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Arte, aqui e agora

Do Concorde ao 53° Show Aéreo de Paris, uma paixão de meio século

Abre hoje, 17 (até dia 23), o 53° Salão Internacional da Aeronáutica e do Espaço - Le Bourget, o chamado 'Show Aéreo de Paris'. Trata-se da minha outra amada bienal, não de arte, mas da indústria aeroespacial, considerada a maior exposição de aviação do mundo. Mas este é um ano diferente, também para mim. Em 2019 a aeronáutica francesa comemora o aniversário de meio século do nascimento do Concorde, avião supersônico que apaixonou todo o mundo e me fez atravessar o Atlântico nos anos 1970, do Brasil à França em quatro horas. Isto, sem contar os 30 minutos em Dakar: o aeroporto no Senegal era a única escala onde os passageiros, enquanto olhavam o artesanato, rezavam.

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Por Sheila Leirner
Atualização:

"É impossível se deslocar mais rápido do que a luz, e também seria idiota. Perderíamos o chapéu no caminho." Woody Allen

 

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Eu seguia um querido companheiro, aventureiro e destemido. Evidentemente, porque se fosse por mim, jamais teria escolhido, e nem tinha meios para tal proeza. É preciso dizer que com ele eu passava bastante tempo me benzendo. Como quando me proporcionou a travessia dos alpes suíços com Cessna em tempo de borrasca, para depois se divertir com voo de parapente, enquanto eu só pedia aos céus para que ele não se esborrachasse em alguma montanha.

O Concorde, vi estacionado pela primeira vez, quando era estudante, neste mesmo e famoso Show Aéreo, no aeroporto Le Bourget. Depois, no mesmo ano de 1969, há meio século, fui vê-lo passar sobre os Champs Elysées. Fiquei emocionada, admirei o nariz e aplaudi muito, sem imaginar que um dia estaria lá dentro, enquanto ele atingisse a velocidade de 2.180 km/h.

Sempre amei aviões, mesmo quando - em minha primeira viagem intercontinental na adolescência - o susto foi geral. Por causa de uma pane grave na aeronave que me levava para visitar a minha família nos Estados Unidos, tive que conhecer Santo Domingo em pouso forçado e ficar lá quase um dia inteiro sem que ninguém soubesse onde o avião estava. Não foi agradável, mas, pelo menos, pude saber que soldados brasileiros participavam da tomada do palácio do governo na República Dominicana.

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A única viagem em que se 'assiste' apenas aos 'quilômetros por hora'

No Concorde, éramos 110 "privilegiados". O privilégio consistia, como já disse, em chegar ao destino em 4 horas, com uma parada de 30 minutos em país africano, no lugar das 11 ou 12 horas normais. Única vantagem, além de poder narrar a façanha, como estou fazendo agora. O avião era estreito, o corredor e as poltronas apertados e inconfortáveis, a tripulação estressada e apressada, mal tínhamos tempo para uma refeição. Fora que a bandeja era tão pequena, que as porções de comida e o serviço (pratos, copos etc.) vinham em miniatura.

Uma telinha no alto mostrava o aumento da velocidade. Aquilo era tão atemorizante que mesmo quando, de repente, sentíamos um tranco desgraçado e um estampido (e a coisa acontecia duas vezes para subir e mais duas para aterrissar), a ansiedade só piorava. Como se isso acalmasse, o piloto avisava ao microfone que tínhamos atravessado a barreira do som. Os ouvidos tapavam um pouco, mas pelas janelas minúsculas não se via nenhuma diferença.

Eu sabia que para um avião concebido para correr, a celeridade era melhor do que a moleza, mas sentia que podia ser pior e não raro levava as mãos às orelhas, aos olhos e à cabeça me indagando o que estava fazendo ali. Portanto, quando não fazia a avestruz, acompanhava a velocidade pela telinha e continuava me benzendo. Creio que foi a única viagem que em vez de ouvir música, ler um livro ou assistir a um filme, assisti apenas aos "quilômetros por hora" que é o que eles chamavam de Mach2, algo como 2 200 km por 60 minutos. Eu me perguntava se alguma parte do meu corpo teria ficado para trás ou se eu viajava inteira nessa corrida contra o tempo.

Chegávamos e a aterrissagem era dura e bamboleante. Como se o piloto quisesse nos dizer: "aproveitaram o lado aéreo supersônico inteligente, agora aguentem o lado terrestre subsônico estúpido!"

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No momento em que atingia a ala de Roissy sempre duvidava se valia ganhar 8 horas a mais em Paris em troca de tanto medo e desconforto. O jet lag, afinal, era exatamente o mesmo.

Em julho de 2000, o Concorde caiu sobre um hotel, 2 minutos após sua decolagem daquele aeroporto, provocando a morte de 113 pessoas. Um acidente que, inevitavelmente, o levou à decadência sendo que, três anos mais tarde, o avião se despediu para sempre.

Até a próxima (quando lançarei este blog também em novo formato, aguarde), que agora é hoje e - mesmo com a sua aposentadoria em 2003 - continuo achando o Concorde um prodígio de avião narigudo que adoro. Mas muito mais, sem estar dentro!

Também hoje, em Blagnac - "cidade gêmea" de São José dos Campos, no Brasil - ocorreu o primeiro vôo do Beluga XL, o novo gigante da família Airbus. Com seus olhos e sorriso de baleia, a aeronave transportará outros aviões em seu ventre. Simplesmente.

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