positivo de uma lei - a evolução - o seu curso, como esta, é fatal, inexorável, não há tradições que demorem-lhe a marcha, nem revoluções que a perturbem - tanto assim é que atravessando o delírio revolucionário de 93 e tendo pela frente - impugnadora - a espada de Bonaparte, onde irradiavam as gloriosas tradições do maior povo do mundo - emerge-o tranquilo no vasto deslumbramento do século XIX. Desiluda-se pois, o governo; a evolução se opera na direção do futuro - e quer o governo queira, quer não, embora voltado para o passado, caminhará com ela, para a frente, mas como os covardes - recuando. Nota da Redação: A grafia deste texto foi atualizada segundo as regras do Novo Acordo Ortográfico. Foram preservadas, no entanto, a pontuação e as construções sintáticas originais do autor, a fim de não alterar seu estilo

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