Foto do(a) blog

Partituras sem contratempos

Russ Gibb, o disc jockey que "matou" Paul McCartney em 1969, morre aos 87 anos.

Paul McCartney está morto desde 1969, segundo versão do disc Jockey americano Russ Gibbs. Puro fake news, mas dos mais bem elaborados e lembrados até hoje; A ironia: Russ morreu em abril deste ano, aos 87 anos, e deixou um McCartney bem vivo, rico e idolatrado. Lendas do rock.

PUBLICIDADE

Por Carlos de Oliveira
Atualização:

Quanta ironia. O disck jockey americano Russ Gibb, o homem que "matou" Paul McCartney no dia 12 de outubro de 1969, morreu dia 30 de abril em Garden City, Michigan, aos 87 anos.  Já há um bom tempo Gibb vivia doente em um centro de reabilitação nas proximidades de Dearborn Heights. Sua morte foi relatada em breve matéria publicada pelo Detroit Free Press .

Russ Gibb, o disc jockey que "matou" Paul McCartney em 1969, criou um dos fake news mais lembrados de todos os tempos.  

Russ, nos anos 60, entrevista Pete Townshend, líder da banda inglesa The Who.  Foto: Estadão

Russ Gibb entre amigos, em 2016. Morreria em abril deste ano.  Foto: Estadão

PUBLICIDADE

Em 1969, Gibbs trabalhava na rádio WKNR-FM, de Detroit, Estados Unidos, e era um nome de sucesso no meio musical. Tocava músicas na melhor qualidade e entrevistava ao vivo os ídolos da época.Um belo dia, recebeu um telefonema de um ouvinte alertando-o para "estranhas e macabras" mensagens contidas em músicas e capas dos discos dos Beatles, dando conta da morte de Paul. As "evidências" eram obscuras, quase delirantes, mas, mesmo assim, Gibb decretou a morte de Paul.

"Estou vivo" - De férias na Escócia, o beatle veio a público e disse que estava bem vivo. Tarde demais. Uma historinha boba havia virado mais uma da várias lendas do rock. Elvis e Michael Jackson, por exemplo, estão vivos. Quem duvida? Para quem gosta de lendas, Paul está morto. Viva então um certo "novo" Paul, que aos 76 anos permanece ídolo adorado em todo o mundo, bilionário e em plena forma. O que fazer?

Os boatos sobre a morte de Paul começaram um pouco antes, com um artigo de 17 de setembro no jornal da  Drake University, em Iowa, a partir de mensagens na música A Day in the Life, no disco Sgt. Pepper's, e na capa do álbum Abbey Road. Em 12 de outubro, Gibb embarcou na onda e conseguiu produzir um fake news histórico.

Está tudo lá - Vamos aos "fatos". A bem da "verdade", Paul não morreu em 69, mas três anos antes, exatamente às 5h da manhã do dia 9 de novembro de 1966, uma quarta-feira. Está tudo lá, em She's leaving Home, no álbum Sgt. Pepper's. Só não percebeu quem não quis.

Publicidade

...wednesday morning at five o'clock, as the day begins...

Sem cabeça - Mais adiante, em A Day in the Life, outra mensagem irrefutável. O beatle voltava do que hoje chama-se balada, ou balbúrdia. Em alta velocidade, não respeitou o sinal vermelho e avançou o cruzamento. A batida foi forte demais e Paul morreu instantaneamente. Tragicamente. Sem cabeça.

...he blew his mind out in a car... he didn't notice that the lights had changed...

Pouco sobrou do carro em que Paul teria perdido a cabeça.  Foto: Estadão

Anglo-escocês - No auge da fama, os Beatles tinham uma carreira pela frente, contrato milionário com a Capitol, campanhas de publicidade, concertos agendados, paradas de sucesso. O que fazer? O show tinha de continuar.

E continou. Com um sósia anglo-escocês de nome William Campbell Shears ou apenas Billy Shears, que já havia trabalhado como dublê de Paul nos filmes A Hard Day's Night e Help.

Publicidade

No álbum Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, lançado em 1º de junho de 1967, a apresentação oficial logo na primeira música ...so let me introduce to you the one and only Billy Shears...

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

A segunda música do álbum, With a little help from my Friends, com Ringo Starr, começa com uma curiosa abertura: Billy Shears... cantada em três vozes. Outra simulada apresentação no novo integrante da banda aos fâs.

Mais teorias - No álbum Abbey Road, a "morte definitiva" de Paul. O disco foi lançado em 26 de setembro de 1969 e a imagem da capa trouxe consigo uma série de dicas sobre o triste evento. Teorias as mais bizarras foram formuladas. Descalço, com o passo trocado em relação aos demais e com o cigarro na mão direita (Paul é canhoto), Paul era o morto. De roupa branca, John Lennon representava o médico ou o luto na tradição oriental. Ringo Starr, de preto, era o agente funerário. George Harrison, de jeans, o coveiro.

O Volkswagen branco à esquerda traria mensagens terríveis em sua placa LMW 28IF: Linda McCartney Widow (Linda McCartney viúva) e 28 SE (Paul faria 28 anos se estivesse vivo). O furgão preto à direita seria um carro funerário. À frente do Volkswagen, um Triumph Herald 1967 igualmente mal estacionado seria outro sinal de mau agouro. Lendas, apenas lendas.

Publicidade

O Volkswagen com placa enigmática, sugerindo a morte de Paul McCartney.  

Paul Cole, o turista americano que aparece de pé, junto ao fugão preto.  Foto: Estadão

De real mesmo, apenas uma imagem: o senhor de pé, parado ao lado do furgão preto. Para essa imagem há uma explicação.

Turista -O senhor é um turista americano chamado Paul Cole, cuja identidade foi descoberta anos depois.

Cansado de cumprir o roteiro turístico que lhe foi imposto, Cole preferiu caminhar pela Abbey Road enquanto sua esposa visitava mais um museu londrino.

 

Em 1966, a metamorfose do anglo-escocês Billy Shears (foto à esquerda) em Paul MacCartney  só foi possível após cirurgias plásticas.  

Fortuna - Não pensem que a "transformação" de Shears em McCartney foi um processo fácil. As lendas têm enredos intrincados. Vamos  eles: depois de muitas cirurgias plásticas, Shears ficou a cara de Paul. Mas não apenas isso. Revelou-se um artista completo. Compositor inspirado, multi instrumentista, cantor virtuoso, de sucesso mundial. Tornou-se um dos homens mais ricos da Inglaterra, com fortuna estimada em 710 milhões de libras esterlinas. Para se ter uma ideia dessa soma em reais, basta multiplicá-la por cinco.

Sucesso - Desde que juntou-se aos Beatles, Shears foi determinante na criação dos álbuns Sgt. Pepper's, Magical Mystery Tour, Álbum Branco, Yellow Submarine, Abbey Road e Let it Be.

Publicidade

Billy Shears na África, durante seu processo de transformação em Paul McCartney.  

Metamorfose - Até que não foi difícil encontrar um substituto para Paul. Tão logo se soube da morte do beatle, os responsáveis pela carreira do grupo abriram uma espécie de concurso nacional para buscar um sósia. Shears, um velho conhecido, foi o vencedor. Mas seriam necessários alguns "ajustes".

África - Mal Evans, amigo de infância e roadie dos Beatles, teria sido incumbido de levar Shears para uma longa viagem pela África, onde o sósia passou por cirurgias, principalmente para aparar seu nariz.

De volta à Inglaterra, Evans foi direto à casa do beatle e demitiu seu mordomo de longa data, George Kelly, para que não houvesse possibilidades de a farsa ser um dia descoberta.

Astro - De lá para cá, Shears, que nasceu no dia 15 de novembro de 1943, desfrutou de uma vida de astro do rock e pôde revelar ao mundo seus refinados atributos musicais. Rompido com o Beatles em 1970, iniciou uma carreira solo invejável: lançou mais de 50 álbuns, entre gravações de estúdio e apresentações ao vivo, indo do folk ingênuo ao clássico mais elaborado. No Brasil, Shears é presença constante. É um ídolo mundial. Casou-se três vezes e teve filhos. Deixou para trás sua vida muito modesta em Liverpool, onde dividia a pequena casa com os pais e sete irmãos.

Paul McCartney aos 76 anos, cheio de vida, com muitas turnês pelo mundo, bilionário e ídolo de várias gerações.  

Longa vida - Moral na história: fake news não foi um termo difundido por Donald Trump e adotado mundialmente, especialmente por aqueles que não se dão muito bem com verdades. É coisa antiga e pode ser duradora, como veio a provar Russ Gibb. Morto aos 87 anos em um asilo, deixa Paul McCartney vivo e muito bem vivo. Billy foi apenas uma lenda e nem todas as lendas têm final feliz, pelo menos para o pobre Shears, o homem que foi sem nunca ter sido. Longa vida a Paul McCartney.

Publicidade

 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.