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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Vai ter 'Vidro' de Shyamalan na 'Tela Quente'

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Dra. Ellie Staple (Sarah Paulson, dublada magistralmente por Angelica Borges) encara o Sr. Vidro (Samuel L. Jackson, na voz do bamba Márcio Simões) nesta produção de US$ 20 milhões que faturou 12 vezes mais Foto: Estadão

Rodrigo Fonseca Recém-saído de uma experiência exemplar como presidente do júri da Berlinale, onde fez um belíssimo trabalho ao conceder o Urso de Ouro ao espanhol "Alcarràs", M. Night Shyamalan vai iluminar a "Tela Quente" desta noite ao exibir "Vidro" ("Glass"), às 23h50, na TV aberta. Em horário nobre, Samuel L. Jackson vai ser ouvido na memorável dublagem de Márcio Simões; James McAvoy chega até nós na voz de Mckeidy Lisita, e Bruce Willis ganha a versão brasileira de Hércules Franco. Há uma frase seminal em "O Sexto Sentido" (1999), mais sútil e lúdica do que o desabafo que o celebrizou ("I see dead people!"), na qual se aprende: "Na vida, algumas magias podem ser real". Nos últimos 20 anos, período no qual construiu uma singular reputação (entre altos e baixos) como um dos realizadores mais ousados de Hollywood, mesmo quando a Meca do cinemão o esnobou, Manoj Nelliyattu Shyamalan - nascido em Mahé, Pondicherry, na Índia, em 1970 - nunca abriu mão da crença no mágico, no fantástico, no ilusório. Até "Sinais" (2002), a fantasia tinha lugar encantador em sua filmografia. Depois de "A Vila" (2004), sua obra-prima, ilusão passou a simbolizar opressão em seu autoralíssimo cinema, de uma carpintaria que sempre se apegou a sutileza, vide o recente "Tempo" ("Old", 2021). Não por acaso, seu olhar passou a gravitar para o suspense, para o terror ou para o thriller psicológico, como se vê no seminal "Vidro" ("Glass"): uma vez que o sobrenatural passa a ser um sintoma de dominação, sua representação dá à fabulação tons sombrios, quase tenebrosos, numa tradução visceral dos horrores que vivemos - sobretudo nestes dias de guerra.

Shyamalan dirige Bruce Willis no sets  Foto: Estadão

Inicialmente comparado a Alfred Hitchcock, por sua habilidade de assustar pela insinuação, Shyamalan hoje se assemelha mais de outro diretor, não por acaso, um discípulo do realizador de "Psicose": Brian De Palma. Há um quê do velho De Palma, aquele de "Irmãs diabólicas" (1972) e "Carrie, a estranha" (1976), em "Vidro", que é o terceiro tomo da trilogia iniciada em "Corpo fechado" (2000) e continuada pelo fenômeno de bilheteria "Fragmentado" (2017). Os dois protagonistas do primeiro, o segurança David Dunn (um Bruce Willis grisalho e apagado) e o gênio do crime Elijah Price, o Sr. Vidro (Samuel L, Jackson, luminoso), se unem ao personagem principal do outro longa, a Besta, psicopata com um transtorno de personalidade traduzido em dezenas de heterônimos encarnados furiosamente por James McAvoy, o jovem Professor Charles Xavier da Marvel. Aparentemente, a junção deles seria apenas um encontro de três párias, que acreditam ser super-humanos. Mas, numa narrativa sinuosa, salpicada de viradas, com a fotografia de luz bruxuleante de Mike Gioulakis (de "Corrente do Mal"), a figura coringa da Dra. Ellie, diabólica personagem criada por Sarah Paulson, percebemos estar diante de uma alegoria política. Aliás, vale um aplauso caloroso o desempenho de sua dubladora: Angelica Borges. Expert no estudo das narrativas fabulares, e no valor que a vilania tem para elas, Shyamalan nos dá um ensaio sobre controle, refletindo sobre o papel da imagem na manipulação de vontades. É um filme lento, soturno, mas arrebatador, que teve um orçamento de US$ 20 milhões e arrecadou US$ 246,9 milhões.

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