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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Novo Cronenberg vai à MUBI e a San Sebastián

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

RODRIGO FONSECA Previsto para estrear na MUBI no dia 29 de julho, "Crimes of the Future" vai ser exibido ni dia 21 de setembro no 70º Festival de San Sebastián, no norte da Espanha, numa homenagem a seu realizador: o canadense David Cronenberg. Ele vai receber o troféu Donostia, láurea honorária referente ao conjunto de sua obra... e à sua excelência. Embalado numa serena trilha sonora de Howard Shore similar a um mantra, "Crimes of the Future", o esperadíssimo novo longa-metragem do cineasta faz jus à toda a expectativa: é sublime! Foi o espetáculo autoral mais radical de Cannes, em sua edição n.75 até aqui. É um filme perfeito em sua dramaturgia intimista e de uma riqueza inestimável em seu reflexo das angústias que movem o mundo em 2022. Estão em seu filosófico roteiro, filmado em Atenas, o abandono gradual do toque e do contato físico; a radical espetacularização das opiniões; identidades performáticas; doenças sistémicas; e um conceito brilhante: "o design do tumor", que sugere o crescimento desenfreado de ideias comatosas. E some a tudo isso um Viggo Mortensen em estado de graça. Coroando tudo, há o fato de Cronenberg estampar sua marca venérea, intestinal, a cada plano, sem abrir mão dos códigos de um gênero, a sci-fi.

Kristen Stewart e Viggo Mortensen em "Crimes of the Future" Foto: Estadão

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Em "Crimes of the Future", à medida que a espécie humana se adapta a um ambiente sintético, o corpo passa por novas mutações. Essa é a realidade de Saul Tenser (papel de Viggo), artista performático célebre, apaixonado por sua parceira, Com seu parceiro Caprice (Léa Seydoux, igualmente potente). Ele faz mostras públicas de suas cirurgias de órgãos, em performances de vanguarda. Mas algo nessa rotina vai mudar quando Timlin (Kristen Stewart), uma investigadora do Registro Nacional de Órgãos, passa a seguir obsessivamente seus movimentos, esbanjando desejo por Saul e seus métodos de autoanálise. Há ainda uma espécie de investigador, encarnado pelo multiartista Welket Bungué, que carrega o filme com uma carga de mistério. Vale especial aplauso a produção dos figurinos, a se ressaltar o traje à la Darth Vader de Saul. "Esse filme tenta abordar o que viramos", disse Cronenberg à TV francesa, antes de Cannes começar. E, com seu "Crimes of the Future", a Croisette entrou num casulo onde revê as microfísicas do absurdo e do abandono de nosso tempo, aplaudindo o nascimento de um filme seminal. Há uma sequência nele que se candidata à posteridade: uma dança de um performer cego e de boca costurada que tem uma profusão de orelhas presas ao corpo. É um signo de nossa incapacidade corrente de ouvir o mundo... de escutar o outro. Que sacada! Foi uma pena o júri de Cannes não ter concedido prêmio algum ao filme.

p.s.: Numa madrugada de insônia, uma mulher madura reflete sobre seu processo de afastamento do mundo, iniciado anos antes do começo da pandemia e da necessidade de isolamento social. É o ponto de partida do monólogo "Na medida do impossível", que estreia dia 1º de julho no Teatro Candido Mendes, em Ipanema, levando à cena uma discussão bem-humorada sobre saúde mental, solidão e os medos que enfrentamos diante de uma vida que recomeça. Com direção de Victor Garcia Peralta, a autora e atriz Luciana Fregolente volta aos palcos depois de 10 anos na pele de uma tradutora de livros, casada e mãe, que expõe sua crescente dificuldade em se conectar com o ser humano. "Está todo mundo com a cabeça complicada, então é muito importante discutir saúde mental, depressão, pânico. Acho essencial que as pessoas tirem suas neuroses do armário. E o teatro é um ótimo meio para a gente refletir sobre esse tema, principalmente na comédia que nos deixa mais à vontade para trazer à tona o que nos machuca de verdade", conclui a atriz e dramaturga.

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