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A obsessão pelo espaço nas obras de arte

Essa é forte questão nas exposições do novo ciclo de mostras do Maria Antonia

Por Camila Molina
Atualização:

No primeiro piso do prédio do Centro Universitário Maria Antonia, vem das janelas uma luminosidade diferente, em tons que variam do alaranjado, amarelado e quase transparente. Subindo as escadas, a sensação de que a luz está diferente é a mesma - e, ao chegar ao segundo andar, o visitante se depara com uma janela de onde a luminosidade é toda azul. Trata-se do trabalho que a artista Lucia Koch apresenta agora no novo ciclo de exposições da instituição, que ainda exibe, desta vez, mostras de Rochelle Costi, Alfredo Nicolaiewsky, Paulo Penna e Fabiana Queirolo. A obra de Lucia Koch, Correções de Luz, feita pelo uso de filtros colocados na parte exterior das janelas (o que os camufla), não tem, numa primeira vista, a característica de ocupar uma sala expositiva com objetos - tanto que, a primeira idéia é pensar que aquele espaço está vazio. A artista usa o artifício para construir com cores e luz, para criar ''''campos de atmosfera diferentes'''', como ela diz. Ao mesmo tempo, faz parte de seu trabalho um vídeo que mostra o acontecimento de um coquetel, com convidados da artista, no local de sua exposição. Tanto o uso de filtros nas janelas, que ''''afetam'''' as condições de luz do lugar, como o drinque, mistura de bebidas alcoólicas, são ''''indutores de sensações, de estados alterados'''', diz Lucia. ''''Mas são sensações que não ficarão para sempre'''', ainda diz a artista - porque temos a consciência do real. Os filtros que nos colocam de maneira tão sutil entre o real e o irreal, são buscas de construção de atmosferas, mais um passo dentro da pesquisa realizada há tempos por Lucia Koch de modificação dos espaços. Enfim, como escreve o crítico José Bento Ferreira em texto sobre a obra de Fabiana Queirolo, feita com ''''imagens fragmentárias, pedaços de espaços literalmente colados no espaço expositivo'''' (abrigada no mesmo piso onde está a obra de Lucia), ''''o espaço é uma obsessão da arte contemporânea.'''' Rochelle Costi também cria nesse território. Em sua sala no segundo piso, toda escura, Rochelle faz projeções em slide de fotografias que ela realizou em espaços abandonados do Edifício Sampaio Moreira, prédio comercial inaugurado em São Paulo em 1924. Mas não são fotografias de registro: a artista levou objetos e criou cenas ''''como festas de firma'''' nos locais. Não são comuns, têm elas uma atmosfera estranha, irreal e solitária já que foi um ''''exercício solitário'''' para Rochelle. Na sala, ao som da música ''''melancólica e nostálgica'''' Dear Heather, de Leonard Cohen, as imagens projetadas se alternam - e, curiosamente, se fundem de forma sutil com a arquitetura do espaço expositivo criando uma atmosfera de suspensão para o espectador. Também no segundo piso estão as mostras de Alfredo Nicolaiewsky e de desenhos de Paulo Penna. Nicolaiewsky, artista gaúcho nascido em 1952 em Porto Alegre, participou há pouco tempo da exposição Erótica, realizada pelo Centro Cultural Banco do Brasil. Agora, no entanto, ele faz sua primeira mostra individual em São Paulo. Por conta dessa ocasião, o curador Tadeu Chiarelli decidiu com o artista fazer uma seleção de criações realizadas desde 1994 até obras inéditas de 2007. Na grande sala climatizada, os trabalhos exibidos em paredes cinzas são os mais recentes. Já os mais antigos estão sobre as paredes brancas. Há cerca de 20 anos Nicolaiewsky trabalha com as questões da apropriação, da junção e da justaposição de imagens (são essas as características reforçadas na seleção de obras que ele apresenta) numa maneira de criar relações, sentidos diferentes e resignificações ao misturá-las. ''''O valor pode ser dado pelo contexto em que as imagens são usadas'''', diz o artista. As fontes principais usadas por Nicolaiewsky são as culturas popular (imagens do repertório católico - os santinhos e a Iemanjá, apesar de o artista ser judeu - e estampas floridas); erudita (imagens da história da arte); e de massa (o cinema). Os sentidos trabalhados pelo artista, sempre feitos com a vontade de se criar narrativas, podem ser de atrito entre as imagens - como colocar num mesmo suporte o desenho feito a lápis de cor de inofensivo vaso de flores e uma faixa em que representa, também com desenho, um detalhe de um corpo masculino sensual. Ou podem ser de mistério surreal - como nas obras novas feitas pela apropriação de imagens digitais de cenas de filmes.

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