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'Minha Filha' em exibição online

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:

Rodrigo Fonseca Depois do sucesso internacional de "O Traidor" ("Il Traditore"), de Marco Bellocchio, e de uma dupla premiação na Berlinale, com "Favolacce" e "Volevo Nascondermi", o cinema da Itália vive um momento de apogeu nas telas, emplacando cults a granel, como é o caso do recente "Minha Filha" ("Figlia Mia"). Este filmaço de Laura Bispura vai ser exibido online por 48 horas, a partir das 19h desta sexta-feira, pelo Instituto Italiano de Cultura do Rio de Janeiro. Para ter os dados da exibição, procure no Facebook @iicrio, no Instagram @iicrio e no YouTube iic rio. A sessão será via Vimeo, com entrada franca. Antes que se embrenhar pelas veredas do melodrama, deixando a bússola do racionalismo para trás, "Minha filha" sequestra a atenção e o fôlego do espectador por caminhos geográficos: a paisagem da Sardenha toma conta da tela a partir de uma mirada quase neorrealista. Na direção, a romana Bispuri busca os invisíveis, os anônimos, o povo com o colorido suarento e esbaforido do dia a dia - parece a delicadeza de Vittorio De Sica em "Umberto D." (1952). Reconhecido o terreno, começa a ficção, que trilha um terreno bíblico. Evoca-se o mito de Salomão: o rei foi consultado por duas senhoras, que reclamavam o direito de ser mãe de uma criança, e ele sugeriu que o bebê fosse cortado ao meio, a fim de ficar um pedaço para cada uma. Pelo julgamento de Salomão, a mulher que se recusasse a ferir o bebê seria a mãe. Esta é a premissa que a realizadora de "Vergine giurata" (2015) resgata (e revive) em uma dramaturgia capaz de evitar obviedades, aliada a um refinamento visual arrebatador, que deve ser creditado à fotografia de Vladan Radovic.

A Sardenha deste longa-metragem - indicado ao Urso de Ouro no Festival de Berlim, em fevereiro - é um lugar de pesca e de criação de cavalos, lar de um povo alheio às transformações culturais das metrópoles ao seu redor. Um povo que poderia ser chamado de rústico, mas que é, apenas, aferrado a suas raízes, um pouco como a aldeia de pescadores de "La terra trema" (1948), de Luchino Visconti. O filme de Bispuri não é preso a amarras documentais, nem depende de não-atores. Pelo contrário, "Figlia mia" é um longa que serve de apoteose para grandes atrizes (Valeria Golino, Alba Rohrwacher) afirmando o traço autoral da cineasta: apresentar mulheres fortes em ambientes tradicionalmente dominados por grosseirões. Há uma sequência catártica em que a realizadora expõe todo o seu ferramental técnico e poético: Alba e a pequena Sara Casu, de 11 anos, soltam a voz ao som de "Questo amore non si tocca", hit da canzone italiana gravado por Gioanni Bella. As duas cantam como se brincassem de karaokê, diluindo as fronteiras de idade e hierarquia familiar que as separam. Alba é a alcoólatra Angélica, uma mulher afeita ao prazer. Sara é Vittoria, uma menina de 9 anos que tem duas mães, uma biológica, a outra, de criação: Angélica de um lado; e a bem comportada Tina (vivida por Valeria Golino) do outro. Ambas as adultas disputam, à sua maneira, o coração da menina, numa história revive os saberes de Salomão a fim de abrir uma discussão (necessária) sobre conciliação. Seu mote: renunciar é, também, um modo de amar.

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