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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Nanni Moretti é a maior diversão, mesmo na dor

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Nanni Moretti estrela e dirige o belo "Tre Piani" Foto: Estadão

RODRIGO FONSECA Lar pra algumas das mais tonitruantes vozes autorais da indústria audiovisual, de Lucia Murat a Abderrahmane Sissako, passando por Naomi Kawase e Pablo Trapero, a Imovision promete inundar o circuito exibidor de lágrimas com "Tre Piani". É uma incursão de Nanni Moretti nas veredas do melodrama, despida de sua ironia habitual, mas tonificada por uma mirada singular sobre o desmantelo das relações familiares nos novos tempos. Foi um dos títulos de maior taxa de polêmica da disputa de Cannes em 2021. Duas décadas se passaram desde "O Quarto do Filho", filme que deu à Itália sua única Palma de Ouro neste século. E, agora, 21 anos depois, seu realizador retorna aos cinemas atrás e à frente das câmeras de seu filme de maior verve melodramática. O enredo, centrado no romance do israelense Eshkol Nevo, é um ímã de lágrimas. Na trama, três famílias que vivem em andares diferentes de um mesmo apartamento e sofrem abalos afetivos ligados a parentes ou amigos. Monica (Alba Rohrwacher), que acaba de ter um bebê, tem que lidar com o cunhado acusado de corrupção; Lucio (Riccardo Scamarcio, o Jude Law italiano, impecável em cena) é consumido pela dúvida acerca de uma possível violência sexual contra sua filha; e Dora (a ótima atriz Margherita Buy) e seu marido juiz (papel de Moretti) precisam lidar com a condenação de seu filho, por atropelamento. E cada eixo dramático desse se cruza com elegância. É difícil reter as lágrimas. E os aplausos para um diretor inquieto, que já prepara um novo filme: "Il Sol Dell'Avvenire".

Riccardo Scamarcio, o Jude Law da Itália Foto: Estadão

Aliás, na streaminguesfera, o Reserva Imovision, a plataforma que Jean Thomas Bernardini montou na pandemia, tem Moretti a rodo. Por lá é possível encontrar: "Eu Sou Autossuficiente" (1976), "Ecce Bombo" (1981), "Sonhos de Ouro" (1983) e "A Coisa" (1990). Passear por essas joias é excursionar por um dos derradeiros períodos gloriosos do cinema italiano moderno, ceifado por Silvio Berlusconi em meados dos anos 1980 e repaginado, já com resquícios de pós-modernidade, em 2008, com as vitórias de "Il Divo" e "Gomorra" em Cannes. Em 2019, a revista "Cahiers du Cinéma" incluiu "Minha Mãe" ("Mia Madre", 2015), de Moretti, entre os 10 Mais da Década, polemizando com essa (e outras) escolhas. Este comovente longa-metragem ganhou o prêmio do Júri Ecumênico de Cannes (embora merecesse mais) por seu olhar sobre conciliações (de família e de arranjos governamentais) que se mostram urgentes para a manutenção dos pulmões europeus se oxigenarem com ventos novos.

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