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'Me Tira Da Mira': Um convite ao riso e ao sucesso

Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
Cleo, entre o irmão Fiuk e o pai, Fábio Jr., durante a coletiva de lançamento do filme "Me Tira Da Mira" em São Paulo - Foto de Anna Luiza Müller  Foto: Estadão

RODRIGO FONSECA Desde sua passagem por Cannes, em 1980, da Caravana Rolidei de "Bye Bye Brasil", como Ciço, o sanfoneiro das estradas do Norte, Fábio Corrêa Ayrosa Galvão devia ao cinema brasileiro uma volta às telas que fizesse jus ao carisma gigantesco que construiu ao longo de seu casamento de cinco décadas com o cancioneiro popular. O mesmo que o recebeu em meados dos anos 1970 como Mark Davis, mas o acolheu mesmo, como alma gêmea - assim, carne e unha -, sob o pseudônimo de Fábio Jr. É assim que ele aparece, ao lado da filha Cleo e do filho Fiuk, em "Me Tira Na Mira", uma produção na interseção entre o riso, a ação, a sensualidade e a celebração de todas as diversidades (sobretudo a dos gêneros cinematográficos) que faz jus àquela espera que já vem desde o fim dos anos 1980, quando ele filmou a obra-prima de Cacá Diegues. No meio do caminho, ele participou de novelas, mexendo com a libido do país como o Jorge Tadeu de "Pedra Sobre Pedra" (1992), e fez a gente chorar em "Qualquer Gato Vira-Lata 2" (2015), um filme mais potente do que se diz dele. Mas seu regresso agora vem numa embalagem de cinéfila fina, garantida por um cineasta em fase de evolução: Hsu Chien Hsin, que passou de assistente de direção (dos mais prolíficos) a realizador com uma forme de anteontem... e com uma assinatura autoral. Sua autoralidade se manifesta no desafio a tabus morais, numa aposta em crônicas de costume com muitos núcleos de personagens, numa reverência à comédia à italiana, à la Dino Risi, e, especialmente, num interesse pela lealdade. Esse é o Hsu, nosso Dino Risi (diretor de "O Tigre E a Gatinha"), que já desafiara a caretice no tocante "Quem Vai Ficar com Mário?" (2021) e "Ninguém Entra, Ninguém Sai" (2017). Em "Me Tira Da Mira", Roberta (Cleo, numa atuação segura, mesclando ironia e sofreguidão, na dicotomia de uma heroína humanizada) é uma funcionária dedicada da Polícia Civil do Rio de Janeiro, que se infiltra como agente secreta na Clínica Bianchini de Realinhamento Energético. Sua tarefa é investigar a misteriosa morte da atriz Antuérpia Fox (Vera Fischer). Durante a investigação, Roberta precisará lidar com os dramas da atriz Natasha Ferrero (Júlia Rabello, impagável), que acabou de ser "cancelada" na internet. Ela ainda reencontra seu grande amor do passado, o policial federal Rodrigo (Sérgio Guizé), que está investigando uma suspeita de tráfico internacional envolvendo a mesma clínica. Para isso, ela vai contar com o apoio de Isabela (Bruna Ciocca, em brilhante atuação), sua terapeuta, com quem, aos poucos, forma uma dupla divertida e implacável.

Cena do longa pilotado por Hsu Chien Hsin Foto: Estadão

Quando gira o mundo e chega ao fundo dessa navilouca, Roberta vai contar com a ajuda do personagem de Fábio Jr. Esbanjando simpatia e retidão, ele vive Jorge, chefe da Polícia Federal. Fiuk vive Lucas, parceiro de Roberta. Cris Vianna, Maria Gladys, Stenio Garcia e Rodrigo Fagundes são alguns dos destaques do elenco, assim como Silvero Pereira, o Lunga de "Bacurau" (2019). O roteiro escrito por Claudio Simões, Beatriz Rhaddour, Diego Timbó, Regiana Antonini e Junior Provesi - com a colaboração de Ana Eliza Guerreiro, Homero Mendes, Victor Michels e Tiago Lima Cunha - abre deixas para que Fábio Jr. construa a figura de Jorge como um pai coruja, que tenta proteger sua prole a despeito de seu cargo e de seu dever. Jorge é um leão ferido, capaz de tudo para defender sua cria. Cria que essa que não requer cuidados. Hsu elegeu Cleo para ser uma heroína empoderada, uma valquíria que desafia os sexismos da polícia brasileira. Seu principal inimigo é o moralismo. E além dele, há a figura soturna que Silvero esculpe qual um ourives, apoiado no ritmo tenso da montagem de Leonardo Gouveia, apoiado na fotografia ultra colorida de Daniel Primo. Há quilos de oportunidade para se rir, rasgadamente, em "Me Tira Da Mira". Mas há, também, sequências em que há ação padrão "As Panteras", com a qualidade MCG, aquela do início dos anos 2000, tensa, bem decupada, com pontapés, correria, ritmo, Cleo cheio de marra e um luminoso Guizé a seu lado. É um filme com fôlego pra catapultar as receitas do cinema brasileiro. Ou no mínimo pra ficar guardado, que, como cantarola Fábio Jr. em "O Que É Que Há", "ocupa os espaços vazios /arranca dessa ansiedade /acolhe, acalma". ´Como dizem nas salas de cinema cariocas: "Esse Hsu é doido!".

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