RODRIGO FONSECA Baseado na literatura do filósofo romeno Mircea Eliade (1907-1986), especialista do estudo de mitos, o belo "Velha Juventude" ("Youth Without Youth", 2007) marcou o regresso do diretor Francis Ford Coppola aos sets, após um hiato de dez anos sem rodar longas, iniciado após a estreia de "O Homem Que Fazia Chover" (1997), mas nunca teve vaga em circuito no Brasil. A partir deste domingo, é possível conferir essa pérola na streaminguesfera, a partir da MUBI. No sábado, a plataforma de curadoria humanizada aposta em outro filmaço do realizador americano: "O Fundo do Coração" ("One From The Heart", 1981). Na trama, ambientada em 1938, o linguista Dominic Matei (papel defendido por Tim Roth nas raias da excelência) está planejando suicídio, cansado de seis 70 anos de vida, quando é atingido por um raio. Após o acidente, ele passa a rejuvenescer. Sua mudança é percebida pelos nazistas que deseja fazer dele uma cobaia. Decidido a voltar à direção em 2022, para filmar "Megalópolis", com Oscar Isaac e Michelle Pfeiffer, Francis Ford Coppola anda cheio de gás para criar imagens de novo, após um intervalo em sua criação, dedicado à sua produção de vinhos. Ele já havia falado sobre isso no debate realizado no Beacon Theatre, NY, mediado por Steven Soderbergh (de "sexo, mentiras e videotape"), durante a edição 2019 do Festival de Tribeca. À época, o evento exibiu um corte inédito feito por Coppola a partir do material bruto de "Apocalypse Now", que, então, completava 40 anos. A nova edição é diferente da versão original, de 1979, e da versão "redux", de 2001, enxugando gorduras, ampliando reflexões filosóficas e realçando o tônus de rebeldia que o realizador esbanjava nos anos 1970. "Naquele tempo havia independência na maneira de se trabalhar com cinema nos EUA, sob a influência da Nouvelle Vague francesa e de mestres como Kurosawa. Fazíamos filmes de arte, personalíssimos e, por vezes, experimentais, se comparados à linguagem clássica americana", disse Coppola ao P de Pop em 2015, quando ganhou uma retrospectiva no Rio. "O exercício de linguagem que fizemos nos tempos de "O poderoso chefão" encontrou dificuldade de levantar financiamento e assegurar distribuição, pois não havia um padrão entre nós. Naquela época, nossos filmes ensinaram o cinema a encontrar novas maneiras de expressar humanidade, nas formas mais distintas, sem confiar em muletas mercadológicas que hoje cansam plateias".
Fã de diretores mais jovens, porém já cinquentões, como Alexander Payne e Wes Anderson, Coppola ganhou duas Palmas de Ouro em Cannes. A primeira veio por "A Conversação" (1974) e a segunda por "Apocalypse Now". "Minhas narrativas são sempre dedicadas a figuras marginalizadas, com foco em pessoas que estão alienadas em relação aos limites do mundo. É a paixão que move os personagens que me interessam. Passei por muitos gêneros investigando a condição humana", disse Coppola na Comic-Con, em 2011, propondo uma reflexão otimista sobre o papel da internet e das vitrines digitais para o cinema. "A evolução que essas novas ferramentas estão causando simbolizam um capítulo novo para a história do audiovisual que está sendo escrito agora. Pelas vias do digital, o cinema galgar novas alturas, algumas antes inimagináveis, repensando inclusive o 3D".
p.s.: Integram a 12ª edição do Festival Varilux (25 de novembro a 8 de dezembro) longas-metragens magistrais como "Titane", de Julia Ducournau; "Ilusões Perdidas", de Xavier Giannoli; "A Travessia", de Florence Miaihe; e "Enquanto Vivo", de Emmanuelle Bercot. Fiel à sua tradição de sempre exibir clássicos, o festival do casal Boudier presta um tributo póstumo a Jean-Paul Belmondo, morto no dia 6 de setembro, aos 88 anos, com uma projeção de "O Magnífico", de 1973, no qual o astro de "Acossado" vive uma aventura nas raias das intrigas de espionagem sob a direção de Philippe de Broca. Haverá ainda sessão de "As Coisas da Vida", de 1970, com Michel Piccoli, Romy Schneider e Lea Massari e Jean Bouise.